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Viva

Conversa por trás do divã

Arquivo Geral

11/09/2011 8h00

Marina Macêdo

marina.macedo@jornaldebrasilia.com.br

 

 

Psicanalista, escritora e colunista, Betty Milan acaba de lançar seu novo livro: Quem Ama Escuta, obra que mostra que a psicanálise ganhou nova forma. Os consulentes não precisam mais ir ao consultório e deitar em um divã. A consulta é feita via internet, com um simples e-mail narrando, anonimamente, seus problemas e aflições endereçados à autora. O livro reúne as melhores colunas, originalmente publicadas na revista Veja e no site Veja.com. Formada em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP) e com especialização em psicanálise na França com Jacques Lacan, a paulista carrega um currículo com inúmeros livros, como Fale com Ela, também baseado em suas melhores publicações. Em entrevista ao Jornal de Brasília, Betty Milan fala sobre a nova obra, sua rotina de trabalho, a relação entre a psicanálise e a arte, entre outras temas.

 

 

Qual é a relação entre  Fale com Ela e Quem Ama Escuta?

Fale com Ela reúne as melhores colunas publicadas na Folha de S. Paulo, onde eu comecei o Consultório Sentimental. Quem Ama Escuta reúne as melhores colunas publicadas na Veja.com, onde eu escrevo atualmente. Como em Fale com Ela, eu respondo, neste livro,  às perguntas a mim endereçadas anonimamente. Da mulher que é amante de um homem comprometido e não suporta o triângulo. Da jovem que transa pensando no irmão. Do gay que procura prostitutas para se convencer de que não é gay. Trata-se de uma nova educação sentimental, baseada na escuta, daí o titulo do livro. Faz o leitor refletir sem preconceito sobre os dramas da vida  e ter um encontro consigo mesmo.  Afim de sermos livres, precisamos decifrar os enigmas do inconsciente, analisar o passado para saber do presente e do futuro.

 

 

Quantos e-mails recebe por dia? E como seleciona os casos?

A bem da verdade não sei quantos e-mails chegam por dia. Sei que a coluna  é muito lida. Já chegou a cem mil pessoas por mês. Também  há muitos comentários, e, com isso, formou-se espontaneamente um fórum de debates a partir da questão do consulente e da resposta da consultora, eu. Quem seleciona os casos, a pedido meu, é a editora da coluna, Katia Perin. Prefiro não examinar diretamente o material que chega para não perder a objetividade.

 

 

Quais informações devem conter nas cartas para você entender o que se passa com os leitores ?

Respondo aos mais diferentes e-mails e a resposta não depende desta ou daquela informação. Depende de uma queixa e de um pedido. Para responder, eu me baseio na queixa e no pedido, assim como no estilo do seu texto, nas repetições e nos lapsos. Procuro esquecer o que estudei e me debruço livremente sobre a pergunta até encontrar a resposta que ela sugere.

 

 

Em suas respostas você busca casos semelhantes do cinema ou literatura. Qual é a relação da psicanálise e da arte?

O que me interessa é a universalidade do caso singular, daí as tantas referências ao cinema, ao teatro e à literatura. O meu procedimento, enquanto consultora, é análogo ao do romancista. Ao contar a história de Madame Bovary, Flaubert contou a das bovarianas passadas, presentes e futuras. Fez da Bovary uma adúltera universal. Por outro lado, o meu procedimento é análogo ao do psicanalista. Faço com o texto do consulente o que o analista faz com a fala do analisando. Sublinho o que importa a fim de que o consulente possa olhar para si mesmo de maneira nova e desvendar o motivo do seu drama. Sobre a relação entre a psicanálise e a arte,  o que eu posso dizer aqui é que a psicanálise é uma arte. 

 

 

O que é a nova educação sentimental baseada na escuta?

Digo que faço uma nova educação sentimental por três razões. Primeira: pela ideia de que o inconsciente existe e é preciso se escutar para não ficar à mercê dele, não ser vítima da paixão. Segunda: porque, em decorrência da importância aqui atribuída ao inconsciente, a educação não tem regra geral. A resposta é sempre em função da particularidade de cada um. Terceira: porque, atualmente, a educação é feita pela mídia, e não mais no contexto da família ou por meio do romance, que é hoje uma referência de poucos. Para avaliar a necessidade da nova educação sentimental, basta considerar a “revolução sexual” dos anos 60. Foi condicionada pela descoberta da penicilina e da pílula. Já não havia por que ter medo da sífilis e da gravidez indesejada. A palavra de ordem era transar livremente, sem freio algum. Foi um passo à frente; nós escapamos da repressão imposta às gerações anteriores. Só que o sexo se tornou obrigatório. Quem não aceitasse transar era “antiquado”. Houve uma verdadeira tirania do sexo.

 

 

Já se surpreendeu com algum caso? Ou não conseguiu responder? Qual?

Surpreendo-me com todos os casos porque leio o e-mail do consulente sem preconceitos. Quando eu deixar de me surpreender, eu paro de fazer isso. Como a surpresa depende menos da história narrada do que da forma como ela é narrada, todos os e-mails são surpreendentes. Respondi a todos os e-mails que a editora me enviou. Tenho este procedimento como norma. Os casos dos quais eu não esqueço, porque eles me revoltam,  são aqueles em que há abuso sexual de menor.

 

 

Quantos pacientes já teve? Algum já deu um retorno de melhoria de vida após a publicação?

Francamente não sei. Abri o meu consultório aos 20 anos e comecei a clinicar antes de me formar na Faculdade de Medicina. Não parei até completar 60 anos, idade a partir da qual eu só faço escrever. Para a Veja, para a Editora Record, que publica os meus romances e as minhas crônicas, para o teatro, que é uma grande paixão.

 

 

Existe algum problema ético em citar os casos no livro?

Não, porque todos os consulentes são anônimos.

 

 

QUEM AMA ESCUTA 

Betty Milan

Grupo Editorial Record/Editora Record.  416 páginas

Preço: R$ 42,90

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