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Política & Poder

Mesmo no STF, Messias poderá manter honorários da AGU que renderam R$ 660 mil este ano

O bônus, concedido a integrantes da advocacia da União, pode continuar sendo pago ao ministro, quando sua indicação ao STF for oficializada

Redação Jornal de Brasília

29/10/2025 6h43

jorge messias no bom dia, ministro.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, recebeu R$ 660 mil a mais no seu holerite entre janeiro e outubro deste ano. O valor foi pago a título de “honorários de sucumbência” distribuídos mensalmente por um conselho privado vinculado à pasta. O bônus, concedido a integrantes da advocacia da União, pode continuar sendo pago ao ministro, quando sua indicação ao Supremo Tribunal Federal for oficializada pelo governo Lula.

O valor recebido por Messias em nove meses neste ano foi três vezes maior do que o ganho ao longo de todo o ano passado. Em nota, a pasta afirmou que “os valores recebidos pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, no período citado, correspondem à parte que coube a ele no rateio ordinário dos honorários distribuídos a todos os membros das carreiras da AGU”.

“Como membro da carreira de procurador da Fazenda Nacional, Jorge Messias tem, como os demais advogados públicos federais, direito ao recebimento dos honorários de sucumbência”, diz a nota (leia a nota completa abaixo).

Os “honorários de sucumbência” consistem no valor pago pela parte perdedora à vencedora para ressarcir os gastos judiciais no decorrer do processo. Quando a União, defendida pela AGU, vence alguma ação, os servidores também ganham um bônus, como se fossem advogados privados que tivessem sido contratados para defender um cliente.

No caso dos integrantes da AGU, eles são concursados e sua missão é justamente defender judicialmente a União. Ou seja, um advogado público recebe salário para atuar e ainda uma bonificação, quando ganha a ação.

Messias deve ser indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para ocupar a vaga de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal (STF). A eventualmente posse na corte não significa, necessariamente, que ele deixará de receber de imediato as bonificações pelo seu trabalho na AGU.

Um exemplo disso é o ministro André Mendonça, que foi funcionário de carreira e comandou a pasta no início do governo Jair Bolsonaro. O magistrado recebeu R$ 154 mil em honorários em janeiro deste ano à título de “rateio extraordinário por competências anteriores”, mesmo há quatro anos afastado das suas funções na AGU.

Procurado, o Conselho Curador dos Honorários Advocatícios (CCHA) disse que o pagamento feito a ex-servidores segundo critérios de rateio que leva em conta o tempo em que o advogado atuou na AGU.

“Os valores retroativos são devidos também a membros aposentados ou afastados, desde que a competência se refira a período de atividade”, diz a nota. Ou seja, um ex-servidor pode ser beneficiado pelo bônus se, no período em que esteve no órgão, foi proposta ou tramitou a ação judicial que deu origem aos honorários para advogados públicos.

Quando assumir a vaga no STF, Messias pode, portanto, somar ao salário de R$ 46 mil de ministro da corte, eventuais benefícios retroativos pagos aos integrantes e ex-integrantes da AGU.

Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o benefício não poderia ultrapassar o teto remuneratório do funcionalismo público. Mas, atualmente, o Portal da Transparência não menciona a incidência do “abate teto” — regra que corta qualquer valor acima do limite — sobre os honorários e esses valores são contabilizados a parte.

Durante todos os meses deste ano, Messias recebeu ao menos R$ 19 mil a mais em honorários de sucumbência no seu holerite, o que se somou ao seu salário líquido de aproximadamente R$ 22 mil. Em meses como janeiro e julho esses vencimentos foram de, respectivamente, R$ 193 mil e R$ 302 mil.

Segundo a AGU, “os valores pagos em janeiro de 2025 correspondem ao rateio mensal ordinário dos honorários, somados aos pagamentos atrasados do auxílio alimentação e da chamada cota extraordinária, calculada com base na performance de arrecadação dos honorários sucumbenciais”.

Ainda de acordo com a pasta, os pagamentos realizados em julho “incluem, além do rateio ordinário, os valores em atraso referentes a um terço de férias que não haviam sido pagos desde 2017″. Porém, não houve explicação do motivo de benefícios regulares do exercício da profissão, como férias e auxílio alimentação, serem pagos juntamente com os honorários e de forma retroativa.

“Apesar de legal, o pagamento dessas bonificações é moralmente questionável e politicamente insustentável no longo prazo, sobretudo com um orçamento público permanentemente pressionado”, avaliou o cientista político Murilo Medeiros, pela Universidade de Brasília (UnB).

“Em um contexto de restrição fiscal e necessidade de ajuste das despesas obrigatórias, bonificações dessa natureza reforçam a desigualdade remuneratória no serviço público brasileiro, com a concepção de castas de servidores altamente privilegiados”.

Ganhos de Jorge Messias com honorários da AGU em 2024

Ministro da AGU recebeu R$ 208 mil em honorários de sucumbência no ano passado

MêsHonorários
Janeiro14.283,83
Fevereiro14.291,53
Março14.268,13
Abril26.882,86
Maio14.301,75
Junho14.320,55
Julho14.341,88
Agosto14.359,63
Setembro14.395,63
Outubro17.811,50
Novembro31.898,89
Dezembro17.827,40
Totoal208.983,58

A variação nos ganhos pode estar relacionada a causas ganhas pela AGU e outros benefícios devidos ao ministro, mas o Conselho Curador dos Honorários Advocatícios (CCHA), instituição que gere esses pagamentos, não deixa claro quais são os critérios utilizados na distribuição dos recursos.

Segundo a AGU, o CCHA “é uma entidade com autonomia de atuação em relação à Administração Pública para, dentre outras competências, regulamentar e operacionalizar a distribuição do pagamento dos honorários”.

Como mostrou o Estadão, a distribuição de honorários tem escalado mês a mês. Membros da AGU faturaram mais de R$ 2,3 bilhões em honorários de sucumbência somente em julho, quando a distribuição do benefício atingiu um novo recorde.

Leia a nota enviada pela AGU

O ministro Jorge Messias, advogado-geral da União, recebeu, em valores brutos (sem desconto do Imposto de Renda – IR), o total de R$ 660.370,62 referentes aos honorários sucumbenciais pagos no período de janeiro a outubro deste ano, incluindo verbas em atraso. Os dados estão disponíveis no Portal da Transparência e no Portal da AGU, no Painel dos Honorários Advocatícios de Sucumbência

Estadão Conteúdo

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