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Política & Poder

Bolsonaro pressiona Guedes

Diante do impacto eleitoral do auxílio emergencial, presidente vai abandonando discurso liberal

Rudolfo Lago

27/08/2020 6h29

Foto: Agência Brasil

Um estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na manhã de ontem encheu os olhos do presidente Jair Bolsonaro. O estudo aponta que o auxílio emergencial de R$ 600 dado pelo governo para ajudar as famílias mais carentes durante a pandemia da covid-19 tirou 13,1 milhões de pessoas da pobreza até julho de 2020.

Um detalhe que torna ainda mais insuspeito o dado é que a pesquisa foi coordenada pelo ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo Dilma Rousseff, o economista Marcelo Néri, alguém que não teria qualquer inclinação de inflar os feitos do atual governo.

O estudo de Marcelo Néri é baseado em dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD) Covid. Segundo o economista, houve uma queda de 20,69% na proporção da população que está na faixa de pobreza após a concessão do benefício. Como os dados mostram perdas para o contingente da população que não recebe o auxílio, fica claro que a melhora para os mais pobres está diretamente relacionada a ele. Ou seja, o auxílio emergencial tornou-se um importantíssimo fator de movimentação da economia neste período de crise provocado pela covid-19, quando, conforme outra informação recente divulgada pelo IBGE, foram fechadas até o mês de julho 716 mil empresas no país.

Desenvolvimentista

Com as informações do IBGE nas mãos, Bolsonaro chegou na manhã de ontem à cidade mineira de Ipatinga e resolveu detonar o ministro da Economia, Paulo Guedes. Diante da constatação do impacto da concessão do auxílio e do potencial eleitoral que isso pode ter para as suas chances de reeleição em 2022, o presidente quer manter o mais próximo disso a ajuda do governo à população. No meio de uma crise em que escasseia o dinheiro privado, os argumentos dos desenvolvimentistas de que o Estado vai precisar ser o indutor da retomada econômica ganham força perante o presidente. E perde encanto o perfil liberal de Paulo Guedes.

Não foram poucos os que notaram ontem a repetição do mesmo tipo de figurino que Bolsonaro vem usando para fritar auxiliares, desde a primeira demissão no primeiro escalão, do ex-secretário de governo Gustavo Bebianno. Bolsonaro deu um prazo de três dias, até amanhã, para Guedes apresentar uma nova proposta para o Renda Brasil, programa que subsituirá o Bolsa Família, que atenda o que quer o presidente.

Na semana passada, Guedes chegou a dizer que esperava que acontecesse esta semana o “Big Bang Day”, numa referência ao momento em que a ciência diz ter havido a explosão que deu início à expansão do universo.

O tal dia celestial deveria ter sido na terça-feira (25). Mas tudo acabou cancelado, e se alguma explosão se deu, ela parece ter sido dado sobre a cabeça do ministro da Economia.

Entre “pobres” e “paupérrimos”

Guedes projetava um modelo que permitiria o aumento tanto do valor médio do Bolsa Família quando do universo de beneficiados. Imaginava aumentar o valor médio de R$ 191 para R$ 250. E atender 25 milhões de famílias (hoje, são 14 milhões). Mas Bolsonaro achou pouco, diante do auxílio emergencial de R$ 600. Queria chegar a R$ 300. Para tanto, Guedes sugeriu então o corte de outros benefícios dados hoje, como o abono salarial, o Farmácia Popular e as deduções de gastos com saúde e educação no imposto de renda. Em Ipatinga, Bolsonaro bateu o pé e avisou que não aceita nada disso.

“Ontem, discutimos a possível proposta do Renda Brasil. E eu falei ‘está suspenso’, vamos voltar a conversar. A proposta, como a equipe econômica apareceu para mim, não será enviada ao Parlamento. Não posso tirar de pobres para dar a paupérrimos. Não podemos fazer isso aí”, disse o presidente.

Ou seja: nada está fechado. O presidente insiste em aumentar o valor do benefício. E Guedes tem até amanhã para achar um caminho.

O problema é que não há mágica para esticar o cobertor curto do orçamento público. Para aumentar o valor do benefício mantendo o teto de gastos e o compromisso com a responsabilidade fiscal, Guedes argumenta que terá que tirar o dinheiro de algum lugar. A avaliação na área econômica era que a revisão do abono salarial era “fundamental” para criar espaço no Orçamento para bancar o novo programa, que teria maior alcance e valor de benefício que o Bolsa Família. Só a extinção do abono poderia liberar cerca de R$ 20 bilhões (Com Agências Brasil e Folha).

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