Uma bebê diagnosticada com Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo 1 recebeu, nesta semana, a primeira infusão do medicamento Zolgensma após sua incorporação ao SUS. O tratamento está sendo realizado no Hospital da Criança de Brasília José Alencar. Considerado um dos medicamentos mais caros do mundo, o Zolgensma passa a ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) a crianças com até seis meses de idade, que não utilizem ventilação mecânica invasiva por mais de 16 horas por dia.
Além da aplicação feita na capital, o procedimento foi feito simultaneamente no Hospital Maria Lucinda, em Recife (PE). O Brasil é o sexto país a disponibilizar o medicamento em um sistema público de saúde, depois da Espanha, Inglaterra, Argentina, França e Alemanha. Essa é a primeira terapia gênica incorporada ao SUS , algo que só foi possível através de um Acordo de Compartilhamento de Risco entre o Ministério da Saúde e a fabricante.
Em visita ao Hospital da Criança de Brasília (HCB), o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, destacou o início da aplicação do medicamento Zolgensma pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como um marco histórico para a saúde pública no país. Segundo Padilha, o medicamento representa um avanço inédito no tratamento dessa doença rara e grave, que atinge bebês e crianças pequenas. O custo da dose única do tratamento chegava a variar entre R$ 7 milhões e R$ 11 milhões, tornando-o inacessível para a maioria das famílias brasileiras.
Padilha reforçou que a escolha da bebê que recebeu a primeira infusão do medicamento em Brasília foi exclusivamente baseada no diagnóstico precoce feito pelo teste do pezinho. “Provavelmente não seria identificada por um pediatra, mesmo muito qualificado, alguma alteração nela”. Tanto ela quanto a criança de Recife foram priorizadas por estarem próximas da idade-limite para o procedimento e por atenderem a todos os critérios clínicos do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Atrofia Muscular Espinhal (AME) 5q tipo 1 e 2.
A criança chegou ao hospital com apenas 12 dias de vida. Segundo a doutora Janaína Monteiro, coordenadora da neuropediatria e responsável técnica do ambulatório de doenças neuromusculares e terapias gênicas do HCB, a agilidade no diagnóstico foi determinante para o sucesso do tratamento. “Ela foi admitida rapidamente, ainda sem sintomas aparentes, e passou a ser acompanhada por nossa equipe multidisciplinar especializada em doenças neuromusculares”, explicou.
Janaína destacou o impacto emocional do diagnóstico. “Imagine dizer a uma família que a filha, que parece perfeitamente saudável, poderia perder todas as aquisições motoras e ficar presa no próprio corpo”.
Milena Brito, mãe da bebê, contou que foi “emocionante demais” viver esse momento. “Como mãe, a gente nunca perde a esperança”, afirmou. Ela relatou que chegou a buscar a medicação na Justiça até os quatro meses da filha, mas que, com a iniciativa do SUS, conseguiu o tratamento gratuitamente. “Ver a minha filha daqui para frente poder andar, caminhar, falar e me chamar de mãe vai ser excelente”, disse.
Agora, Milena acredita que poderá viver a maternidade de forma diferente. “Nunca achamos que pode acontecer isso na nossa família. Mas eu tenho apenas 20 anos e essa é minha primeira filha. Foi muito difícil receber um diagnóstico com poucos dias de vida. Mas saber que daqui para a frente ela vai ser minha melhor amiga e vamos poder conversar é tudo”, completou.
Mais crianças aguardam acesso ao tratamento
Após a primeira infusão do medicamento Zolgensma, realizada simultaneamente em Brasília e Recife, o Ministério da Saúde já recebeu 15 novos pedidos de tratamento em todo o país. Três desses casos são de pacientes atendidos pelo Hospital da Criança de Brasília (HCB), onde o protocolo de exames será iniciado antes da aplicação do medicamento. “Estamos consolidando um fluxo de atendimento que garante esse acesso. O esforço que está sendo feito aqui no Distrito Federal, com foco no diagnóstico precoce, é fundamental. Identificar a AME com antecedência permite que o paciente seja encaminhado rapidamente para um serviço que já está preparado para oferecer a melhor alternativa terapêutica disponível atualmente”, explicou o ministro.
O processo de administração do medicamento é acompanhado de perto pelo Ministério, com um modelo de pagamento baseado nos resultados clínicos. “Nós pagamos 40% do valor na primeira dose. Os demais 60% são pagos gradualmente, conforme a criança apresentar bons resultados clínicos, aos 24, 36 e 48 meses. Todo o acompanhamento é feito por uma equipe especializada, nos 31 centros de referência já preparados em Brasília e em outras regiões do Brasil”, destacou Padilha.
A expectativa da pasta é atender 137 pacientes nos dois primeiros anos de implantação da terapia, oferecendo ganhos motores significativos, como a capacidade de engolir, mastigar e sustentar o tronco. Após a infusão, os pacientes serão acompanhados clinicamente até os cinco anos de idade pelo centro de referência responsável, conforme estabelecido pelo Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) e pelo Acordo de Compartilhamento de Risco.
Celina Leão, que responde interinamente pelo Governo do DF, também esteve presente no HCB para visitar a criança que recebeu a primeira dose do Zolgensma. Ela destacou a importância da atuação local. “Nós ficamos muito felizes pelo Ministério da Saúde ter escolhido aplicar a primeira dose a uma criança do DF, que já está sendo acompanhada pelo HCB, que é parceiro da nossa Secretaria da Saúde”, afirmou.
Celina salientou que no DF é realizado um teste ampliado que consegue diagnosticar doenças raras e que juntando a isso, a aplicação de medicamentos qualificados como o Zolgensma, a rede pública consegue reverter uma doença rara e que não teria cura. “Esperamos que essa seja apenas a primeira criança a receber, de várias outras que vão receber no Brasil todo”, afirmou. De acordo com Celina, no DF, 60 crianças aguardam atendimento para receberem essa medicação.
Saiba mais
Saiba como ter acesso ao tratamento
Embora a AME não tenha cura, as terapias disponíveis ajudam a estabilizar a progressão da doença. Para solicitar especificamente o tratamento com Zolgensma, as famílias devem procurar um dos 31 serviços especializados em doenças raras do SUS. Desses, 22 já estão habilitados para realizar a infusão, e outros 9 estão em fase de implantação. Após o encaminhamento, um médico fará a avaliação clínica da criança para verificar se ela atende aos critérios de elegibilidade definidos pelo protocolo oficial. Caso os requisitos sejam cumpridos, o processo de solicitação do tratamento será iniciado.
Atualmente, os serviços habilitados estão distribuídos nos seguintes estados: Alagoas, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Distrito Federal.
Nos estados que ainda não contam com centros aptos a realizar a infusão, o Acordo de Compartilhamento de Risco garante, além do fornecimento do medicamento, o custeio das passagens e hospedagem para o paciente e um familiar responsável.