CAIO SPECHOTO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Paulo Gonet perdeu força entre governistas no Senado pouco antes da votação que conferiu a ele mais dois anos à frente da PGR (Procuradoria-Geral da República) na quarta-feira (12). Foi preciso uma mobilização de última hora para garantir sua recondução ao cargo, com a menor margem desde a redemocratização.
O esforço envolveu a defesa do procurador-geral durante a sabatina na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), aceno à oposição no plenário e ação direta de alguns dos senadores mais influentes, principalmente do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
A atuação da PGR no processo da trama golpista, que culminou na condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos de prisão, inviabilizou o apoio da maior parte da oposição a Gonet. Ainda assim, ele é benquisto pela maioria dos senadores.
Reduzir o apoio ao procurador-geral era, porém, uma forma de expor o descontentamento com a provável indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para a vaga de Luís Roberto Barroso no STF (Supremo Tribunal Federal). A maior parte dos senadores prefere o ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Quem for indicado ao Supremo precisará de aprovação do Senado.
Flávio Bolsonaro no ataque
O primeiro momento tenso foi na sabatina de Gonet na CCJ, quando o PGR foi alvo de críticas bolsonaristas. Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), fez os maiores ataques.
“O senhor aceitou passivamente o Ministério Público ser esculhambado”, declarou. Ele também disse que o PGR parecia “cumprir ordens” do ministro do STF Alexandre de Moraes, principal responsável pela condenação de Bolsonaro na trama golpista.
“Os membros do Ministério Público devem ter vergonha do senhor”, declarou o filho de Bolsonaro.
Senadores dizem ter identificado sinais de nervosismo em Gonet. Alguns temeram que ele respondesse no mesmo tom e perdesse votos. O presidente da CCJ, Otto Alencar (PSD-BA), pediu moderação a Flávio.
Em seguida, Jayme Campos (União Brasil-AL) teve uma rápida discussão com o bolsonarista.
Isso reduziu a pressão sobre o procurador-geral, que conseguiu na sequência responder aos questionamentos. Ele teve 17 votos a favor e 10 contra na CCJ, um placar dentro das expectativas de seus principais apoiadores.
Sinais de dissidência
A votação decisiva no plenário estava marcada para pouco depois da sabatina. As estimativas de placar variavam de 47 a 51. Gonet precisava de ao menos 41 apoios para ser reconduzido.
Entre as sessões da CCJ e do plenário, foi detectado em conversas nos gabinetes e corredores um movimento na base governista contra a indicação.
Presidente da Casa, Alcolumbre trabalhou para que a sessão tivesse 71 votantes. Omar Aziz (PSD-AM), Eduardo Braga (MDB-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL) procuraram colegas para garantir apoio ao procurador-geral.
Apoiadores de Gonet buscaram até votos na oposição. Como a deliberação é secreta, não é possível ter certeza sobre como cada senador votou. Um dos articuladores estima, com base na lista de presentes e nos resultados, que cerca de seis votos governistas foram perdidos e dois oposicionistas, ganhos.
Os líderes do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), e no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), também se movimentaram. Os desgastes entre Legislativo e Executivo, porém, reduziram a influência dos dois representantes de Lula.
Após a votação, senadores aumentaram a pressão sobre o governo para que Lula desista de Messias e indique Pacheco. O recado chegou ao menos a Wagner e aos ministros Rui Costa (Casa Civil) e Gleisi Hoffmann (Relações institucionais).
Um dos principais motivos é que Alcolumbre, essencial para garantir a aprovação de Gonet, prefere Pacheco a Messias.
Oposição se conteve
Além de Gonet, o Senado precisava avaliar indicações de outras 10 autoridades. A expectativa era de que o procurador-geral fosse o último.
No entanto, o presidente do Senado colocou em votação a proibição de descontos associativos em benefícios do INSS depois de aprovar indicados para dois outros cargos -e realizou a deliberação sobre Gonet logo depois.
A discussão do INSS chamou senadores ao plenário, já que o tema tem apelo popular. Além disso, a votação dela foi vista como um gesto de boa vontade aos bolsonaristas.
O relator era o líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN). Dar destaque a Marinho reduziria a chance de uma rebelião bolsonarista na mesma sessão, o que inviabilizaria a aprovação do PGR.
A recondução de Gonet foi aprovada com 45 votos a favor, 4 a mais do que o mínimo necessário, e 26 contra. Setores da oposição ouvidos pela Folha sabiam que o resultado seria mais apertado, mas imaginavam uma margem maior.
Passada a votação, alguns senadores avaliam que o PGR poderia ter sido rejeitado se tivesse havido uma campanha pública contra ele. Oposicionistas demonstravam ressentimento com o procurador-geral, mas não conseguiram criar um clima nas redes sociais que demovesse outros congressistas de apoiá-lo.