Roberto Studart
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Um encontro de gerações no palco. Essa é uma das definições que podem ser dadas ao duo formado pelo pianista Gilson Peranzetta e o violonista/guitarrista Nelson Faria. Porém, ela parece limitada para tamanha musicalidade presente. Melhor seria chamar de um encontro de mestres atemporais. O público brasiliense poderá conferir nesta quarta (31), quinta (1º) e sexta-feira (2), no Clube do Choro, o resultado desta parceria, com o show de lançamento do CD Buxixo.

“Eu costumo dizer que sou fã do Gilson desde criançinha”, brinca o mineiro Nelson, 48 anos. Ele ainda lembra quando ouvia os lendários discos de Ivan Lins dos anos 70, entre eles o clássico Somos Todos Iguais Nesta Noite, e ficava maravilhado com os arranjos. Na curiosidade de um músico começando a fazer os primeiros acordes, foi logo atrás da ficha técnica para saber quem estava por trás daquelas obras-primas. Não deu outra, viu logo o nome de Peranzzeta estampado.
Esse foi o primeiro contato do violonista com o trabalho de “um dos maiores arranjadores do mundo”, na opinião de ninguém menos do que o maestro Quincy Jones. Isso mesmo, o famoso produtor norte-americano responsável pelo sucesso exorbitante da carreira de tantos ícones da música mundial, como Michael Jackson. Nos EUA, além de fama de grande arranjador, o lado compositor do pianista também sempre esteve em alta. Suas músicas foram gravadas por nomes de peso, como Sarah Vaughan, George Benson, Patti Austin, Jack Jones, Terence Blanchard e Dianne Schurr.
O tempo passou e Nelson, que teve anos de sua formação musical em Brasília, tornou-se um dos mais requisitados instrumentistas brasileiros. Tocou com João Bosco, com quem trabalhou por 12 anos. E, paralelamente, Gilson, 65 anos, continuou com intenso trabalho na cena musical, seja como instrumentista, compositor ou arranjador. Ambos se conheceram nos estúdios da vida, mas nunca haviam tocado juntos, apesar de sempre se admirarem musicalmente. Até que em um festival de Pirenópolis, em 2009, eles compartilharam o mesmo palco no final do evento. “A troca de notas revelou uma sintonia imediata. Foi um encontro maravilhoso”, afirmou o pianista.
A partir daí, é só deleite aos amantes da música instrumental com o Buxixo nascido daquele encontro. “Nosso trabalho é de música brasileira. Tem choro, baião, samba e bossa nova. Tocamos inclusive duas músicas que compomos juntos, Caindo no Choro e a bossa Rua Bougainville”, faz questão de lembrar Paranzzetta.
No disco, os músicos também visitam com virtuosismo dois clássicos do nosso cancioneiro: Doce de Coco, de Jacob do Bandolim; e Estamos Aí, tema do gaitista Maurício Einhorn. O restante das faixas são temas autorais de cada músico, com exceção de Sacopã, de Nelson e do talvez melhor baixista brasileiro, o saudoso Nico Assumpção.
Influência do jazz
Os principais ritmos tupiniquins estão no trabalho, mas é possível encontrar também a forte influência do jazz no duo. Se não na linguagem dos arranjos, no grande espaço para a improvisação. E haja improviso! “Não improvisamos para impressionar, mas sim para emocionar. Buscamos colocar as notas certas, sem exagero”, ressalta Nelson.
E quem vê as lendas vivas no palco, nem pensa que por trás da formação piano e violão, frequente na música brasileira, tem-se um grande esforço dos músicos solistas para manter o som equilibrado. “Em alguns momentos, esses instrumentos podem trabalhar na mesma região de altura das notas, o que pode causar um embolo só. O segredo é tocar em regiões diferentes, como o grave e agudo por exemplo. Mas, o mais importante é saber aplicar aquela humilde frase: ‘ouça mais do que toque’”, garante Nelson. O pianista complementa a lição com outra nota de sabedoria: “O verdadeiro mestre é aquele que ouve”.
Atualmente morando na Suécia, onde dá aulas na Örebro Universitet, Ingesund Universitet e KMH, Nelson Faria não esconde a felicidade de tocar na capital federal. “Essa cidade é um celeiro de talentos. É mágico o que acontece nela. “Aprendi muito com os amigos músicos candangos no tempo que morei aí”, diz o ex- aluno do Gamela, importante professor e violonista da cidade, a quem Nelson sempre se refere como “meu guru”.
Dizem por aí que toda vez que Quincy Jones escuta uma música arranjada por Gilson, já fala logo “é da grife do Peranzetta “. Será que Jones sabe que o pianista agora arrumou um sócio? Se ninguém sabe, ao menos uma coisa é fato: essa grife é das mais valiosas.
Clube do Choro do Brasil – Show de lançamento do CD Buxixo, de Nelson Faria e Gilson Peranzzetta. Quarta (31 de agosto), quinta (1º) e sexta-feira (2), no Clube do Choro (Eixo Monumental, ao lado do Centro de Convenções Ulysses Guimarães). Ingressos a R$ 20 (inteira). Informações: 3224-0599. Não recomendado para menores de 14 anos.