Com quase 30 anos de estrada, o Capital Inicial surpreende por ter seu público constantemente renovado. O segredo? “Nós não vivemos do nosso passado. Estamos sempre compondo e lançando coisas novas”, revela Dinho Ouro Preto, vocalista e guitarrista da banda brasiliense em entrevista por telefone ao Jornal de Brasília. A trupe está com disco novo na praça, o primeiro após o acidente do vocalista, que toca o novo repertório no Festival de Inverno de Brasília, sábado (leia mais na página 35).
Foi do clássico do alemão Karl Marx que eles tiraram o nome do álbum – Das Kapital significa “o capital”, na língua original. “Pareceu-nos uma piada irresistível”, conta Dinho. “Misturamos na capa do disco um símbolo do comunismo com o nosso nome, que remete ao capitalismo”. Na foto que compõe a arte, os integrantes da banda, Ouro Preto, Yves Passarel (guitarra) e os irmãos Flávio (baixo) e Fê Lemos (bateria), aparecem em uma bolsa de valores, ou “bolsa de novos valores”, como prefere o cantor, onde estão cotados elementos como amor, sexo, respeito, diversão e rock.
“Acho que o resultado está mais para Groucho Marx (o comediante da trupe Irmãos Marx) do que para Karl”, ironiza. Porém, a discussão política ficou restrita à capa. “Não levantamos bandeiras nem ideologias”, afirma o vocalista. Dinho inspirou-se em álbuns clássicos do rock americano nos quais o conceito da capa nada tem a ver com a música.
“Ao longo do tempo, o Capital manteve princípios que sempre o nortearam. O rock n’ roll tem que ser simples”. Dinho crê que a maturidade adquirida pela banda fez com que seu som se tornasse singular. “O Capital não me remete a nenhuma banda gringa ou brasileira, e isso é motivo de orgulho”, admite. Neste álbum, contudo, eles tentaram implementar uma sonoridade mais contemporânea.
Acontece que, quatro dias antes de botarem os pés no estúdio para iniciarem a captação, Dinho se acidentou em uma apresentação da banda em Patos de Minas (MG), em novembro de 2009. O vocalista caiu do palco e fraturou o crânio, vertebras e costelas. Entrou em coma. Hospitalizado, pegou uma infecção generalizada por uma bactéria, o que agravou seu estado de saúde. Passado o perrengue, quando voltou a si, o vocalista foi consultado sobre os rumos da gravação do CD. Optaram pela sequência planejada sem o líder, que assitiu do hospital as cenas dos colegas trabalhando. Ele colocaria sua voz depois.
Dinho ficou cerca de um mês no hospital. Ao sair, foi submetido a intensas sessões de fisioterapia, ensaios e muita disciplina. Em fevereiro, entrou nos estúdios e descobriu que não conseguia cantar como antes. “Minha voz falhava, eu desafinava. Achei que o acidente tinha afetado algo em relação ao canto”, relembra. Após vários exames, foi diagnosticado que ele estava com a musculatura vocal atrofiada.
Como os trabalhos estavam em andamento e era necessário finalizar o disco, seguiu em frente com apoio de uma fonoaudióloga. “Só conseguia gravar uma canção por dia. Hoje, posso dizer que estou 95 %”, conta ele. Da experiêcia, Dinho acredita que saiu mais corajoso. “Talvez venham daí as mudanças feitas neste disco”. Até hoje ele faz reabilitação e ainda sente muitas dores, mas já fez cerca de dez shows e está bastante animado com o fato de voltar a Brasília.
Segundo Dinho, durante o processo de gravação, o Capital foi na contramão do que é de praxe no rock brasileiro. A gravação foi feita com microfone dos vocais mais baixo e intrumentos mais amplificados, com ênfase na guitarra. “Queríamos soar no disco como somos nos shows ao vivo, algo mais tosco, menos correto, uma vitalidade difícil de ser captada”, revela Dinho.
Pela internet
A internet possibilita um contato maior da banda com seu público. “Com as canções disponíveis em nosso site, pudemos ver quais eram mais ouvidas e quem eram as pessoas que estavam ali”, analisa ele. Apesar da audiência conseguida através dos meios de comunicação de massa tradicionais, Dinho avalia que via internet a divulgação de um trabalho é cada vez maior. “Tenho a impressão de que, no rádio e na tevê, ocorre um monólogo”.
“A indústria fonográfica deve ser a última a se adaptar ao fato de que as pessoas não vão mais pagar por música, mas ela terá que se adaptar”, defende. Hoje em dia, ele, que sempre teve o hábito de ter discos, acostumou-se a comprar músicas pela web. Em um futuro próximo, ele prevê que é a publicidade quem vai custear o trabalho dos artistas.