Com cinco discos gravados e 15 anos na estrada, a banda de Matanza intitulou-se a primeira banda de countrycore brasileira. As letras inconfundíveis do quarteto carioca tornaram-se clássicos do vulgo “rock de macho”. Suas melhores composições foram regravadas em 2008, no disco MTV Apresenta Matanza, com o qual a banda chega neste sábado em turnê a Brasília, onde se apresenta no Clube da Ascef, após a abertura do grupo goiano Mechanics e das bandas locais Bruto e Coral de Espíritos. Para brindar o show desta noite, que vai quebrar o jejum de quase dois anos sem apresentações na capital federal, o líder da banda, Jimmy London, concedeu entrevista ao Jornal de Brasília sobre rock, mulheres e álcool, com vocabulário que dispensa delicadezas e compõe a persona do vocalista de uma das bandas mais despudoradas do rock nacional. Contudo, Jimmy parou de beber há quatro anos para aguentar o tranco da rotina de shows e por problemas de saúde. E diz não sentir a menor falta do álcool. “Fiquei de saco cheio de birita, porque se tornou algo muito repetitivo para mim”, diz. O vocalista também afirma que Brasília foi palco de um dos piores shows da banda e também de um dos melhores, no Porão do Rock de 2008.
Por que os últimos shows do Matanza no DF foram cancelados?
Por culpa de um péssimo produtor local, para falar a verdade. Foram bobagens, como não depositar o cachê e não mandar passagens. Quando acontece essas coisas, infelizmente a gente tem que mandar pro caralho. São coisas de ordem de prática.
Tem um disco novo chegando?
O novo disco tá rolando solto. A gente tá chegando na metade das composições. Acho que dento de mais uns dois ou três meses vamos começar a gravar.
E qual será o título?
Não tenho a menor ideia. Só sei que as músicas terão os nomes mais esquisitos do mundo, tipo Nas Minas de Sal da Sibéria e Carvão Enxofre Salitre. O disco terá 13 faixas como manda a nossa superstição. Só o MTV Apresenta que é exceção e tem uma porrada de músicas. Caso contário, o show duraria uns 11 minutos (risos).
Vocês tocam em lugares undergrounds mesmo depois da fama. Por que?
Primeiro que o Matanza é a nossa vida e não podemos nos dar ao luxo de dizer que não queremos isso ou aquilo. Segundo que é muito feio negar o passado. Lógico que não vou fazer coisas que eu fazia, como viajar mil e quinhentos quilômetros de van, mas tenho que me manter verdadeiro ao que toco. A terceira coisa é que a gente se amarra mesmo. Quanto mais esquisito o lugar, melhor o show.
A Matanza é uma das poucas bandas do Brasil que matém a postura de banda de rock de macho. De onde vem isso?
Na verdade chega a ser um eufemismo dizer que é rock de macho. Sendo que você não pode confundir macho com o cara que tem uma coisa pendurada entre as pernas, né. Até porque tem muita mina aí com atitude de mais macho que muito marmanjo. Mas acontece que o rock é um lance de hormônio. É uma parada de falar grosso e alto, de saco cheio e de libertação. Não faz o menor sentido lidar com rock sem achar que rock é esporro. Para mim não existe rock educado. Então não sei se a gente é banda de rock de macho ou se as outras bandas que estão tentando fazer uma coisa que não existe.
A música de vocês é para “beber e brigar”, no entanto muita menina curte e vai aos shows. O que vocês acham disso?
O rock é feito para as pessoas “rocarem”, se divertirem, e para isso não precisa beber, nem brigar. As minas são muito macho, pode ter certeza disso.
E o que você acha das bandas de rock emotivo, ou emocore?
Tenho que confessar a minha ignorância, porque eu realmente não escuto, não sei, e por isso nem posso dar minha opinião musical sincera quanto a isso. Ainda estou ouvinto as músicas dos anos 30, falta muita coisa para chegar em 2010 (risos).
Você canta músicas sobre bebidas, mas parou de beber há quatro anos. Por que?
Por uma junção de fatores. Preciso aguentar o ritmo de shows da banda, que é puxado. Se eu ainda bebesse como bebia antigamente, acho que eu nunca conseguiria fazer um fim de semana de quatro a cinco shows que a gente tem feito. Eu não sei brincar. Não sei beber um choppinho e ficar de boa, calminho. Só sei fazer as coisas com muita disposição. Também teve minhas questões de saúde, mas isso é uma coisa pessoal, que não interessa a ninguém. Na verdade, fiquei de saco cheio de birita, porque se tornou algo muito repetitivo para mim. Não tive que me esforçar para parar de beber, pelo contrário, teria que me esforçar para continuar a beber. Um dia eu disse que não tava a fim e pronto. Pode ser que passe uma hora, mas por enquanto isso tá durando.
