Por que a vida real, com sua complexidade, muitas vezes é capaz de provocar mais interesse do cidadão comum do que a própria ficção?
O que leva três mulheres comuns de meia idade a revelarem detalhes íntimos de sua vida, senão o interesse de se inserir num mundo que cultua as celebridades instantâneas e que confunde o privado e o público?
Estas são as primeiras questões que vêm à mente quando se fala do espetáculo Inventários – o que eu guardei pra você, novo trabalho do Grupo Cena, que o Centro Cultural Banco do Brasil Brasília apresenta no Teatro II, de 3 a 26 de maio de 2013.
O Espetáculo
Inventários brinca com a noção do público e do privado, em tom de comédia, capaz de emocionar. No espetáculo, três mulheres competem numa espécie de limbo televisivo, um aparente reality-show no qual expõem suas vidas num verdadeiro “sincericídio”. Todas elas têm um objeto do qual parte o monólogo de cada uma: um vestido, uma bacia, uma luminária.
Cada uma delas é convidada a se apresentar e a partir daí inicia-se um jogo frenético. O apresentador interrompe-as ao longo de sua catarsis, às vezes oportunamente e outras não, acompanhando as participantes, dando indicações e marcando o ritmo da obra. A partir de cada objeto, cada mulher confessará suas dúvidas, ansiedades, angústias e também os seus (raros) momentos de felicidade.
Esta é a primeira vez que Jacqueline, Angela e Bárbara têm holofotes sobre sua pequena existência e quando as válvulas são abertas, o fluxo não pára mais. Aos poucos, os espectadores vão percebendo que nada é exatamente como aparenta.
Por trás da bondade de Jacqueline, há frustração e raiva. Por trás da candura de Angela, há solidão e desespero. E por trás do ar de superioridade de Barbara, há a amargura e o sofrimento nascido da falta de amor e da violência.
O princípio do jogo é simples: cada uma deve trazer um objeto que fale de perto a seu coração, contar a história dele e, ao fazê-lo, falar de sua própria história, suas dúvidas, medos e também de seus momentos felizes.
Conflitos conjugais, miséria social, a morte miserável, desamor são temas alinhados numa galeria em meio a objetos que se confundem com elas mesmas. São relatos que fazem rir e emocionam. O espectador é tomado por um turbilhão de palavras que vão, aos poucos, delineando a vivência e o temperamento daquelas três mulheres – aparentamente tão comuns.
Inventários – o que eu guardei pra você coloca em cena a noção singular que o dramaturgo Philippe Minyana tem da escritura teatral. Para ele, trata-se sempre de um laboratório permanente, uma química de paixões, que coloca em cena um mundo incerto e deslocado de emoções. As frases são ditas num fluxo contínuo, com um sentimento de urgência, dando a impressão de que o discurso está sendo construído no momento presente e que a palavra tem autonomia para ser dita.
Já se disse que Philippe Minyana “escreve partituras para a cena e não acredita em personagens, mas em seres que falam, esfinges, emblemas que compõem uma vasta e complexa alegoria do mundo contemporâneo” (Fréderic Maragani). Para Minyana, o que importa é a pessoa real no teatro sobre o palco.
Serviço: Inventários – O que eu guardei pra você
Data:03 a 25 de maio de 2013
Hora: Quinta a sábado às 19h30; domingo às 18h30
Local: CCBB-pTeatro II
Entrada: R$ 6,00 (inteira), R$ 3,00 (meia)
Classificação 14 anos