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Política & Poder

Caso Flávio teve quebra de sigilo mais ampla que a de deputados suspeitos de ‘rachadinha’

Flávio e três deputados estaduais estavam sob a mesma suspeita, mas seus casos foram tocados por promotores diferentes, com métodos distintos

Redação Jornal de Brasília

02/03/2021 9h53

Foto: Alerj/Divulgação

Italo Nogueira
Rio de Janeiro, RJ

A investigação contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) teve quebras de sigilos bancário e fiscal mais amplas do que a de três deputados estaduais no mesmo casos suspeitos de “rachadinhas” na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

No caso do senador, todos os 78 ex-assessores de seu gabinete na Assembleia foram alvos da medida por um período de 12 anos.

Já na investigação contra Márcio Pacheco (PSC), André Ceciliano (PT) e Carlos Minc (PSB) apenas funcionários mencionados em relatório do Coaf (órgão federal de inteligência financeira) foram foco de quebra, em período que variou de 4 a 9 anos.

Flávio e os três deputados estaduais estavam sob a mesma suspeita, mas seus casos foram tocados por promotores diferentes, com métodos distintos. Há ainda outras investigações sobre supostos esquemas de “rachadinha” no MP-RJ sobre as quais não há informações disponíveis.

O filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro é acusado de liderar um esquema de “rachadinha” em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa, levado a cabo por meio de 12 funcionários fantasmas entre 2007 e 2018, período em que exerceu o mandato de deputado estadual.

Flávio foi denunciado em novembro de 2020 pela Promotoria fluminense sob a acusação dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ele nega as acusações.

A quebra generalizada de sigilo de ex-assessores do senador fez com que o Ministério Público do Rio obtivesse dados de ex-funcionários de Flávio também no período em que estavam lotados no gabinete do presidente Jair Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

A medida também atingiu três pessoas sem vínculo político com Flávio. Por outro lado, permitiu a identificação de outros 13 suspeitos além daqueles mencionados pelo Coaf em seus relatórios.

Na última terça-feira (23), a Quinta Turma do STJ anulou a decisão que quebrou os sigilos de Flávio e outros investigados. Por 4 a 1, a maioria entendeu que o juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, não justificou a necessidade da medida. O MP-RJ estuda se vai recorrer da decisão.

A corte ainda vai analisar a legalidade de relatórios do Coaf produzidos ao longo da investigação. A eventual anulação desses documentos compromete quase todas as provas do caso Flávio. O julgamento marcado para esta terça-feira (2) foi adiado.

Todas as investigações foram abertas com base no relatório do Coaf que identificou movimentações financeiras atípicas de 75 assessores de 21 deputados. Além do volume, chamou a atenção transferências bancárias frequentes de membros de um gabinete a outro funcionário, bem como excesso de saques e depósitos de dinheiro vivo em conta.

Os deputados foram investigados pelo Gaocrim (Grupo de Atribuição Originário Criminal) em razão do foro especial do cargo.

Já o procedimento contra o filho do presidente era de responsabilidade do Gaecc (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção), porque o entendimento à época era o de que o senador não tinha direito ao foro de deputado por ter encerrado esse mandato —tese derrubada depois na Justiça.

O Gaocrim e o Gaecc também investigam outros deputados e ex-deputados, mas não há dados disponíveis sobre esses procedimentos.

O trecho do relatório que menciona Fabrício Queiroz, amigo do presidente Bolsonaro e suposto operador financeiro do esquema de Flávio, apontava transferências de 11 funcionários do gabinete para sua conta em 2016. ?

O MP-RJ pediu a quebra de sigilo de 78 ex-assessores que passaram pelo gabinete de Flávio de 2007 a 2018, independente do tempo em que cada um esteve lotado. O intervalo corresponde aos anos em que Queiroz foi funcionário do então deputado estadual.

Ao pedir a quebra de sigilo generalizada, os promotores afirmaram que a medida era necessária porque, além das transferências identificadas, havia um grande registro de depósitos em espécie na conta de Queiroz cuja origem não era indicada. A maior parte deles, próximo da data de pagamento de salários.

“[A quantidade de depósitos] evidencia a possibilidade de que, além das transferências bancárias realizadas diretamente entre os servidores identificados pelo Coaf, outros assessores ligados ao ex-deputado estadual, de forma generalizada, sacavam mensalmente parte de seus vencimento e repassaram em espécie a Queiroz, prática ilícita conhecida no meio político como ‘rachadinha’”, escreveu o MP-RJ ao solicitar as quebras, em abril de 2019.

