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Brasil

Precisamos falar sobre a morte de Juliane

Arquivo Geral

08/08/2018 10h13

Reprodução

Jorge Eduardo Antunes
Editor-chefe do Jornal de Brasília

Chegou ao fim, na segunda-feira, a longa busca pela PM Juliane dos Santos Duarte, de 27 anos. Seu corpo foi achado no porta-malas, depois de desaparecer em Paraisópolis, capital paulista.

Falarei sem eufemismos. Infelizmente, nos tempos atuais, favela virou território hostil a agentes de segurança, ainda mais nas capitais dominadas por tráfico, Comando Vermelho, PCC e outros terrorismos urbanos que, ao mesmo tempo em que apavoram a população, servem aos que querem drogas para anestesiar a consciência.

Em plena capital econômica do País, Juliane foi sequestrada por bandidos armados e encapuzados – outro basta no “politicamente correto” para definir práticas incorretas e crimes.

Desde o desaparecimento, era previsível que Juliane não sobreviveria. Era uma PM mulher em uma favela, ainda mais armada. Combinação quase fatal para quem defende a lei e a ordem, ainda mais solitária e em local onde deveria imperar a moradia popular, mas que, pela omissão sistemática dos estados, acaba sendo esconderijo de quadrilhas, em processo longo e contínuo e que impõe sofrimento aos moradores destes locais.

Não quero falar só do crime, mas também do papel da imprensa e da opinião pública após a morte da PM. Começo dizendo que não acredito ver, nos próximos dias, o mesmo clamor – justíssimo, diga-se de passagem – que vi quando Marielle Franco foi morta a tiros no dia 14 de março.

Não quero condenar a indignação que tomou conta de todos quando da morte da vereadora carioca – oportuna, saudável e natural indignação. Minha cobrança é para a sociedade e para a imprensa: vamos dedicar a Juliane espaço análogo? Vamos protestar exigindo justiça?

Juliane defendia a sociedade, tal como Marielle, cada uma em seu campo de ação. Só que a policial pertencia a uma força de segurança que vem sendo desacreditada junto ao povo, muitas vezes de forma injusta.

Ao contrário de Marielle, Juliane não tinha um partido político atuante a seu lado. Era uma PM – e isso não é e nem devia ser pouca coisa. Mas, para muita gente, é como se sua morte fosse “natural”. Não é.

Juliane não deverá ser alvo da sórdida campanha de difamação que se seguiu à morte de Marielle Franco. Mas também não será alvo de acalorados protestos, como os registrados em março. E isso não ocorrerá por causa do critério regional, pois ambas morreram em megalópoles.

É porque nós achamos uma morte “mais especial” que a outra. Tal como morte na Zona Norte e na Zona Sul carioca ou em Ceilândia e na Asa Sul. Critérios antigos, de seletividade… Mas não apenas eles. A morte de Marielle é um atentado. A de Juliane… Bom, é a morte de mais uma PM… Eis o erro. São mortes preocupantes, na mesma medida. Elas foram mortas pela ação do crime organizado contra os que se atrevem a entrar e enfrentar milicianos ou traficantes, marginais em síntese, em seus territórios.

A morte de Juliane é gravíssima. Merece a mesma cobertura e os mesmos protestos. Que não acontecerão. Sua família, seus colegas e meia dúzia de pessoas chorarão. Não haverá #JulianeVive ou #JulianePresente. E se os assassinos forem presos rapidamente, ainda ouviremos um “ah, mas foi rápido porque é crime contra um PM”.

Está na hora de acabarmos com a hipocrisia. E o trabalho começa pelo jornalismo. O Jornal de Brasília e vários veículos começaram. Cabe a todos aderirem ao basta.

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