De 2008 a 2015, Emerson Franco estava no fundo do poço, preso no Complexo Penitenciário da Papuda. Naquela época, o garoto que cresceu em Santa Maria e teve uma infância muito sonhadora, na qual almejava ser bombeiro militar ou jogador de futebol, descobriu, dentro do sistema penitenciário, a leitura como forma de superar aquele momento extremamente difícil de sua vida.
“Na infância, brincava muito na rua com meus amigos, aproveitei muito essa fase, estudava muito e devido a algumas vulnerabilidades sociais nas quais (inevitavelmente) eu estava inserido, muito por conta dos diversos problemas de crescer num bairro pobre e periférico do Distrito Federal, amadureci de forma muito precoce”, relembra ele. “As maiores memórias que tenho dessa época são das brincadeiras na rua até tarde da noite, dos campeonatos de futebol nos campos de terra da região de Santa Maria Sul, lembranças das melhores notas na escola, das grandes amizades que construí e, principalmente, de ter tido meu primeiro contato com o movimento Hip Hop, especialmente, o rap nacional”, completa
Ao sair da prisão, Emerson viu os filhos de seus amigos começarem a cometer os mesmos erros que ele anos atrás, e que o levaram à prisão. Foi quando decidiu reunir a molecada, “mandou um papo franco” e conseguiu afastar muitos jovens dos caminhos da criminalidade, do tráfico de drogas, da vulnerabilidade social e da evasão escolar. Assim surgiu o projeto “Papo Franco”, que tem como missão educar, conscientizar, prevenir e informar jovens do Distrito Federal.
A incessante vontade de tentar, de alguma maneira, mostrar aos jovens em situação de vulnerabilidade social ou em cumprimento de medida socioeducativa que ele têm toda a capacidade de mudar suas vidas por meio dos estudos, do conhecimento e da educação moveram Emerson a desenvolver o projeto ao sair da prisão. “É um a forma de devolver a dignidade e a identidade a esses jovens, pois essas são as primeiras coisas que um espaço de privação de liberdade tira da gente. Quero mostrar que, pra mim, eles são muitos mais que uma medida socioeducativa em cumprimento, que eles são muito mais que um procedimento de ‘cabeça baixa e mãos para trás’, que eles são muitos mais que um número, uma matrícula, um ‘interno’ e uma vestimenta branca dos pés a cabeça”, resume Emerson.
Neste mês de maio, o projeto completa oito anos de existência e segue pelas escolas públicas do Distrito Federal e do Entorno. O professor de sociologia segue dialogando com adolescentes e jovens da periferia, de unidades de internação e presídios sobre como tornar a educação e a leitura aliadas de vida e ferramentas poderosas de transformação e emancipação social. “A interação é sempre muito gratificante, grandiosa e enriquecedora, pois, quando estou nas unidades de internação ministrando palestras e conduzindo oficinas de escrita criativa e construção poética –– unidades essas onde anos atrás lá estava eu cumprindo uma medida socioeducativa e hoje volto como professor, poeta, palestrante, arte-educador e escritor –––, tenho a convicção de que estou ajudando a salvar a vida destes adolescentes e jovens, mesmo diante das difíceis circunstâncias”, reflete Franco.
Também poeta, Franco é autor de “O Valor de uma Lágrima” (2012) e “Francas Palavras” (2023). Ambos os livros foram escritos numa linguagem poética rimada, ritmada e que pode facilmente ser cantada, herança e influência do Rap nacional, trazida de sua infância. As obras literárias abordam temáticas que Emerson trabalha com os jovens, como injustiça social, os valores e a importância dos estudos e da educação, além de arte urbana, cultura periférica, protagonismo juvenil, empoderamento, resistência e luta, revolução.
“Os maiores desafios que enfrento são a falta de apoio, de parcerias, de reconhecimento, recursos públicos e incentivo por parte dos órgãos públicos da educação e do desenvolvimento social”, revela o professor. No entanto, mesmo com tantas dificuldades, Emerson segue agradecendo por cada vida que, de alguma forma, ele consegue recuperar.
“É gratificante, é sempre um grande aprendizado, são meus irmãos e irmãs, é uma experiência que vai muito mais além de um espaço de sala de aula, uma cela. São aulas de vida e muita resiliência”, conta Franco. “No início (maio de 2016) foi muito difícil, principalmente pela questão do preconceito, da discriminação e a desconfiança da sociedade, muitas escolas não abriram suas portas para eu levar minha mensagem, mas sigo firme”, completa.
Acompanhe mais sobre o trabalho do poeta e educado no Instagram: Emerson Franco e Projeto Papo Franco.