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Política & Poder

PF vê padrão de organização criminosa em venda de decisões e suspeita de mais servidores do STJ

Atualmente, entre os principais investigados da operação estão três pessoas que trabalhavam com ministros, mas a desconfiança da PF é que esse número seja maior

Redação Jornal de Brasília

14/10/2025 13h27

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

JOSÉ MARQUES
FOLHAPRESS

A Polícia Federal suspeita que servidores ainda não identificados do STJ (Superior Tribunal de Justiça) também tenham participado de um esquema de venda e vazamento de decisões da corte e pretende ampliar as suas investigações para localizar quem são essas pessoas.


Os indícios são apontados em relatório preliminar da operação Sisamnes, que investiga irregularidades cometidas em gabinetes do tribunal e que menciona a reprodução de “padrões típicos de atuação de organizações criminosas”.


Atualmente, entre os principais investigados da operação estão três pessoas que trabalhavam com ministros, mas a desconfiança da PF é que esse número seja maior.


“O conjunto de diligências realizadas permitiu identificar, em tese, que o esquema não se restringia aos servidores Daimler, Márcio e Rodrigo Falcão e nem ao núcleo Andreson/Zampieri, mas integrava estrutura organizada voltada à manipulação de decisões judiciais, reproduzindo padrões típicos de atuação de organizações criminosas”, afirma o relatório da PF obtido pela Folha.


No documento, são apontados indícios de que outras pessoas compartilharam informações internas com o lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, pivô das investigações.


Essas suspeitas foram apontadas, sobretudo, em processos que estavam sob a relatoria da ministra Isabel Gallotti.


No inquérito, já são investigados Daimler Alberto de Campos, que foi chefe de gabinete de Gallotti, e Márcio José Toledo Pinto, que trabalhou para a ministra e para outros integrantes da corte –e foi exonerado após sindicância do STJ.


A PF aponta que interlocutores de Andreson demonstravam pleno conhecimento sobre a tramitação interna do gabinete de Gallotti, “antecipando informações a respeito de pautas e movimentações processuais antes mesmo de sua divulgação oficial”.


“Os diálogos apontam que o envolvimento funcional não se restringia a Daimler, alcançando outros servidores vinculados ao gabinete”, diz a polícia no relatório.


“Diante desses indícios, a investigação ampliará o foco para identificar eventuais outros servidores que possam ter participado das tratativas e da elaboração das minutas, mediante a análise detalhada dos possíveis sinais e códigos camuflados nas mensagens trocadas entre os interlocutores.”


O relatório policial tem como principal linha de investigação suspeitas sobre ações que tramitaram nos gabinetes das ministras Gallotti (sete processos) e Nancy Andrighi (cinco processos) e também sobre vazamento de informações da Operação Faroeste, de relatoria do ministro Og Fernandes.


Marcio Toledo, que trabalhou com Gallotti, também passou pelo gabinete de Nancy e é o principal suspeito de vazamentos de informações e de ter relações próximas com Andreson. Outro investigado é Rodrigo Falcão, que foi chefe de gabinete de Og Fernandes.


Nenhum ministro é investigado no inquérito, que está sob condução de Cristiano Zanin no STF (Supremo Tribunal Federal).


Procurada, a ministra Nancy Andrighi afirma, em nota do seu gabinete, que “já prestou informações à imprensa, no ano de 2024, sobre os processos” e que “os processos de responsabilização encontram-se em andamento, a fim de que os fatos sejam devidamente esclarecidos e os responsáveis punidos de forma exemplar”.


A ministra Isabel Gallotti afirmou que “desconhece o conteúdo da investigação, porque tramita em sigilo, e que seu gabinete está à disposição, para auxiliar, no que seja necessário, a fim de que sejam cabalmente apurados os fatos ocorridos e responsabilizados todos os envolvidos”.


Questionado se gostaria de se manifestar, o ministro Og Fernandes afirmou que, “respeitando o direito ao contraditório, quem cometer ato ilícito deve assumir as consequências legais cabíveis”.
As defesas de Daimler e de Falcão foram procuradas, mas não se manifestaram. A reportagem não localizou a defesa de Marcio Toledo.


No relatório, são comparadas movimentações processuais e movimentações financeiras de suspeitos com trocas de mensagens do advogado Roberto Zampieri, assassinado no fim de 2023, e Andreson.


Além dos três auxiliares dos ministros que são alvos de inquérito, também são citadas outras pessoas ainda não identificadas ou que acessaram internamente os processos como possíveis alvos de futura investigação.


A análise da polícia também faz outras observações. Por exemplo, ao analisar o conteúdo de dados de nuvem do lobista Andreson, a PF identificou que um contato salvo com o nome de Daimler não era o número do celular do chefe de gabinete, mas de um advogado.


A polícia ressalta, porém, que “a prática de salvar números telefônicos sob nomes de terceiros é expediente recorrente em contextos de ocultação e dissimulação de ilícitos, justamente para despistar eventual vinculação entre o interlocutor real e as comunicações mantidas”.


No caso em questão, diz a polícia, os elementos indicavam que, embora a linha estivesse em nome de outra pessoa, “o controle prático do terminal e a condução das tratativas cabiam, em verdade, ao servidor Daimler, então chefe de gabinete da ministra Isabel Gallotti”.


“Essa hipótese se robustece pelo teor das mensagens e pela correlação temporal com outros achados investigativos, que já vinham apontando Daimler como elo central no fluxo de informações e de valores em favor do grupo investigado.”


No caso da suspeita de vazamento pelo ex-chefe de gabinete de Og Fernandes, a PF ainda não tem clareza se Falcão realmente teria vazado minutas para Andreson. Isso porque a PF trabalha com a possibilidade de que uma decisão de Og que estava no celular do lobista era falsa.


A PF, porém, ainda investiga se foram repassadas outras informações relacionadas à Faroeste.
Os dados obtidos na nuvem do celular de Andreson, diz a polícia, confirmam a sua condição de articulador de manipulações judiciais e também trazem novos elementos relevantes como provas.


“Entre eles, destacam-se os contatos mantidos com servidores, chefes de gabinete e magistrados”, afirma o relatório.


Andreson está em prisão domiciliar em Primavera do Leste, no interior de Mato Grosso, desde julho. Zanin autorizou a prisão domiciliar após um parecer positivo da PGR (Procuradoria-Geral da República) pela saída do lobista de uma prisão federal em Brasília, devido ao seu estado de saúde. Sua defesa não tem comentado informações sobre a operação.

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