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Política & Poder

PGR é alvo de críticas no inquérito dos atos

Investigadores e advogados familiarizados com o processo sigiloso dizem reservadamente até que a PGR “abandonou” o inquérito sobre a organização e o financiamento dos atos que pediam intervenção militar e atacavam o Supremo e o Congresso Nacional

Marcus Eduardo Pereira

12/12/2020 15h29

O inquérito dos atos antidemocráticos foi deixado de lado pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Apesar de ter solicitado ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura da apuração em abril, no auge das manifestações contra a democracia, a Procuradoria tem aguardado passivamente o trabalho da Polícia Federal, segundo o Estadão apurou com fontes que acompanham o caso.

Investigadores e advogados familiarizados com o processo sigiloso dizem reservadamente até que a PGR “abandonou” o inquérito sobre a organização e o financiamento dos atos que pediam intervenção militar e atacavam o Supremo e o Congresso Nacional.

Desde julho, a PGR não solicita providências na investigação, que já fechou o cerco sobre o “gabinete do ódio” e uma série de canais bolsonaristas que chegam a faturar, por mês, mais de R$ 100 mil. Além disso, a Procuradoria não tem participado dos depoimentos tomados pela Polícia Federal. Foram mais de 30 oitivas, entre assessores do Palácio do Planalto, dois filhos do presidente Jair Bolsonaro – o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) – parlamentares bolsonaristas e donos de canais alinhados ao governo. A PGR não enviou representante para esses depoimentos.

A percepção fora da PGR é que o ímpeto da Procuradoria nas investigações arrefeceu após o esvaziamento das manifestações, que se concentraram entre março e junho. Um integrante da cúpula da PGR ouvido pela reportagem negou “abandono” da investigação, mas avaliou que o inquérito pode ter ajudado a baixar a temperatura e frear os protestos, cumprindo, assim, certo “efeito pedagógico” de que aqueles atos não serão tolerados.

A abertura de investigação criminal com base na Lei de Segurança Nacional foi solicitada pela PGR logo após o Dia do Exército, quando o presidente Jair Bolsonaro fez um discurso “dúbio” diante de um público que pedia intervenção militar, em frente ao Quartel General do Exército, em abril. “Acabou a época da patifaria. Agora é o povo no poder. Vocês têm a obrigação de lutar pelo País de vocês”, disse Bolsonaro. “Nós não queremos negociar nada. Queremos é ação pelo Brasil”, prosseguiu ele, aplaudido por centenas de manifestantes. O chefe do Executivo não é formalmente investigado.

No início da apuração, a PGR chegou a pedir quebras de sigilo fiscal e bancário de deputados e de integrantes dos canais que supostamente disseminaram conteúdo antidemocrático para obter lucro. Também solicitou relatórios de monetização (arrecadação financeira com base na audiência de vídeos) dessas contas no YouTube. Esses materiais, porém, estão sob análise apenas da Polícia Federal. A PGR poderia ter pedido acesso a conteúdos de investigação no período, mas ainda não fez.

Briga

A apuração dos atos antidemocráticos virou mais um capítulo da briga corporativa entre Polícia Federal e Ministério Público pelo controle das investigações. A pedido da PGR, o relator do inquérito, ministro Alexandre de Moraes, determinou em junho a operação de busca e apreensão em endereços de 21 aliados bolsonaristas, incluindo o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ).

A PF, no entanto, se opôs à realização da operação. Em ofício encaminhado a Moraes, a delegada Denisse Dias Rosas Ribeiro apontou que o cumprimento das ordens representaria um “risco desnecessário à estabilidade das instituições”. Ela pediu mais tempo para se manifestar sobre quais diligências deveriam ser feitas no caso.

Segundo interlocutores do procurador-geral da República, Augusto Aras, a PGR tem sido informada pela imprensa sobre os desdobramentos do inquérito, o que teria levado à ausência nos depoimentos de testemunhas e investigados marcados pela PF. Uma fonte que acompanha as investigações, no entanto, assegura que o Ministério Público foi comunicado do cronograma das oitivas.

A situação destoa, por exemplo, de muitos casos da Operação Lava Jato no Supremo e também do inquérito que apura suposta interferência indevida do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal, em que procuradores se fizeram presentes.

O discurso na Procuradoria sobre o inquérito, no entanto, é o de que é normal a Polícia Federal realizar as atividades de investigação. Os comentários são de que não existe regra impondo a participação de procuradores em depoimentos. A presença da Procuradoria em alguns casos seria a exceção, e não a regra.

Ao mesmo tempo que aguarda a conclusão dos trabalhos da PF, a PGR dá sinais de discordar da linha da investigação que vem sendo feita pela delegada da Polícia Federal Denisse Ribeiro. Para um integrante da cúpula da PGR, a delegada teria aberto novas linhas de investigação “midiáticas”, constrangendo os filhos do chefe do Executivo e pedindo o compartilhamento de provas com a CPMI das Fake News, que não teria rendido frutos. Cabe à PGR decidir se denuncia os proprietários de canais que orbitam em volta do Planalto, deputados bolsonaristas e empresários por crimes previstos na Lei de Segurança Nacional.

Procurada, a PGR informou que “tem respeitado todas as escolhas investigativas feitas pela Polícia Federal e espera que a corporação chegue a bons resultados que respondam às questões postas na abertura da investigação para identificação e punição dos responsáveis pelos crimes em apuração”.

“Todas as vezes que o Supremo Tribunal Federal enviou os autos para o Ministério Público Federal, a instituição exerceu seu papel de titular da ação penal, solicitando diligências no sentido das linhas investigativas definidas. Os autos não estão com a PGR no período mencionado pela reportagem”, afirmou a PGR. A PF, por sua vez, não se manifestou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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