E faz diferença fazer shows sem álcool nas veias?
Sim, porque eu erro bem menos letras. Não que eu ainda não erre, mas isso diminuiu e eu lembro dos shows, o que é bem legal. Quanto à diversão, não faz a menor diferença, talvez pelo contrário. O álcool tem uma curva de momento ideal, de empolgação, que dura pouco. Se você estiver antes da curva, não está pronto ainda. E se estiver depois, passou do ponto. Então tinha shows que não dava para entrar no palco naquele momento exato. Sem álcool não tem esse problema. Geralmente fico mais bem disposto. Fica mais engraçado também, porque gosto de ver as pessoas bêbadas. Gosto que bebam e que fiquem muito doidas, porque eu rio pra caralho.
Você se sente realizado com a banda?
Antes da banda, eu trabalhei de terno e gravata. Era gerente de marketing de uma empresa importante e falava um monte de bobagem. Mas nunca tive a menor dúvida do que eu queria fazer da minha vida, tanto que eu larguei tudo sem olhar para trás. Não consigo nem pensar em arrependimento, porque mal consigo me lembrar daqueles tempos. Tenho muita certeza do que eu fiz. Semana passada a gente viajou 15 mil quilômetros em uma semana. Se eu não achasse que faz sentido o que eu faço, não aguentaria.
Da banda, alguém é casado e tem filhos?
Só o Maurício (guitarrista) que está na situação certinha, casado com filho. O China é casado, mas não tem filho. Eu tenho namorada e acho que o Jonas não tem.
Durante os shows muitas meninas tiram as blusas para vocês. Como vocês lidam com isso?
Na real, não é para levar muito a sério, como não é para levar nada muito a sério na vida. Acho que esses momentos de algumas meninas é igual ao momento de outros caras de beber uma cerveja inteira e quebrar a lata na cabeça. Nego tá ali só exorcizando os demônios mesmo, fazendo uma bagunça do caralho. Não levo isso a sério até porque tenho espelho em casa e tenho noção do que eu sou. Então, não boto muita fé não. Eu sei que é só neguim querendo se divertir na hora mesmo.
Mas nunca aconteceu de alguma fã procurar vocês querendo algo?
Tem uma frase clássica que toda banda de rock respeita muito, que inclusive eu não deveria dizer, porque faz parte da nossa sociedade secreta, mas… O que acontece na estrada, fica na estrada. As histórias são várias com as pessoas que a gente encontra alucinadas nos shows.
O que seria o countrycore, o gênero do qual o Matanza diz fazer parte?
A gente se refere ao country antigo e ao bluegrass, que é uma música muito rápida, com um tempo muito parecido com o do hardcore. Como a gente é meio toscão mesmo, foi o lance mais honesto e a melhor coisa que a gente conseguiu fazer. Countrycore é, de certa maneira, algo abstrato. Não está no tema das letras, mas no nosso tipo de levada.
Vocês sempre tocam covers de Johnny Cash. A banda decidiu quais serão os covers do novo disco e do show de hoje?
A gente vai tocar Cash sempre. Quais, eu não sei. Mas que a gente vai tocar, a gente vai. Só uma vez fizemos uma brincadeira na MTV e tocamos Motörhead, mas não passou disso.
Por falar em Motörhead, muita gente te acha parecido com o vocalista Lemmy. Você concorda?
Não, porque ele é um gênio e eu não sou. E também porque ele é feio pra caralho e eu sou só um pouquinho feio. Então não me acho parecido com ele de jeito nenhum.
Qual foi o pior e o melhor show que vocês fizeram?
Isso é muito difícil de falar. É igual a falar mal de um filho e escolher outro. Tem show que dá merda. Em Brasília teve um show que deu merda porque nego vendeu mais ingressos que a capacidade do lugar e o som caiu nas pessoas, que se machucaram. Esse tipo de coisa pra mim não tem a menor graça. Acho um puta desrespeito com o público. Se eu soubesse não teria nem começado a me envolver. Então foi um show muito drástico e me arrependo. O melhor deve ter sido em Brasília também. O show que fizemos no Porão do Rock em 2008 foi legal pra caralho e me lembro dele com muito orgulho. Mas acho que todo show que eu saio vivo no fim é o melhor show de todos.
Alguma coisa a dizer aos fãs de Brasília?
Quero falar pra neguinho ficar pronto aí. Estamos acabando essa turnê agora e daqui a pouco tem disco novo.
Mas vocês não tinham encerrado essa turnê do MTV Apresenta?
Na verdade rolou a preguiça de ficar em casa (risos). A gente podia ficar quieto até lançar o disco, mas ficou todo mundo de saco cheio. Então resolvemos voltar.
Matanza – Neste sábado, às 20h, no Cedec (Clube da Ascef, 912 Sul). Ingressos a R$ 20. Não recomendado para menores de 18 anos.