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Política & Poder

Iniciativa para simplificar linguagem no Judiciário tem adesão de tribunais, mas enfrenta críticas

A ação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), anunciada em 4 de dezembro de 2023, tem como objetivo incentivar cortes pelo país a serem menos empoladas tanto na papelada legal quanto na comunicação com o público geral

Redação Jornal de Brasília

05/01/2025 7h30

Foto: Rafa Needdermeyer/Agência Brasil

RENATO BROCCHI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

O Pacto do Judiciário pela Linguagem Simples completou um ano com a adesão da maioria dos tribunais brasileiros, mas enfrenta críticas sobre limitações e falta de definição de conceitos para uniformizar a medida.

A ação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), anunciada em 4 de dezembro de 2023, tem como objetivo incentivar cortes pelo país a serem menos empoladas tanto na papelada legal quanto na comunicação com o público geral.

De acordo com o portal dedicado ao pacto, dos tribunais subordinados ao CNJ apenas o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não aderiu. Questionada, a corte não disse como tem tratado o tema.

Isso significa que aderiram à iniciativa os TJs (Tribunal de Justiça), TREs (Tribunais Regionais Eleitorais), TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) e três cortes superiores: STJ (Superior Tribunal de Justiça), TST (Tribunal Superior do Trabalho) e STM (Superior Tribunal Militar), entre outras. O STF (Supremo Tribunal Federal) não aparece na lista porque não é subordinado ao CNJ.

Há avanços, como o manual publicado em agosto com modelo padrão para ementas —trechos de documentos que contêm um resumo do que foi decidido. Mas, para críticos, o pacto desconsidera dimensões que vão além da simplificação do vocabulário.

Dentre os compromissos dos tribunais que aderiram está eliminar, quando possível, termos formais demais, estimular o uso de versões resumidas dos votos nas sessões de julgamento e fornecer explicações dos impactos das decisões “na vida de cada pessoa e da sociedade brasileira”.

“O que acontecia com o direito —e ainda acontece, mas acho que a gente vem melhorando bem— é você transformar a linguagem num instrumento de poder que exclui do debate as pessoas que não têm aquela chave do conhecimento”, diz o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF e do CNJ.

Segundo ele, a definição de “linguagem simples” usada pelo conselho não vem de alguma “análise técnico-científica”, mas de “uma coisa mais empírica da capacidade da outra pessoa compreender o que você está falando”.

O manual de padronização de ementas está entre as iniciativas ligadas a esse primeiro ano de pacto. A ideia é que os tribunais sintetizem os principais pontos das decisões, facilitando o entendimento e fornecendo, de forma acessível, referências da legislação e dos precedentes citados. Ao fim, o manual dá exemplos com base em formatos de ementas já em uso.

Também como desdobramento do pacto em seu primeiro ano, o CNJ concedeu, em solenidade no dia 16 de outubro, o “Selo Linguagem Simples”, destinado a reconhecer projetos e esforços na área. Ele foi entregue a 47 tribunais e ao CJF (Conselho da Justiça Federal).

O TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) foi um dos 23 tribunais estaduais agraciados com a iniciativa. De acordo com Paula Navarro, juíza assessora da presidência do tribunal, muito do que a corte faz nessa área foi iniciado antes do pacto. Ela cita como exemplo o “Juridiquês Não Tem Vez”, projeto que congrega podcast e vídeos para explicar expressões e temas jurídicos em linguagem acessível.

O tribunal ainda adotou um método em prol da brevidade e da simplificação de solenidades. O TJ também está no meio de uma transição para um novo sistema eletrônico de tramitação de processos, o Eproc. Essa migração é feita “pensando em algumas decisões, ofícios, que contenham também imagens ou palavras mais fáceis”, diz Navarro.

Heloisa Fischer, professora e palestrante sobre linguagem simples em informações públicas, reforça a ideia de que muitas das ações já tinham sido estabelecidas “de baixo para cima” pelos tribunais.

Ela vê uma limitação na forma como o CNJ trata do assunto. Muitos dos materiais relacionados ao pacto falam de problemas de vocabulário —ou seja, enfatizam a necessidade de trocar termos complicados por outros mais diretos. Mas a linguagem simples, diz Fischer, também abarca elementos da construção frasal e do design que facilitem a absorção da informação pelo leitor.

O pacto até cita o assunto ao enfatizar a importância da brevidade. Fischer afirma que não vê contemplados aspectos de organização visual e de estrutura das frases.

Muito disso, ela diz, tem a ver com mudanças em curso no próprio campo: há, hoje, uma norma da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) que estabelece diretrizes para documentos em linguagem simples. A publicação é de 2024 e, portanto, não poderia ter sido incluída no pacto desde o início.

Ivy Farias, advogada e organizadora de curso sobre linguagem simples para carreiras jurídicas, afirma já ter tido receio sobre a falta de uma definição exata do que seria “linguagem simples”.

“Eu estava muito preocupada que cada tribunal fizesse o que quisesse e dissesse que aquilo era linguagem simples”, diz ela. “Pois foi dito e feito.”

A advogada salienta que, apesar de a norma da ABNT ser recente, ela poderia servir de baliza para novas ações, combatendo essa indefinição ainda presente.

Farias também lembra o projeto de lei cuja proposta é estabelecer a Política Nacional de Linguagem Simples na administração pública, aprovado na Câmara dos Deputados em dezembro de 2023 e atualmente em tramitação no Senado.

“Acho que, com a aprovação da lei, com o Executivo se movimentando nisso, eles vão acabar trazendo essa definição para dentro”, afirma a advogada. “Com isso, eu acho que não vai ficar mais tão aéreo como está. Vai haver um plano de ação, de data, de vinculação, de transparência.”

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