A quarta noite do 58º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, nesta segunda-feira (15) foi de emoção, reflexão e reconhecimento das trajetórias que moldaram a luta das mulheres negras no país. As exibições da mostra competitiva trouxeram filmes que dialogam com ancestralidade, memória e militância, e renderam discursos potentes após as sessões.
Um dos destaques foi o curta “Laudelina e a felicidade guerreira”, dirigido por Milena Manfredini, que homenageia a trajetória de Laudelina de Campos Melo, pioneira na organização sindical das trabalhadoras domésticas no Brasil. Em entrevista, a diretora contou sobre o desafio de transformar a história dessa liderança em um filme híbrido:
“Foi um desafio, porque a história de Laudelina é imensa e multifacetada. Ela foi e é, na minha percepção, porque pessoas como ela não morrem. O legado que ela deixou continua vivo em cada uma de nós, mulheres negras. No filme, eu faço questão de deixar claro que apresento apenas um fragmento de sua vida, que foi múltipla e grandiosa”, explicou.

Formada em Antropologia, Milena ressaltou que o filme nasce de um processo de pesquisa intenso. “Acredito que a antropologia aparece no meu trabalho no mergulho nos arquivos e na compreensão de que a pesquisa é tão importante quanto o próprio filme. Não existe cinema sem pesquisa”, afirmou.
Antes da exibição, a diretora reforçou sua religião ao agradecer aos orixás, à equipe do filme e fez uma menção emocionante à própria trajetória, lembrando ser filha e neta de trabalhadoras domésticas — reforçando a conexão pessoal com o legado de Laudelina.

Outro momento de destaque da noite foi a exibição de “4 Meninas”, de Karen, que aborda relações marcadas por raça, poder e afeto. Karen contou que buscou traduzir visualmente a sensação de passado e memória: “No filme, há grãos na imagem, porque o passado nem sempre é nítido. Nossas ancestrais não sabiam exatamente o futuro, mas estavam trabalhando por ele. A direção parte desse sentimento e da forma como a história reverbera em mim”, disse.
Ao final da sessão, a diretora agradeceu às ancestrais e ao apoio do público, reforçando o caráter coletivo da obra.

A noite também contou com a presença de Silvilene, diretora de fotografia do curta “Faísca”, que destacou o caráter colaborativo e afetivo da produção: “Para mim e para toda a equipe, é uma alegria ver o filme nascer e crescer. Fizemos tudo com muito amor e com recursos próprios, sem apoio governamental. Estar aqui hoje é uma vitória coletiva”, afirmou.
Quem não pôde comparecer foi a diretora do curta, Bárbara M. Kariri, cuja ausência foi registrada pela equipe.