Brasília, 25 – Pela primeira vez na História do Brasil, um ex-presidente da República e oficiais-generais estão presos para cumprir penas que lhes foram impostas por tentativa de golpe de Estado. Agora, um novo processo será aberto na Justiça Militar para decidir se eles poderão manter as patentes conquistadas nas Forças Armadas.
A condenação, a prisão e a possível expulsão de altos oficiais marcam um rompimento no histórico de investidas militares em governos e na política nacional desde a Proclamação da República, em 1889.
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), encerrou nesta terça-feira, 25, a ação penal que condenou o chamado “núcleo crucial” da trama golpista. Horas depois, a Primeira Turma do STF abriu uma sessão extraordinária remota para referendar o fim do processo.
Com total discrição, todas as prisões foram realizadas poucas horas após a canetada de Moraes. A PF não foi ostensivamente às ruas recolher os condenados. Apesar de inconformados com a decisão, os advogados acordaram a apresentação deles aos locais designados para início dos cumprimentos das penas.
Uma vez presos, os militares condenados pela tentativa de golpe de Estado vão enfrentar outro processo. O ministro Alexandre de Moraes determinou que o Superior Tribunal Militar (STM) analise a perda das patentes.
Caso o tribunal militar decida que eles não devem continuar como integrantes das Forças, os condenados também perdem as prerrogativas militares. O cenário poderá interferir até no local onde cumprem as penas.
O ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos, permanecerá na Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal, onde estava preso desde sábado, 22, por descumprimento de medidas cautelares de agosto – ele violou a tornozeleira eletrônica e ofereceu risco de fuga.
Os ex-ministros Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, generais da reserva, cumprirão as penas nas dependências do Comando Militar do Planalto, em Brasília. Eles foram condenados a 21 e 19 anos de prisão, respectivamente.
O almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, começou a cumprir pena de 24 anos na Estação Rádio da Marinha. A cerca de 25 quilômetros do centro de Brasília, a instalação é uma base militar voltada a atividades de comunicação.
Já o ex-ministro Anderson Torres, delegado da Polícia Federal, foi enviado ao 19º Batalhão da Polícia Militar do Distrito Federal, localizado dentro do Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, para cumprir a pena de 24 anos de prisão. O espaço é conhecido como Papudinha.
Ao todo, o núcleo crucial da trama golpista tem oito integrantes Além de Bolsonaro e dos quatro presos nesta terça, fazem parte o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), que está foragido nos Estados Unidos. O STF determinou que a Câmara inicie a cassação do mandato dele, condenado a 16 anos.
O general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e vice na chapa derrotada de Bolsonaro em 2022, já estava preso na 1ª Divisão do Exército, na Vila Militar, no Rio de Janeiro, e permanecerá no local.
O último é o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid. Ele fez acordo de colaboração premiada e pegou condenação de dois anos em regime aberto.
A declaração de encerramento do processo era prevista para esta terça, mas advogados dos condenados se disseram surpresos com o que entenderam como supressão do prazo para recursos finais.
Nos cálculos deles, teriam até a próxima semana para apresentá-los. Pela jurisprudência atual, o STF entende que esse tipo de recurso só é possível no caso de divergência de dois dos cinco votos no julgamento realizado na Primeira Turma.
No caso da trama golpista, só o ministro Luiz Fux votou pela absolvição, no julgamento realizado em setembro. As defesas, porém, entendem que o voto contrário de Fux dá a elas o direito a mais um recurso.
A movimentação processual pegou as defesas de surpresa, segundo apurou o Estadão. Os advogados pretendiam apresentar os chamados embargos infringentes, e contavam que teriam até o dia 3 de dezembro para isso.
O objetivo era fazer o processo passar por um novo julgamento, no plenário do Supremo Tribunal Federal.
Advogado do ex-presidente Jair Bolsonaro, Paulo Cunha Bueno avaliou o trânsito em julgado como decisão “surpreendente” e disse que os embargos infringentes não dependem de condicionantes.
Cunha Bueno afirmou que entrará com o último recurso ao plenário do STF, apesar do desfecho do caso na Primeira Turma, a qual coube o julgamento da tentativa de golpe.
Estadão Conteúdo