Catia Seabra
São Paulo, SP
A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR), foi “sabatinada” na noite de segunda-feira (4) sobre a agenda econômica de um eventual governo Lula. Em jantar com cerca de 30 empresários, no Morumbi, zona nobre de São Paulo, ela descreveu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um hábil negociador político.
No jantar oferecido pelo presidente do Esfera Brasil, João Camargo, Gleisi disse também que, qualquer que seja seu ministro, a condução da economia em um governo petista será de Lula.
O Esfera Brasil é um grupo formado por empresários e se define como um think tank apartidário. Além de Camargo, entre os presentes estavam Cândido Pinheiro (Hapvida), Flávio Rocha (Riachuelo) e Eugênio Mattar (Localiza).
A presidente do PT também disse que, caso eleito, Lula manterá o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pelo menos até 2024, quando se encerra o mandato dele na autarquia.
O assunto veio à baila no momento em que ela citava a série histórica de superavit primário, de 2003 a 2014, como uma prova de responsabilidade fiscal nas gestões petistas. Um dos comensais ressaltou, porém, que, no governo Lula, o BC era presidido pelo banqueiro Henrique Meirelles.
Em resposta, Gleisi disse que hoje o Brasil tem Campos Neto à frente do BC e que ele será mantido.
Exaltando a experiência do ex-presidente, ela minimizou ameaças à governabilidade em um novo governo Lula. A empresários do porte de Eugênio Mattar, Cândido Pinheiro e Abílio Diniz, a presidente do PT lembrou as palavras do ex-governador e potencial vice, Geraldo Alckmin, que disse que Lula representa a própria democracia.
Segundo participantes do encontro, que durou cerca de duas horas e meia, Gleisi afirmou que, dentre todas as lideranças políticas brasileiras, Lula é o mais capacitado para articulação com diferentes setores da sociedade, inclusive no Congresso.
A presidente do PT disse que Lula conhece a máquina pública e, como que para minimizar o medo de sobressaltos institucionais, admitiu que o PT não ganhará todas no Congresso. Mas que “governabilidade não vai faltar, não”.
Questionada, Gleisi descartou a intenção de controle de preços dos combustíveis, mas defendeu a revisão da política tarifária, atrelada aos EUA, bem como a aplicação de lucros da Petrobras. Ela também disse que o PT é contra a privatização da Petrobras e da Eletrobras.
Quando um dos participantes disse que a relação entre empregador e empregado nem deveria ser regulamentada em lei, Gleisi argumentou que a reforma trabalhista foi apresentada como uma solução contra o desemprego, mas não foi boa nem para o Brasil nem para o trabalhador.
Ao ouvir críticas ao governo Dilma, ela ponderou que a ex-presidente enfrentou dificuldades no Congresso no final de seu governo.
Ainda segundo participantes, o empresário Flávio Rocha perguntou por que Lula e o presidente Jair Bolsonaro (PL) não caminhavam para o centro. Ao microfone, a presidente do PT disse que tem fracassado a tentativa de fortalecimento de uma terceira via na corrida presidencial, hoje protagonizada por dois projetos opostos.
Gleisi foi acompanhada pelo economista Gabriel Galípolo, de 39 anos, ex-presidente do Fator. Hoje um dos conselheiros de Lula, Galípolo foi apresentado pela presidente do PT como um amigo na nova geração de economistas, a quem poderia pedir socorro durante o jantar. A ajuda veio no debate sobre o teto de gastos.
Ao pregar a revisão do teto de gastos, o economista -também conselheiro da Fiesp (Federação das Indústrias do estado de São Paulo)- disse que os investimentos foram expulsos do Orçamento, faltando recursos para reposição de depreciação no setor de infraestrutura.
O economista disse duvidar que qualquer um dos presentes compre ações de uma empresa que consuma todo o seu orçamento apenas com custeio.
LULA DEFINE ‘POBRE NO ORÇAMENTO E RICO NO IMPOSTO DE RENDA’ COMO LEMA
Dez horas depois do jantar em que sua capacidade de diálogo foi exaltada, o ex-presidente Lula lembrou ter instituído o conselho econômico social para definição de políticas públicas em seu governo.
“Duvido que tenha presidente na história do Brasil que recebeu mais empresário que eu. Gostava de receber, discutir e ouvir”, disse.
Em entrevista a uma rádio do Paraná, Lula defendeu um estado forte e indutor do desenvolvimento. “O milagre que fiz no Brasil foi colocar o povo pobre no orçamento da economia. Por isso, que eu digo todo dia que para resolver o problema do Brasil tem que colocar o povo pobre no orçamento da prefeitura, do estado e da União. E os ricos no Imposto de Renda.”
Lula pregou o que chamou de justiça tributária, com os ricos pagando mais impostos. Ele disse também que a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) pôs fim a um sistema quase escravista.
“Por isso que aqui em São Paulo os empresários odeiam tanto o Getúlio Vargas. Porque ele tirou o trabalhador de um sistema de semiescravidão.”
Lula defendeu o fortalecimento dos sindicatos e a evolução do empresariado brasileiro.
Mais tarde, o petista disse que a elite brasileira é escravista. Ele definiu “pobre no Orçamento e rico no Imposto de Renda” como lema de campanha. “Queríamos a reforma da CLT para aprimorá-la. Mas o que eles fizeram? Tiraram, colocando a culpa no custo Brasil.”