O Gaecc também apontou que o intervalo de um ano descrito no relatório do Coaf representava “período de tempo diminuto”, apenas 1 dos 12 anos de vínculo empregatício entre Queiroz e Flávio.

A primeira tese de defesa de Queiroz também foi usada como argumento. Ele reconheceu ao MP-RJ, por escrito, que recolhia parte do salário dos funcionários. O objetivo, segundo ele, era contratar informalmente outras pessoas para ampliar o trabalho de base de Flávio.

“Somente com a análise pormenorizada e cruzamentos dos dados bancários e fiscais será possível quantificar com precisão o volume total de recursos desviados dos cofres públicos”, afirmaram os promotores.

Situação semelhante, porém, ocorreu no caso de Márcio Pacheco. O chefe de gabinete André Santolia, suposto operador financeiro, também afirmou ao Gaocrim que recebia parte do salário dos colegas. O objetivo, segundo ele, era criar um “fundo solidário” para servir como fonte de empréstimo a ser dado aos funcionários do gabinete em caso de necessidade.

A diferença entre Santolia e Queiroz é que os repasses ao funcionário do deputado do PSC se davam principalmente por meio de transferências bancárias.

Na investigação contra Pacheco, houve quebra de sigilo apenas dos 11 assessores mencionados pelo Coaf. A medida abrangeu janeiro de 2016 e março de 2019. Santolia atua junto com o deputado ao menos desde 2011.

Uma quebra mais ampla neste caso atingiria o governador interino Cláudio Castro (PSC), ex-assessor de Pacheco até janeiro de 2016, quando assumiu o mandato como vereador. À época ele era vice-governador, cuja atribuição para investigação também é do Gaocrim.

A apuração concluiu que Pacheco desviou R$ 1 milhão do salário dos ex-assessores em esquema semelhante ao atribuído a Flávio. Na denúncia, o MP-RJ reconhece a possibilidade dos repasses terem começado antes de 2016. Ele nega as acusações

Já a apuração contra André Ceciliano, presidente da Assembleia, teve como alvo apenas três assessores mencionados pelo Coaf, além de um parente deles também presente no relatório. O foco era o casal Elisangela Barbieri e Carlos Alberto Dolavale, ex-assessores cuja movimentação financeira chegou a R$ 42 milhões entre 2011 e 2017.

Embora concentrados em cheques, a movimentação dos dois também tinha grande quantidade de depósitos em espécie. A quebra foi feita entre 2011 e 2019.

Esta investigação foi enviada para a primeira instância, tirando o foco sobre Ceciliano. Ele agora recai sobre a suposta atuação de Dolavale como agiota.

No caso de Minc, o Gaocrim restringiu o pedido de quebra de 2016 a março de 2019 apenas nos cinco assessores mencionados pelo Coaf. O principal suspeito na apuração está no cargo ao menos desde 2010.

Essa investigação foi arquivada pelo MP-RJ após a análise dos dados bancários.

A quebra ampla no caso de Flávio permitiu aos investigadores identificarem mais duas ex-assessoras supostamente envolvidas no esquema da “rachadinha”, cujo vínculo com Queiroz não era conhecido até então. Indicou ainda um suposto repasse de R$ 20 mil para a mulher de Flávio por outro assessor.

Ela também apontou uma rotina de saques de 11 parentes da ex-mulher de Bolsonaro, Ana Siqueira Valle. O chamado “núcleo Resende”, cidade onde os ex-assessores moram, foi alvo de buscas e ainda está sob investigação.

A medida, porém, também atingiu cinco ex-assessores de Jair Bolsonaro no período em que estiveram em seu gabinete na Câmara. Um deles esteve por apenas quatro meses com Flávio, mas seis anos com o presidente.

Os dados permitiram identificar que Nathalia Queiroz, filha do PM aposentado, abasteceu a “rachadinha” também quando era funcionária do presidente.

Da mesma forma, a quebra abrangeu ex-assessores de Carlos, também alvo de investigação do MP-RJ.

Do total de 78 ex-assessores cuja quebra de sigilo foi autorizada, 54 não foram alvo de buscas por não terem sido identificadas irregularidades.

Entre eles há três pessoas que foram exoneradas por Flávio da liderança do PSL na Assembleia menos de um mês depois dele ter assumido o cargo. Eles haviam sido nomeados por outro deputado e não tinham vínculos políticos com o senador.

As informações são da Folha de S. Paulo

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