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Política & Poder

Brecha na PEC pode deixar incentivos tributários intocados

Aprovada na última semana pelo Senado, a medida deve ser posta em votação na Câmara até esta quarta-feira (10)

Redação Jornal de Brasília

09/03/2021 11h19

Danielle Brant, Bernardo Caram e Renato Machado
Brasília-DF

Uma brecha na PEC (proposta de emenda à Constituição) Emergencial pode tornar sem efeito o trecho que prevê cortes de benefícios tributários, deixando intocados os incentivos existentes hoje na legislação.

Aprovada na última semana pelo Senado, a medida deve ser posta em votação na Câmara até esta quarta-feira (10), segundo cronograma do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).

O texto determina que o presidente da República encaminhe ao Congresso, em até seis meses após a promulgação da PEC, um plano agressivo de redução de benefícios tributários.

A única obrigação do governo, porém, é que a proposta seja elaborada e entregue ao Legislativo. Não há determinação de que esses benefícios sejam de fato cortados.

O dispositivo também não traz nenhuma sanção caso o plano não seja aprovado pelos deputados e senadores ou as reduções de incentivos não se concretizem.

A proposta original apresentada pelo governo em 2019 definia que, a partir de 2026, a criação e a renovação de incentivos fiscais ficariam proibidas caso o total de gastos tributários estivesse acima de 2% do PIB.

O texto aprovado pelo Senado alterou essa regra. Ele determina que o presidente envie propostas que tenham o objetivo de reduzir os benefícios tributários federais em 10% ao ano, de modo que o montante dessa conta não ultrapasse 2% do PIB no prazo de oito anos.

“A obrigação imposta pela PEC se esgota com o envio ao Congresso do plano de redução de renúncias, atendidas as metas especificadas. A efetiva redução das renúncias depende da aprovação das medidas propostas, ou de outras no mesmo sentido, o que dependerá, naturalmente, de juízo político”, disse o consultor de Orçamentos do Senado Vinicius Amaral.

Responsável pela elaboração da medida, o relator da proposta, senador Márcio Bittar (MDB-AC), não respondeu aos contatos da reportagem. O Ministério da Economia também não havia se pronunciado até a conclusão deste texto.

Os parâmetros estabelecidos na PEC são considerados duros. Para efetivar os cortes propostos, o governo teria de reduzir à metade os incentivos existentes hoje, que estão pouco acima de 4% do PIB.

O problema, segundo técnicos, é que a PEC traz exceções que correspondem a aproximadamente 2% do PIB. Seriam poupados o Simples Nacional, entidades sem fins lucrativos, incentivos a produtores de Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a Zona Franca de Manaus, itens da cesta básica e bolsas de estudo.

Portanto, para conseguir reduzir essa conta ao limite de 2% do PIB, o governo teria que cortar a outra metade dos benefícios. Nessa lista estão, por exemplo, as isenções e deduções do Imposto de Renda, incentivos a medicamentos, isenção tributária da poupança e benefícios ao setor de informática.

“Dadas as renúncias já excluídas do plano, é muito provável que o governo irá propor redução ou eliminação de benefícios como isenções e deduções do IR, como as de despesas com saúde e educação. Essas serão certamente medidas impopulares, cuja aprovação se torna mais improvável à medida que se aproximem as eleições”, disse o consultor.

Amaral ainda aponta que a atual redação da PEC, que será analisada pela Câmara nesta semana, exclui dos cortes a isenção de IR sobre a distribuição de lucros e dividendos. Isso porque a Receita Federal não considera esse benefício em seu demonstrativo de gastos tributários.

A PEC Emergencial foi negociada pelo governo como uma espécie de contrapartida à nova rodada do auxílio emergencial. O texto libera a assistência e traz medidas de ajuste fiscal que poderão ser adotadas no futuro, especialmente corte de gastos com a folha de salário dos servidores.
Na Câmara, deputados tentam excluir dos efeitos de ajuste policiais e outros profissionais da área.

Nesta segunda (8), o presidente Jair Bolsonaro disse que a bancada da segurança pública, com cerca de 50 parlamentares, quer mudanças no texto da proposta. O presidente disse que conversou com o relator do texto e que há risco de a PEC não ser aprovada se artigos do texto não fossem alterados.

O deputado Capitão Augusto (PL-SP), da frente parlamentar de segurança pública, apresentou emenda aditiva para retirar polícias federais, civis, militares, bombeiros e agentes penais de todos os entes federados das medidas de ajuste fiscal previstas na PEC, como proibição de aumento ou realização de concurso público por estados e municípios endividados.
Na avaliação do parlamentar, a emenda só anda se conseguir apoio de Bolsonaro.

A tentativa conta com respaldo de bolsonaristas ligados à segurança pública, como o líder do PSL na Câmara, Vitor Hugo (GO). No entanto, a avaliação de líderes partidários é que qualquer precedente pode abrir caminho para uma desidratação grande do texto.

Um líder de partido do centro afirma que, se excluir policiais dos efeitos da PEC, outras categorias farão pressão para saírem, como profissionais de saúde e professores, por exemplo. A articulação que está ocorrendo na Câmara é no sentido de manter acordo sobre o texto que saiu do Senado, sem qualquer modificação que possa atrasar a tramitação da proposta.
Na sexta (5), o relator do texto, Daniel Freitas (PSL-SC), sinalizou que não faria alterações na proposição para evitar que a votação se alongue e comprometa o pagamento do auxílio ainda em março.

O governo e a equipe econômica escaparam com relativo sucesso das pressões para retirar dos gatilhos as remunerações de policiais, de profissionais de segurança, defensores públicos, entre outras categorias.
Por outro lado, outros setores da administração conseguiram uma espécie de blindagem, garantindo a possibilidade de que receitas sejam vinculadas a suas áreas, como as Forças Armadas e suas atividades de “interesse à defesa nacional”. Fundos ligados à Polícia Federal também receberam o mesmo tratamento.

Gastos tributários do governo federal*

Simples Nacional
R$ 87,2 bilhões

Rendimentos isentos do IR
R$ 32,1 bilhões

Agricultura e agroindústria
R$ 30,2 bilhões

Zona Franca de Manaus e áreas de livre-comércio
R$ 24,7 bilhões

Entidades sem fins lucrativos
R$ 24,3 bilhões

Deduções do IR
R$ 20,1 bilhões

Benefícios do trabalhador
R$ 12,5 bilhões

Desoneração da folha de salários
R$ 9,6 bilhões

Medicamentos e equipamentos médicos
R$ 9,4 bilhões

*Valor nominal em 2019

As informações são da Folhapress

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