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Política & Poder

Novo inquérito por crítica a governo Bolsonaro visa calar os que apontam erros, diz presidente da OAB

O ministro da Justiça André Mendonça chamou as publicações de crimes contra chefes de Estado e de desrespeito à pessoa humana e à nação

Redação Jornal de Brasília

21/01/2021 18h59

Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, disse que a requisição de mais um inquérito policial pelo ministro da Justiça, André Mendonça, devido a falas críticas contra o presidente Jair Bolsonaro demonstram que a preocupação do governo é “intimidar e tentar calar os que apontam seus erros no lugar de salvar vidas”.

“No momento em que o país soma mais de 212 mil vidas perdidas, a preocupação demonstrada pelo governo é intimidar e tentar calar os que apontam seus erros no lugar de salvar vidas, suprir oxigênio nos hospitais e viabilizar a vacinação de todos”, disse Santa Cruz em nota.

Após outros pedidos semelhantes contra jornalistas, o ministro André Mendonça pediu mais um inquérito com base na Lei de Segurança Nacional, desta vez para investigar o advogado Marcelo Feller, de São Paulo. A Polícia Federal, subordinada a Mendonça e ao presidente, já abriu uma investigação.

Em julho do ano passado, quando integrava o quadro “O Grande Debate”, da CNN, Feller citou estudos e disse que o discurso do presidente era responsável por pelo menos 10% das mortes por Covid-19 no país.

“O ministro da Justiça, André Mendonça, ao requisitar inquérito policial para investigar o advogado Marcelo Feller, busca atingir, mais uma vez, quem se manifesta de forma crítica ao descalabro do governo diante da pandemia que atinge os brasileiros”, diz a nota do presidente da OAB.

Santa Cruz classifica a medida do ministro como uma tentativa de criminalizar críticos ao governo. “Com a tentativa de criminalizar os críticos, o ministro extrapola suas funções, desvia o foco dos verdadeiros responsáveis pelo descaso com a saúde dos brasileiros e desrespeita princípios caros ao Estado Democrático de Direito, como a liberdade de expressão.”

O advogado Alberto Toron, que representa Feller, diz que a iniciativa “revela uma faceta opressiva contra a liberdade de expressão e crítica e, mais ainda, contra a liberdade de imprensa, pois Feller falava na condição de debatedor contratado da CNN”. O advogado afirmou que impetraria um habeas corpus pedindo o trancamento da investigação.

“Feller disse o que hoje todos dizem: que o presidente tem responsabilidade sobre a política que resultou nessa multidão de mortos”, afirma.

Não é a primeira vez que Mendonça pede abertura de inquéritos com base na Lei de Segurança Nacional devido a críticas públicas contra o governo.

O último deles resultou na abertura de inquérito contra o colunista da Folha de S.Paulo Ruy Castro e o jornalista Ricardo Noblat, da revista Veja.

A motivação da investigação foi a publicação de texto de Castro com o título “Saída para Trump: matar-se”. O autor afirmava que, se o presidente americano optar pelo suicídio, Jair Bolsonaro deveria imitá-lo. Já Noblat se tornou alvo da investigação por ter compartilhado, em rede social, um link para o texto de Castro e por ter reproduzido alguns trechos.

“Alguns jornalistas chegaram ao fundo do poço. Hoje dois deles instigaram dois presidentes da República a suicidar-se. Apenas pessoas insensíveis com a dor das famílias de pessoas que tiraram a própria vida podem fazer isso”, escreveu Mendonça em uma rede social à época.

O ministro chamou as publicações de crimes contra chefes de Estado e de desrespeito à pessoa humana e à nação.

Luis Mileo, professor de direito penal do Ibmec-SP (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais), argumentou na ocasião que não há crime nas publicações. “Absolutamente nada. Nada, nada, nada.”

Segundo ele, os jornalistas só poderiam ser apontados como infratores do artigo 122 se enviassem diretamente a Bolsonaro uma ou mais mensagens para que ele se suicidasse -e não escrever em uma publicação que o presidente poderia ou não acessar.

“A requisição de inquérito por parte do ministro é absolutamente inviável. Porque a informação não é apta e idônea a levar adiante uma ação por parte da vítima, que seria em tese o Bolsonaro, e não é direta. Vejo como uma matéria crítica, mas jamais criminosa”, afirmou Mileo.

Em junho de 2020, o próprio Noblat foi alvo de um pedido de apuração feito pelo ministro à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal com base na Lei de Segurança Nacional (LSN), após o jornalista ter compartilhado a imagem de uma charge do cartunista Aroeira que ilustrava Bolsonaro pintando uma suástica nazista.

À época, Noblat disse que o governo estava usando a LSN para perseguir críticos.

No mês seguinte, Mendonça requisitou a abertura de um inquérito pela PF, com base na mesma lei -um resquício da ditadura militar-, para investigar o colunista da Folha de S.Paulo Hélio Schwartsman em razão de um artigo publicado no jornal.

O texto “Por que torço para que Bolsonaro morra” foi publicado depois de o presidente anunciar que havia contraído o novo coronavírus.

No mês seguinte, o ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Jorge Mussi suspendeu o inquérito para investigar Schwartsman. Mussi atendeu a um pedido da Folha de S.Paulo e concedeu liminar que suspendia o procedimento até o julgamento do habeas corpus.

Em nota, a Folha de S.Paulo afirmou que, “como no caso de texto anterior de Hélio Schwartsman, que teve inquérito aberto pelo mesmo ministro e depois suspenso pelo STJ, o colunista emitiu uma opinião; pode-se criticá-la, mas não investigá-la”.

As informações são da FolhaPress

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