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Além do Quadradinho
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Manifesto, brasileiro e afrofuturista: rapper Thabata Lorena prepara grande espetáculo com lançamento de “Set”, seu novo álbum

No espetáculo Set, a artista aposta na realidade fantástica com elementos e figurinos míticos inspirados na cultura popular

Thaty Nardelli

12/06/2023 12h18

Thabata Lorena. Foto: Thaís Mallon

Maranhense radicada no Distrito Federal, Thabata Lorena (@thabata.lorena) mistura o rap a elementos tradicionais para falar sobre temas como representatividade negra e empoderamento feminino. Com sua voz poderosa, traz em suas letras o recado sobre temas necessários na sociedade contemporânea. Agora, prepara novo espetáculo de teatro e música, que estreia para o público brasiliense em julho.

No espetáculo Set, a artista aposta na realidade fantástica com elementos e figurinos míticos inspirados na cultura popular honrando bumba-meu-boi do Maranhão. O projeto “evoca uma tecnologia ancestral, onde as máscaras servem para revelar”, segundo a cantora.

Confira a entrevista completa com a artista:

JBr: Me conta, como foi sua infância? 
Thabata: Minha infância foi boa, na rua, no Maranhão (MA), muito rio, pé no chão, música, guaraná da Amazônia e farinha de puba. Até chegar no Distrito Federal, onde me fixei em Samambaia e conheci a realidade das periferias do DF. Foi lá que conheci o rap e comecei minhas visões sobre a sociedade. Já adolescente me mudei para Taguatinga.

JBr: Muita coisa deve ter acontecido nessa época…
Thabata: Quando me mudei para Taguá (Taguatinga), larguei a escola, inclusive, só voltei no ano passado. Tô fazendo o segundo grau e técnico em administração, e tô adorando.  Vinte anos depois, imagina! Antes disso fui para Natal (RN), quando descobri o que era ser MC. O Nordeste sempre pautando minha arte. 

JBr: E como foi sua volta para o DF?
Thabata: Então, na volta para o DF, me conectei com novos ares. Me juntei à cena alternativa de Taguatinga, inicialmente no skate, comecei a rimar, na primeira roda de freestyle, que tive notícias no DF, dos  MC’s de classe na famosa praça do DI (Taguatinga). Foi nessa mesma praça, epicentro da juventude dos anos 2000 que me juntei ao movimento dos maracatus, quando comecei minha pesquisa de valorização dos saberes tradicionais. Isso aconteceu junto à minha militância cultural que sempre foi muito transversal a tudo que faço. Até os 17 anos não tinha pretensão de me tornar cantora, ainda mais solo. 

JBr: E como começou seu envolvimento com o rap? 

Thabata: Por meio do skate e da militância nas ruas. “Quando foi a primeira vez que ouviu um e dos primeiros sons que escreveu?”  Eu tinha uns 14 anos e estava em Natal e escrevi “Alisar pra que”, que era muito diferente do que é hoje. Nessa fase, dos 14 aos 16 anos, escrevi mais de 40 músicas,  ”Alisar pra quê”, foi a única letra dessa fase que seguiu comigo.

JBr: Como foi para você, mulher negra e nordestina, crescer pessoal e profissionalmente no Brasil e no rap?
Thabata: É muito poderoso ser lida como a voz de uma comunidade. O rap nos dá essa prerrogativa, diferentemente de outros estilos. Tô crescendo junto com nossa comunidade, preta, comunidade LGBTQIAP+. Profissionalmente falando, sou filha da era Lula. Me profissionalizei nas formações de projetos, formações políticas e fui compreendendo um aspecto mais profundo da missão da arte. 

JBr: Ao mesmo tempo, tudo parece muito desafiador, né? 
Thabata: Poder viabilizar meu trabalho a partir das minhas elaborações é fantástico. Os desafios são muitos e amplamente conhecidos, mais minha militância como mulher negra e periférica e expandir a percepção de que não somos substrato de violências e sim cura e potência. Fui ajudada por muitas mulheres e sigo construindo caminhos. O meu projeto Dona Imperatriz, que realizei nos últimos anos, é sobre oferecer acesso sem dor a profissionalização da produção artística de mulheres negras periféricas LGBTQIAP+.  É urgente que se invista na excelência e produção intelectual de mulheres negras. 

