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Cinema

Festival de Brasília vive noite de reencontros e estreia de “Assalto à Brasileira”

Belmonte retorna à cidade que o formou cineasta e apresenta longa no penúltimo dia da Mostra Competitiva Nacional

Tamires Rodrigues

19/09/2025 0h30

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Foto: Tamires Rodrigues/JBr

O 58º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro se aproxima do fim com uma noite marcada por reencontros, emoção e tensão no Cine Brasília. No penúltimo dia da Mostra Competitiva Nacional, nesta quinta-feira (18), o público assistiu à estreia de Assalto à Brasileira, novo longa de José Eduardo Belmonte. Mais do que lançar um filme, a sessão simbolizou o retorno do diretor à capital onde iniciou a carreira e consolidou sua identidade artística.

Belmonte conta que decidiu filmar o episódio por considerá-lo tão impressionante que dificilmente acreditaria se não tivesse conhecido os envolvidos. Para ele, a trama vai além do registro de um crime: é um retrato simbólico do país. “É uma grande história sobre o Brasil, sobre essa relação tensa que o brasileiro tem com seu próprio caos. Ela fala de uma época, mas também de quem somos enquanto sociedade”, refletiu.

O cineasta fez questão de afastar qualquer ideia de espetacularização do crime. Segundo ele, não havia criminosos profissionais, mas amadores que agiram no improviso. “Nosso filme não glamoriza nada. Ele mostra a desigualdade, a violência e as fissuras sociais em que vivemos. É um retrato do caos brasileiro, que ao mesmo tempo traz humor e humanidade. Às vezes, a gente ri do absurdo como forma de sobrevivência”, disse.

Ao adaptar a história real para a ficção, Belmonte precisou condensar fatos e personagens, sem perder a essência. “Não é um documentário, é uma tradução. Tivemos que transformar doze horas em duas, mas mantendo o espírito dos acontecimentos. Eu gosto de pensar que é um filme de aventura humana”, definiu.

De volta ao Cine Brasília, o diretor destacou a importância da cidade em sua formação. Formado pela Universidade de Brasília, ele lembrou a influência do festival em sua trajetória. “Eu fui criado aqui, esse cinema foi a minha escola. Brasília me ensinou a misturar culturas, a conviver com olhares diferentes. É muito simbólico apresentar este trabalho neste palco. Estou profundamente honrado”, declarou.

No elenco, Paulo Miklos interpreta o policial que lidera o cerco ao banco assaltado. Para o ator, foi a chance de viver um papel inédito em sua carreira. “Dessa vez, estou do outro lado. Não sou bandido, sou o comandante da ação policial. Até um comandante real me disse que, se fosse hoje, estaria no meu lugar. Então, tratei de caprichar”, contou. Ele também destacou a força dramática da obra: “Nada foi inventado. O que está na tela é o que aconteceu de verdade, e é isso que dá ainda mais impacto.”

Robson Nunes ressaltou o processo intenso de preparação. Segundo ele, a unidade criada pelo elenco foi fundamental para o resultado. “A gente ensaiava junto, improvisava, estava conectado de um jeito que as cenas nasciam naturalmente. Isso fez com que cada personagem tivesse relevância”, afirmou.

Já Matheus Macena vive um dos assaltantes que se apaixona por uma refém em meio ao caos. Para o ator, a trama ilustra o espírito contraditório do brasileiro. “É uma história factual que mistura ação, aventura, tragicidade e comicidade. Esse contraste é a essência do brasileiro: rir do absurdo e sobreviver ao improvável”, avaliou. Ele também valorizou o trabalho coletivo: “O Zé foi incansável. Foram semanas de ensaio que criaram uma irmandade rara entre nós. A sala de ensaio virou um espaço de confiança absoluta, e isso aparece na tela.”

Para o produtor Marcelo Braga, Assalto à Brasileira vai além de um relato criminal. Ele enxerga no longa um retrato de um Brasil em transição, ainda marcado pelos traumas da ditadura e pela inflação galopante. “Era um país em que a economia mudava do dia para a noite e em que um grupo de amadores tentou, sem preparo algum, invadir um banco e acabou recebendo apoio popular. É uma história distante, mas não tão distante assim. O Brasil continua atravessando momentos difíceis no campo social, político e econômico. Esse filme resgata um passado, mas também conversa com o presente. O brasileiro merece ver essa história”, avaliou.

Curta alagoano retrata tensões e vivências em um canteiro de obras

A noite também trouxe a exibição de Ajude os Menor, curta que se passa em um canteiro de obras em Maceió. Dirigido por Janderson Felipe e Lucas Litrento, o filme propõe discutir o trabalho informal e cotidiano a partir de uma chave inesperada: o faroeste em preto e branco.

Para os diretores, filmar em uma obra real deu força extra à narrativa. “Foi desafiador, mas muito potente. Queríamos mostrar não os cartões-postais da cidade, mas o que muitas vezes é invisível — a sujeira, o suor e a vida de quem ergue a cidade”, explicou Janderson.

Lucas destacou a ousadia da proposta estética. “A ideia foi pegar o cotidiano do trabalho e colocá-lo dentro de uma abordagem de faroeste, o que torna a experiência ainda mais curiosa. Estou ansioso para ver como o público vai reagir a esse contraste”, disse.

Exibir o filme no Festival de Brasília, segundo eles, foi a realização de um sonho. “Eu já tinha vindo como público, numa caravana de cinema alagoano. Agora, voltar e ver nosso filme na tela grande do Cine Brasília é algo muito especial”, contou Lucas.

O festival encerra a Mostra Competitiva nesta sexta (19), com as últimas sessões de curtas e longas. A cerimônia de premiação acontece no sábado (20), às 17h, no Cine Brasília, seguida da exibição de A Natureza das Coisas Invisíveis, de Rafaela Camelo.

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