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Política & Poder

STF julga ação que pode afrouxar controle da verba pública usada por partidos

Os atuais 33 partidos políticos brasileiros recebem somas bilionárias dos cofres públicos

Redação Jornal de Brasília

21/08/2020 12h19

RANIER BRAGON
BRASÍLIA, DF

O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) começa a julgar nesta sexta-feira (21) uma ação proposta por 17 partidos políticos –em uma rara união da esquerda à direita– com o objetivo de abrandar ainda mais as regras de controle sobre o uso do dinheiro público pelas legendas.

Proposta pelos esquerdistas PT, PSOL, PSB, PDT e PC do B e pelos centristas ou direitistas DEM, MDB, PL, PP, PSD, PSDB, Cidadania, Solidariedade, PTB, Republicanos, Podemos e PSL, a ação direta de inconstitucionalidade 6.395 tem como pedido principal dar às siglas uma espécie de direito quase perpétuo de tentar sanar irregularidades detectadas em suas prestações de contas.

Os atuais 33 partidos políticos brasileiros recebem somas bilionárias dos cofres públicos. São dois fundos, o partidário, com cerca de R$ 1 bilhão ao ano, e o eleitoral, com cerca de R$ 2 bilhões a cada dois anos.

Como contrapartida, as siglas são obrigadas a apresentar prestações de contas anuais, que são analisadas e julgadas pela Justiça Eleitoral. A obrigação se estende também aos candidatos.

Não raro ocorrem evidências do mau uso dessa verba, como compra de helicóptero e carros de luxo, além de outros gastos controversos. E as regras de fiscalização vêm sendo afrouxadas nos últimos anos, já que cabe aos próprios partidos, por meio dos congressistas, aprovar alterações na legislação eleitoral.

A Adin protocolada pede que seja derrubada norma do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que deixa claro que o partido perde o direito de se manifestar sobre determinado ponto caso perca o prazo estabelecido pelo juiz para apresentar documentos ou provas para sanar irregularidades detectadas em suas prestações de contas.

As siglas entendem que essa possibilidade deve ser facultada aos partidos durante qualquer fase do processo, até o trânsito em julgado (a sentença definitiva, sem possibilidade de recurso).

Um exemplo: hoje, caso técnicos da Justiça Eleitoral detectem um gasto não comprovado por nota fiscal, solicitam a apresentação do documento que comprove a existência daquele serviço ou compra. O juiz responsável pelo caso  geralmente dá um prazo, que pode ser superior a um mês, para o partido comprovar o correto uso da verba pública.

Caso a sigla não se manifeste nesse prazo, ocorre a preclusão –ou seja, ela perde o direito de acrescentar nos autos documentos relativos àquela suposta irregularidade, por não ter feito isso no momento apropriado– e o processo segue o trâmite.

Se a Adin for aceita pelo STF, o partido poderá apresentar provas sobre esse ponto a qualquer momento.

A relatoria do pedido é de Gilmar Mendes, que colheu pareceres do TSE, da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República. Os três órgãos opinaram pela rejeição do pedido.

“Permitir que documentos sejam juntados indefinidamente nos processos de prestação de contas não só viola o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade como também o da duração razoável do processo”, afirmou Humberto Jacques de Medeiros, vice-procurador-geral da República.

Nesta sexta, Gilmar pode apresentar seu voto no julgamento virtual. Os demais ministros têm até dez dias para inserir seus votos no sistema.

De acordo com críticos do pedido feito pelos partidos, a liberação poderá tornar os processos um infindável vaivém de análises de documentos e manifestações apresentadas pelos partidos, contribuindo ainda mais para a lentidão do já vagaroso processo de análise.

Pela lei, a punibilidade por irregularidades no gasto com o dinheiro público prescreve se as prestações de contas não forem analisadas em até cinco anos. Salvo casos de maior repercussão, a Justiça Eleitoral já trabalha no limite do prazo, ou seja, julga contas que estão prestes a prescrever.

“É uma justiça que já é lenta e, quando você coloca muitos instrumentos protelatórios, o que você quer é produzir injustiça. Os partidos estão usando recursos públicos, eles têm o dever de ser os mais céleres na prestação de suas contas, na transparência. Essa Adin é pra beneficiar quem está cometendo irregularidades”, afirmou o diretor-executivo da Transparência Brasil, Manoel Galdino.

De acordo com o diretor-executivo do Movimento Transparência Partidária, Marcelo Issa, caso o STF atenda ao pedido das legendas, seria possível protelar a apresentação de documentos, resultando em prescrição.

“Além disso, a regra da preclusão nos processos de prestação de contas dos partidos poderia ser reconhecida pelo juiz, ainda que a resolução do TSE não fosse explícita a esse respeito, uma vez que esses processos têm caráter jurisdicional, e não meramente administrativo, o que faz com que os princípios e as regras do processo judicial sejam aplicados independentemente de previsão específica.”

No pedido encaminhado, os 17 partidos afirmam que o TSE extrapolou suas funções ao tentar legislar no lugar do Congresso, violando o princípio da separação entre os Poderes, além de afrontar os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Advogado especialista em direito eleitoral e direitos políticos, Ricardo Penteado concorda com o pleito dos partidos, afirmando que eles não podem ser punidos por eventuais dificuldades ou desorganização que os impeça momentaneamente de cumprir os prazos definidos.

“O partido político tem um papel institucional de viabilizar as representações política e tudo mais. Ele só pode ser punido com base na verdade real, que difere da verdade formal. O partido pode ser punido a despeito de não ter culpa. A culpa dele é processual, ele não trouxe um documento na hora. Mas, se ele trouxer a tempo na decisão algo que influi no julgamento, penso, sim, deve ser considerado”, afirmou.

Segundo ele, eventuais abusos ou tentativas de procrastinação podem e seriam identificadas e coibidas pela Justiça.

As informações são da FolhaPress 

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