JBr: Como você enxerga a cena atual do rap do DF? 
Thabata: Sim, muita gente boa na cena do DF! A geração que está na faixa dos vinte anos tem tranquilidade para falar de progresso financeiro, isso ajuda muito nas produções, então as produções estão muito mais qualificadas, têm muito mais casas de show coletivos. Eu considero isso muito bom, principalmente com o aumento exponencial de mulheres com carreiras se consolidando, dá orgulho de ver. 

JBr: Sem romantizar, quais são os desafios de conciliar maternidade e uma carreira artística?
Thabata: Minha rede de apoio é muito limitada e eu sou muito exigente e criteriosa com as pessoas que têm acesso a meus filhos. Um segundo ponto é que a arte é um pouco egoísta. Ela precisa de todo o nosso tempo. E como tô sempre servindo as crianças, tenho dificuldade de priorizar minhas agendas.

JBr: E o que o nascimento deles te proporcionou também? 
Thabata: Meus filhos são meus mestres, vim de um contexto sistêmico de abandonos e falta de afeto, muito insegura e, por isso, raivosa. Quando meu filho Ébano nasceu experimentei o amor no lugar da confiança, tenho me curado muito. O pai do Ébano é meu melhor amigo. Em 2019, veio a minha filha Leona, eu estava circulando nacionalmente, e foi um desafio ainda maior por ser uma gestação completamente solo. Foi a melhor escolha da minha vida, Leona é o elo que faltava, que me leva a me tornar mais ambiciosa, porque ela só tem eu. Leona ia fazer um ano e chegou a pandemia, me permitindo ficar com ela por três anos de dedicação integral (foi maravilhoso!). Durante a pandemia comecei a me organizar mais na gestão da minha carreira, enquanto uma empresa. 

JBr: Muitos frutos foram colhidos durante toda sua carreira. Existe algum momento de toda a sua carreira que você gostaria de emoldurar?
Thabata: São muitos momentos especiais. A passagem pelo Olodum foi linda de viver. Participei da abertura do festival Polo Hip Hop, em Recife, do Festival de Inverno de Garanhuns, Conexidades, no Rio. Acredito que ainda não vivi meu grande momento! Acredito que virá com a internacionalização da minha carreira, o próximo passo após o lançamento do do meu novo espetáculo “Set”. 

JBr: Sobre isso, “Set” vai além de um álbum para um projeto que promete evocar uma tecnologia ancestral…
Thabata: Ancestralidade é aquilo que precisa ser passado adiante. Ancestralidade também é sobre legado e construção de futuro baseado no que deu certo. Nesse espetáculo junto todas as minhas faces como artista, palhaçaria de rua e bordadeira. É um espaço para expressar esses ofícios que parecem tão longes da nossa contemporaneidade. Isso é fundido à estética de cria, trap drill, projeções, efeitos especiais e máscaras que servem para revelar. É uma produção que mistura o melhor do que fui com o melhor que posso me tornar. Esse espetáculo é uma máquina do tempo rumo ao teatro negro contemporâneo. 

JBr: E o que o público pode esperar? 
Thabata: Tô trabalhando desde novembro de 2022, temos muitos núcleos de trabalho. Os criativos que eu gerencio são o disco com equipe de quatro pessoas, todos produtores musicais, entre eles Dessa Ferreira que assina a produção geral do disco. O Afrorrga, que assina a co-produção junto com o Rubbas Estúdio, e ainda o Laryn que assina a mixagem e masterização. Tem o núcleo das máscaras e acessórios cênicos que vamos usar, que divido com Marcelo Medeiros, um dos integrantes da formação original do Seu Estrelo. 

Tem o núcleo de figurinos, com o trabalho da designer de moda Crystal Iconic e Gabi. Os figurinos são alegorias carnavalescas modernas. Tem ainda o núcleo de teatro e direção, onde divido os trabalhos com esse artista incrível que é o Jhonatta Andrade, criando coreografias de sonhos e animando minhas músicas em movimentos. Nesse núcleo tenho Aníbal Alexandre compondo a trilha em parceria com Ana Quintas, iluminadora mega sensível. Tem ainda o núcleo da trilha de teatro, com o percussionista Felipe Fiuza e quarteto orquestral com contrabaixo acústico, violoncelo, viola e violino, que tem arranjos de Tom Suassuna e Mar Nóbrega.

Isso sem contar as funções de coordenação de produção que tem os núcleos administrativos onde tenho a honra de compartilhar a vida com minha produtora executiva Lelia de Castro. Toda essa equipe linda está me jogando para cima para chegarmos com tudo!

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