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Política & Poder

Ela invadiu o cercadinho e peitou o presidente

Em entrevista exclusiva, Cris Bernart conta como entrou no meio da claque governista e cobrou Bolsonaro sobre a pandemia

Rudolfo Lago

15/06/2020 5h47

“Como confrontei o presidente”

Na última terça-feira, 9 de junho, Cris Bernart pegou um avião no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, e desembarcou em Brasília. No dia seguinte, acordou bem cedo para conseguir chegar antes das 7h no Palácio da Alvorada. Cris precisava estar entre as primeiras a chegar, para ter certeza de que ficaria entre as pessoas que passariam para o cercadinho montado em baixo da mangueira na entrada da residência oficial do presidente. É ali que todas as manhãs o presidente faz já há alguns meses seu show particular. Provoca e agride jornalistas e diz frases de efeito. Que a claque posicionada no cercadinho aplaude frenaticamente.

Naquele dia, porém, seria diferente. Naquele dia, Cris Bernart estava ali para confrontar o presidente. Para cobrar dele alguma atitude com relação às mais de 41 mil famílias brasileiras que a essa altura já perderam algum parente para a covid-19. Naquele dia, Bolsonaro não foi exatamente chamado por alguém no cercadinho de “mito”. Naquele dia, o que se ouviu não foram aplausos.

Nem Bolsonaro teve ajuda da claque para rir de suas próprias piadas.

“Foi muito simples”

Depois que a atriz gaúcha, residente em São Paulo, disse na cara do presidente que ele “traiu a população” que o elegeu, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência cogita modificar os critérios para a entrada dos populares no cercadinho, de modo a evitar que ocorram novas surpresas no show diário de Bolsonaro e sua claque. Mas, até então, era bastante fácil fazer o que fez Cris Bernart. “Quando dizem que eu me infiltrei no cercadinho, parece até que eu fiz uma coisa meio de 007”, diz Cris, nesta entrevista exclusiva ao Jornal de Brasília. Mas foi muito simples.

Qualquer um pode entrar. Quem quiser, vá lá pentelhar o presidente”, brinca ela.

A atriz, que tem um canal no YouTube com 30 mil inscritos, apoiou e fez campanha para Bolsonaro. Ela é simpatizante do Movimento Brasil Livre (MBL) e, desde março, trabalha em São Paulo no gabinete do vereador Fernando Holliday, do PSL e também do MBL.

Além de atriz, Cris é formada em Letras. Com Holliday, ela trabalha como revisora de seus artigos, discursos e outros textos.

Como os demais integrantes do movimento que tem como maior representante o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), Cris hoje está decepcionada com o governo Bolsonaro. Segundo ela, há muito tempo ela queria externar diretamente ao presidente seu desânimo com os rumos do governo. E foi assim que ela planejou a ação em que o questionou diretamente.

Para Cris, algo que esteve longe de ter o propósito de constranger Bolsonaro. “Todo cidadão tem direito a questionar seu presidente, a questionar as pessoas que elege”, defende ela. “Eu não pretendi agredir. Eu não usei palavrão. Eu não xinguei. Só fiz questionamentos a alguém que é servidor público, eleito, e que, portanto, tem o dever de dar satisfação”.

O segredo é chegar bem cedo

Para Cris, os questionamentos que fez ao presidente nada têm de constrangedores. “Até agora, estou esperando que ele ou alguém do governo responda aos meus questionamentos. Se ele se sentiu constrangido, é porque sabe que vem agindo errado”, considera ela.

Com vontade de confrontar o presidente, Cris primeiro conversou sobre sua ideia com outro integrante do MBL, Renan Santos. Ele disse a ela que o MBL planejava uma série de ações no sentido de trabalhar pelo impeachment de Bolsonaro. E que, portanto, se ela quisesse fazer o ato, ela teria nos canais do movimento o espaço para a divulgação. Segundo ela, esse foi o único apoio que obteve do MBL. Como ela tinha, segundo ela, outros assuntos a resolver em Brasília, pediu licença não remunerada do gabinete, comprou do próprio bolso a passagem e ficou hospedada na cidade na casa de amigos.

Antes do cercadinho onde a claque todos os dias serve de plateia para Bolsonaro, há, segundo Cris, um outro cercadinho onde ficam as pessoas que vão chegando. Há um limite pré-estabelecido de pessoas que podem entrar. Então, o segredo é chegar cedo para estar entre os primeiros. Ali, é feito um cadastro. Mas esse é o único critério. E é feito um crivo dos objetos que cada um leva consigo. E nada mais além disso.

Saiba Mais

“Eu fui muito corajosa!”, diz Cris. “Eu estou muito orgulhosa de mim.”

“O ambiente é hostil. Um pouco intimidador. Além dos manifestantes, há muitos guardas ali. Você está numa área de segurança nacional. E nunca sabe como aqueles apoiadores vão reagir.

O gesto de Cris Bernart foi o tema mais comentado nas redes sociais naquele dia. Alcançou os trending toppics do Twitter. Cris foi elogiada por muitos. Mas xingada e criticada também por outros.

Loura e de olhos claros, ela tem certa semelhança com a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), outra ex-apoiadora de Bolsonaro agora rompida com ele. Joice é chamada nas redes de ódio bolsonarista de “Peppa”, alusão ao personagem Peppa Pig do Muppet Show. Assim, Cris passou a ser chamada nessas redes de “Peppa do MBL”. “Muita baixaria. Eu já sou comunista não só na Austrália, mas em todo canto para esses fanáticos”, brinca ela.

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