A partir deste sábado (16), a Casa Aerada Varjão recebe a exposição Glória Paraíso, com curadoria de Renata Azambuja e Gladstone Menezes. A mostra apresenta três vertentes da produção da artista Glória Pimenta da Veiga — que, ao adotar o nome Glória Paraíso, não apenas reinventa sua assinatura, mas reafirma suas origens.
“O Paraíso é, na verdade, meu sobrenome materno”, explica. “Adotei para homenagear minha mãe. Parece nome artístico, mas é meu nome mesmo: Glória com o Paraíso da minha mãe”, explica Glória.
Do gesto da escultura ao “desenho-escultura-fina”
Antes de desenvolver a técnica que hoje a caracteriza, Glória estudou escultura com Miguel Simão, artista e professor da UnB — e também fundador da Casa Aerada. “A escultura tem algo muito corporal, muito gestual”, lembra. Dessa experiência, nasceu a base do que ela chama de “desenho-escultura-fina”: um trabalho de escavação sobre superfícies escuras, revelando a luz por meio do traço. “É um gesto de trazer as coisas à tona, de fazer emergir o que está escondido.”

Barroco e pop em diálogo
Filha de tradicional família mineira, Glória cresceu cercada pelo imaginário barroco de Ouro Preto, o que influenciou diretamente sua obra. Em Desvio do Dândi (2014), ela parte dos soldados romanos esculpidos por Aleijadinho nos Passos da Paixão — figuras associadas à violência e à opressão — e os coloca em diálogo com os retratos icônicos de Andy Warhol.
“Não é sobre questionar hierarquias históricas”, esclarece. “Quis trazer Aleijadinho para um contexto contemporâneo, criar um diálogo com a pop art. Assim como Warhol borrava as cores nos retratos de Marilyn ou Elizabeth Taylor, dei uma feminilidade a esse masculino agressivo dos algozes.”
A potência política dos cartazes
Durante a pandemia, Glória criou a série Cartazes, pintando sobre placas que lembram materiais escolares e inscrevendo, no verso, discursos históricos de figuras como Dilma Rousseff e João Goulart. “Vejo a arte como resistência”, afirma. “Ela se perpetua no tempo e atua como testemunho histórico. No Brasil, onde falta memória, é uma maneira de garantir que certas vozes permaneçam.”
Para a curadora Renata Azambuja, “essa série está relacionada aos modos de comunicar ideias, à forma dos cartazes escolares, mas também é atravessada por uma carga política muito clara. Glória escreve no verso os discursos. A pintura na frente dialoga com essa escrita. É um corpo político, íntimo, um testemunho afetivo do tempo.”

A parceria entre Glória, Renata e Gladstone Menezes começou em 2014 e se concretiza agora na exposição. Segundo Glória, a escolha pela Casa Aerada se deu pelo caráter mais intimista do espaço. A realização é independente, sem patrocínio, contando com apoio de amigos.