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Dream team da música brasileira faz releitura de Heitor Villa-Lobos

Trios do compositor são regravados pelo violinista Claudio Cruz, o violoncelista Antonio Meneses, o pianista Ricardo Castro e o violista Gabriel Marin

Redação Jornal de Brasília

24/02/2021 7h37

Por que não gravar os trios de Heitor Villa-Lobos? O assunto voltava sempre nas conversas entre o maestro e violinista Claudio Cruz e o violoncelista Antonio Meneses. Mas o plano esbarrava sempre na mesma parede: faltava um pianista.

“São obras difíceis para todos, mas a parte do piano é monstruosa”, conta Cruz. “E tocar os trios exigiria uma integração enorme. O grupo precisa soar como uma unidade, desenvolver um só pensamento em termos de sonoridade.”

Mas a resposta estava ali perto o tempo todo. Depois de reger alguns concertos com o pianista Ricardo Castro, Cruz procurou Meneses: “Ele é o cara”.

E foi assim que um verdadeiro dream team da música brasileira, que inclui ainda o violista Gabriel Marin, se reuniu para gravar o álbum dedicado a Villa-Lobos. Lançado em formato digital pelo Selo Sesc, é um acréscimo fundamental à discografia do compositor; e, neste começo do ano, não foi o único: com o Coro da Osesp e pelo selo Naxos, acaba de sair álbum com as transcrições de Villa-Lobos de peças célebres para piano.

A gravação do Selo Sesc, realizada no Estúdio Monteverdi, de André Mehmari, após dois anos de preparação, reúne os três trios para piano, violino e violoncelo e o trio para violino, viola e violoncelo. O primeiro grupo é dos anos 1910; o último trio foi escrito nos anos 1940.

Para Cruz, são dois compositores diferentes os que se revelam por meio das obras. “Os trios com piano foram escritos quando Villa tinha 25, 26 anos. Ele ainda não havia tido contato com a música de Stravinski, com a cena experimental europeia. Havia a influência da música francesa, de Debussy, mas é impressionante como ele já era um autor fantástico. O Trio n.º 1 pode ser comparado a qualquer obra do gênero”, diz Cruz.

O trio de cordas, por sua vez, revela, para o violinista, “a mesma cabeça, mas com um know-how diferente, influenciado pela linguagem do século 20”.

Nos últimos anos, Cruz tem gravado a obra de autores brasileiros, sempre com a preocupação de estabelecer novas edições de partitura. Foi assim com os quartetos de Alexandre Levy ou Glauco Velasquez. E também com os trios.

“No material disponível, há muitas notas erradas, disparidades entre as partes do piano e dos outros instrumentos. Então é preciso revisar a obra, fazer escolhas”, ele explica. “E o problema nem sempre é o manuscrito, como se costuma dizer. Muitos equívocos estão nas primeiras edições das obras. Se você olha o manuscrito do Trio nº 1, por exemplo, ele é muito claro, e os erros aparecem na edição da Max Eschig.”

Desafio semelhante foi enfrentado pela maestrina Valentina Peleggi ao montar a gravação das transcrições para coro que Villa-Lobos fez de peças para piano de Bach, Schumann, Schubert, Rachmaninov, Massenet e Beethoven. Elas foram escritas dentro do projeto de Canto Orfeônico, iniciativa de ensino musical empreendida pelo compositor, que tinha a música coral como foco principal.

“Foram quase dois anos de pesquisa e preparação das partituras, corrigindo notas erradas, buscando outras obras corais para compreender as intenções do compositor. Mas é fascinante o trabalho, pois permite a você entender o que ele buscava em termos de sonoridade”, explica Peleggi, diretora da Sinfônica de Richmond (EUA).

Entre as peças reimaginadas por Villa-Lobos para serem cantadas estão prelúdios e fugas de Bach, valsas de Chopin e a Sonata Patética, de Beethoven. “É impressionante perceber que, quando traduz para o coro as obras, o compositor encontra cores e atmosferas que não estão no original, consegue criar sonoridades muito próprias e contrastantes, explorando as diferenças de cada naipe de vozes”, diz a maestrina.

Legado. Claudio Cruz já tem engatilhados outros projetos de discos dedicados a Villa-Lobos. E, com o Quarteto Carlos Gomes, gravou os quartetos de Meneleu Campos, compositor paraense do início do século 20 – o disco será lançado no meio do ano pelo Selo Sesc. Aqui também o registro foi acompanhado da edição das partituras.

“Para mim é cada vez mais clara a importância de deixar um legado para as próximas gerações. O fato de sermos os primeiros brasileiros gravando os trios significou a necessidade de oferecer um registro de referência. E a edição das partituras faz com que elas fiquem disponíveis a outros músicos. Um dos problemas do nosso meio musical é o modo como algumas pessoas estão só preocupadas em usufruir estruturas criadas por outros, sem a preocupação de deixar algo construído para quem vem depois.”

Estadão Conteúdo

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