VICTORIA AZEVEDO E FERNANDA BRIGATTI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (27) o requerimento de urgência de um projeto de lei que trata da reciprocidade ambiental.
A urgência acelera a tramitação de propostas na Câmara, já que elas não passam pela análise nas comissões temáticas e seguem direto ao plenário. A votação da urgência foi simbólica; apenas da federação formada por Rede e PSOL foi contrária ao andamento acelerado do texto.
A proposta proíbe o Brasil de participar, patrocinar ou ser signatário de acordos internacionais que possam representar “restrições às exportações brasileiras e ao livre comércio” quando os outros países ou blocos signatários não adotarem medidas de proteção ambiental equivalentes.
Durante a discussão da urgência, o presidente da Câmara, deputado federal Artur Lira (PP-AL), disse que dar andamento à proposta é uma reação necessária a críticas e desinformação propagadas por empresas francesas.
Considerado prioritário para a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), o projeto, apresentado em abril, voltou a ser discutido nesta semana após decisão do Carrefour de suspender a compra de carnes provenientes do Mercosul, incluindo do Brasil, para os seus pontos de venda da França.
A FPA é uma das principais forças do Congresso Nacional, com cerca de 300 deputados.
Lira também disse, durante a sessão desta quarta, que há preocupação com outros países com que o Brasil tem relações comerciais.
“Se a gente for implementar o principio da reciprocidade, eles não tem as reservas que o Brasil têm, eles não têm as reservas indígenas, as reservas quilombolas, as áreas de preservação ambiental, portanto, eles poderiam sofrer com essas bilateralidades.”
Na segunda (25), num evento em São Paulo, Lira havia criticado o que chamou de “protecionismo exagerado” da França, mencionando a decisão da empresa francesa e indicou que o Congresso Nacional daria andamento à tramitação do projeto.
Ao anunciar que não compraria mais carnes produzidas no Mercosul, o presidente do grupo Carrefour, Alexandre Bompard, disse que havia o “risco de inundar o mercado francês com uma produção de carne que não respeita suas exigências e normas.”
O anúncio abriu uma crise diplomática com reflexos no abastecimento da rede no Brasil. No início desta terça, Bompard se desculpou.
Lira considerou insuficiente a resposta e disse que a “retratação” aos ataques que fez ao agronegócio brasileiro não convenceu ninguém e ficou muito abaixo do esperado.
De autoria do deputado Tião Medeiros (PL-PR), o projeto de lei deverá ser relatado pelo deputado Zé Vitor (PL-MG), que integra a diretoria da bancada ruralista.
De acordo com relatos, o projeto, uma vez aprovado na Câmara, seja apensado a outro de teor semelhante no Senado, que é relatado por Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura no governo Jair Bolsonaro (PL). Dessa forma, Zé Vitor deverá construir um parecer em conjunto com a senadora.
A ideia é que o projeto seja votado ainda neste ano, antes do início do recesso parlamentar, no fim de dezembro. “Será neste ano. Vamos trabalhar junto do Senado, de forma coordenada”, disse Zé Vitor à reportagem.
Nesta quarta, Lira disse que a Câmara deverá esperar o andamento do texto do Senado, para que depois as propostas sejam combinadas.
Com o projeto de lei, o Congresso pretende impor o mesmo nível de restrição ambiental que seu parceiro comercial imponha ao Brasil.
Ainda não foi detalhado, porém, como isso ocorreria e quais possíveis efeitos poderia ter, inclusive, sobre grandes parceiros comerciais do Brasil, já que se trata de um projeto com abrangência mundial, e não apenas em relação à França ou União Europeia.
Tanto a proposta da Câmara quanto a do Senado querem alterar a lei da Política Nacional sobre Mudança do Clima.
O texto em andamento no Senado diz que o mercado brasileiro só poderia comprar bens e produtos de países que “adotam e cumpram níveis de emissões de gases de efeito estufa iguais ou inferiores ao do Brasil”.
O deputado Tião Medeiros defende, no projeto em tramitação na Câmara, que o reconhecimento mútuo de políticas e medidas ambientais evita medidas protecionistas e garante um “campo de jogo nivelado” no comércio internacional.
“A medida ajudaria a prevenir situações em que as exportações brasileiras são indevidamente penalizadas por medidas ambientais que são mais rigorosas ou arbitrárias em comparação com aquelas aplicadas em outros mercados”, diz o parlamentar na justificativa do projeto.