Gustavo Mariani
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Várias conspirações habitavam as cabeças de militares e empresários que temiam ver o País se tornar uma república sindicalista. João Goulart acenava com reformas de base, mas o que ele fazia mesmo era abrir o caminho para um golpe institucional, quando participou de um comício na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, apoiando profundas mudanças nos setores eleitoral, agrário, bancário, fiscal e educacional.
Quando Jango reuniu-se com marinheiros rebeldes, deixou as forças armadas iradas. Magalhães Pinto, então governador de Minas Gerais, não respeitou uma ordem de manter militares nos quartéis e lançou o manifesto que iniciou verdadeiramente o golpe. “É o que contam, e eu não contei nada, mas dizem que eu contei. E quem sou eu para ‘desrecontar’ o que se conta!”, brincou o então presidente do Congresso Nacional, senador Magalhães Pinto, piscando um olho para este repórter.
Naquele dia, o editor de Política do Jornal de Brasília, Sílvio Leite, havia me incumbido de tentar arrancar do ex-governador mineiro o que ele ainda não falara sobre a queda do ex-presidente João Goulart. Magalhães insistia que já se publicara tudo. Mas, quando sorveu metade de um vinho tinto seco, relembrou várias passagens, com uma memória impressionante.
O que Magalhães Pinto contou-me é o que ficara na história sobre Jango. Parecia que o homem só vivera três dias. No entanto, surge, agora, uma biografia do ex-presidente, visitando toda a sua vida. O livro é resultado de dez anos de pesquisas do professor titular da cadeira de História do Brasil, da Universidade Federal Fluminense, Jorge Ferreira.
Pesquisa
Ferreira escreve o que Eurico Rezende falou-me em 1977, quando enalteceu os 13 anos da Revolução. “Discordo dos que o definem como populista inepto, dúbio, vacilante. Jango foi secretário de Estado, deputado estadual e federal, ministro do Trabalho, presidente do Senado, vice-presidente e presidente da República. Conhecia muito bem as manhas da política brasileira. Teve aulas com Getúlio Vargas”.
Pelo que Jorge Ferreira coloca em João Goulart – Uma Biografia, deduz-se que o populismo de Jango surgiu em sua adolescência, quando torna-se empresário bem sucedido, assumindo comportamento avesso aos grandes fazendeiros gaúchos.
Os anos de pesquisa de Jorge Ferreira levaram-no a crer que muitos dos problemas econômicos, políticos, sociais e culturais atuais, bem como dilemas, práticas e contradições das esquerdas, podem ser compreendias a partir do passado. É nele que Getúlio Vargas ouve de Jango, em 1943, ideias de assombrar o próprio pai, com quem aprendera administrar terras e fortunas, para, depois, imaginá-las distribuídas aos camponeses sem recursos e vê-los olhados por políticas públicas combatentes de desigualdades sociais.
Saiba mais
Jorge Ferreira aborda neste seu trabalho um tema pouco tratado pelos historiadores, explicando bem, por que Getúlio Vargas apoiara o general Eurico Gaspar Dutra, nas eleições presidenciais de 1945.
Ferreira oferece um texto bem detalhado do momento em que o presidente não autoriza a invasão do Palácio Guanabara, e nem a prisão do insuflador Lacerda. E o mostra fornecendo, com aquilo, munição para os golpistas partirem para a sua derrubada.
João Goulart – Uma Biografia.
Jorge Ferreira. Editora Civilização Brasileira.
713 páginas. Preço médio: R$ 69,90.