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Política & Poder

Kassio à moda de Decotelli?

Desembargador tenta desfazer polêmica sobre pós-graduação contestada na Espanha

Redação Jornal de Brasília

08/10/2020 7h00

Foto: Ramon Pereira/Ascom TRF1

Hylda Cavalcanti
[email protected]

Envolvido em uma semana de videoconferências, audiências e jantares com os senadores antes da realização da sabatina que o aprovará ou não para a vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) para a qual foi indicado, o desembargador Kassio Nunes Marques vê-se agora enredado em denúncias que envolvem divergências no seu currículo.

Uma situação que lembra o caso de Carlos Decotelli que, também por divergência de informação em seu currículo, acabou ficando apenas um dia como ministro da Educação.

Kassio passou o dia de ontem procurando explicar aos senadores que irão sabatiná-lo uma situação parecida envolvendo um suposto curso de pós-graduação da Universidad de La Coruña, na Espanha. Os problemas começaram depois que o jornal O Estado de São Paulo divulgou, na noite de terça-feira (6) que a universidade negava que Marques tivesse feito ali uma pós-graduação. O desembargador indicado para o STF passou o dia negando que tivesse cometido uma fraude e alegando que a confusão dava-se por um erro de tradução. Mas o episódio já provocou incômodo entre os senadores.

Em um jantar

O problema para Kassio é que a notícia o encontrou participando de um jantar no apartamento da senadora Katia Abreu (PP-TO), na presença de um grupo de outros senadores, do ministro do STF Gilmar Mendes e dos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo e Bruno Dantas. Estava programado para ser uma confraternização, mas o clima de constrangimento não passou despercebido.

A ideia era que Kassio expusesse aos parlamentares seus projetos e expressasse um pouco do seu pensamento sobre temas diversos. Mas como poucas horas antes tinha surgido a notícia do currículo, embora ele tenha apresentado suas ideias, ficou no ar um ambiente de preocupação, conforme contaram duas pessoas que participaram do encontro.

Na mesma noite, o desembargador foi até a casa do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), com quem conversou abertamente sobre o caso. Segundo Rodrigues disse depois, Kassio explicou que o curso rápido que teria feito na Espanha, seis anos atrás, teria sido definido como “postgrado”, tipo de especialização sem paralelo com a pós-graduação nos moldes brasileiros.

“No entender dele, é uma compreensão que não é correta, de ser pós-graduação. O que ele disse e está realmente no currículo é que fez um ‘postgrado’, em espanhol”.

Mero erro de tradução?

Segundo o senador Randolfe Rodrigues, que ouviu as explicações de Kassio, ele nunca tratou o curso que fez na Espanha como se fosse uma pós graduação.

De fato, no currículo de Marques publicado no site do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF 1), onde é desembargador desde 2011, consta que ele fez curso de “Postgrado” em “Contratación Pública”, pela Universidad de La Coruña. Não está escrito pós-graduação.

O site do TRF 1 não traduziu o termo, nem ele em momento algum disse que se tratava de uma pós-graduação.

Espanto

Às vésperas, porém, da sabatina e da votação pelo Senado que aprovará ou não seu nome, ficará a polêmica. Na avaliação do cientista político e analista legislativo do Senado Alexandre Ramalho, o caso provoca espanto. A seu ver, integrantes do Palácio do Planalto e assessores do próprio magistrado, que é desembargador e deve estar habituado a revisar seus votos, deveriam ter avaliado o material que foi divulgado a seu respeito como grade curricular previamente e ter feito de imediato a retificação. “Por parte do Planalto, porque já viveu um escândalo com o ex-ministro, Carlos Alberto Decotelli, por motivo parecido, a falta de atenção é pior ainda”, afirmou Ramalho.

Em relação à situação de Decotelli, ele teve uma pós-graduação mencionada no seu currículo negada pela universidade. Argumentou, na época, que apresentou todos os trabalhos e que a negativa se deu porque ainda não tinha ido buscar o título final.

Mesmo assim, apesar de nomeado, não assumiu o ministério.

Kassio Nunes Marques é um magistrado elogiado pelos pares como produtivo, com bom conhecimento jurídico e equilibrado. Mas teve seu nome criticado quando foi mencionado para o STF pela pouca idade, por não ter passado ainda por nenhum tribunal superior e pelo fato de, justamente, não ser grande detentor de cargos acadêmicos como os demais integrantes do colegiado do Supremo.

Agora, com esse debate sobre o seu currículo, ele tem mais motivos para intensificar o contato com os senadores e convencê-los a ser aprovado na sabatina.

Sabe-se que o Senado, tradicionalmente, não costuma rejeitar um nome indicado para o STF, mas costuma apresentar perguntas muito rígidas e constrangedoras para ver como o candidato vai reagir e de que forma programática irá responder.

É isso o que se espera da sabatina de Kassio no próximo dia 21. “Hoje, posso dizer que o nome dele tende mais para ser aprovado. Mas podemos dizer que será nitroglicerina pura”, disse um ministro do TST.

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