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Política & Poder

Bloco de terceira via é batizado de ‘Centrinho’ por antigos aliados do Centrão

O apelido é uma referência à desidratação do grupo que tenta articular a frente

Redação Jornal de Brasília

22/06/2021 6h33

A saída de Luciano Huck do pelotão dos presidenciáveis fez crescer a percepção de que a busca por uma candidatura única nas fileiras do centro não vingará para as eleições de 2022. A desistência do apresentador de TV reduziu ainda mais as opções dos envolvidos na tentativa de construir uma frente alternativa à polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desconfiados da vitalidade do chamado “centro democrático”, dirigentes de partidos convidados a compor a aliança dizem não acreditar nesse casamento e, nos bastidores, chamam o bloco da terceira via de “Centrinho”.

O apelido é uma referência à desidratação do grupo que tenta articular a frente. Além disso, “Centrinho” virou um contraponto irônico à força do “Centrão”, núcleo fisiológico que dá as cartas no Congresso e é aliado do Palácio do Planalto. Muitos dos críticos do bloco da terceira via já integraram o Centrão, como o PSD do ex-prefeito Gilberto Kassab, que emplacou no governo o ministro das Comunicações, Fábio Faria, hoje perto de migrar para o Progressistas.

Bolsonaro tem a seu lado partidos como o Progressistas do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), o PL de Valdemar Costa Neto e o Republicanos, ligado à Igreja Universal de Edir Macedo. Conta, ainda, com apoios já declarados do Patriota – legenda com a qual negocia filiação para os próximos dias -, do PTB e de integrantes de vários outros partidos, como no PSL, de quem procura se reaproximar. Em campanha pela reeleição, o presidente amarra acordo com a cúpula desses partidos para 2022, à base de distribuição de cargos e verbas públicas.

A insistência do ex-ministro Ciro Gomes (PDT) em ser cabeça de chapa a qualquer preço e a divisão do PSDB entre quatro pré-candidatos se somam às dificuldades enfrentadas pelo grupo que defende a união contra “os extremos” na corrida presidencial. Na prática, Ciro é o único nome que, convertido ao centro, divulga propostas nas redes sociais, orientado pelo marqueteiro João Santana.

O ex-ministro escolheu Lula como alvo, seguindo a estratégia de arrebanhar votos de eleitores antipetistas desiludidos com Bolsonaro. Mas, como pesquisas qualitativas mostraram que a carga de ataque ao PT foi considerada excessiva, Ciro reforçou a artilharia na direção do presidente.

Em conversas com políticos de vários matizes ideológicos, Lula tem estimulado que haja uma pulverização de candidaturas no primeiro turno, para “povoar” a terceira via. Ao mesmo tempo, porém, procura beliscar uma fatia da centro-direita – e não somente da centro-esquerda -, principalmente por intermédio de acordos regionais.

O PSD de Kassab, por exemplo, tem sido cortejado por Lula e vice-versa. Kassab afirmou que não participa de “reuniões do ‘Centrinho'” porque o PSD, sob seu comando, lançará candidato ao Planalto.

“São partidos sérios que estão atrás de um entendimento e isso é legítimo. Mas nós queremos ter uma candidatura própria de centro, para resgatar o eleitor que rejeita tanto Bolsonaro como Lula”, disse Kassab, que trabalha para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), deixar o DEM e se filiar ao PSD.

Pacheco se encontrou no último dia 12 com os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, em São Paulo, acompanhado de Kassab. Na véspera, tinha jantado com o prefeito do Rio, Eduardo Paes, que recentemente saiu do DEM e migrou para o PSD. As conversas giraram em torno das dificuldades para as eleições de 2022.

O plano inicial da cúpula do PSD é lançar Pacheco como candidato à sucessão de Bolsonaro, mesmo comprando briga com a cúpula do DEM. Nos bastidores, porém, presidentes de partidos de centro observam que, apesar desse discurso, o movimento de Kassab é para que o PSD conquiste o lugar de vice na chapa liderada por Lula. Nesse caso, o nome oferecido como dote seria o de Pacheco, hoje no DEM.

Kassab nega e diz que o PSD tem figuras de peso para concorrer à Presidência, como o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, embora o nome dele seja cogitado para disputar o governo de Minas. O PT indicou a possibilidade de apoiar a candidatura de Kalil ao Palácio da Liberdade, em troca do aval do PSD a Lula.

Diante do impasse, no entanto, o deputado Reginaldo Lopes (MG) teve aval de Lula para se lançar ao governo de Minas pelo PT. “Ainda pode haver aliança com Kalil. Mas eu pergunto: em que lado ele está na história?”, provocou Reginaldo, numa alusão a declarações do prefeito de Belo Horizonte, segundo as quais não endossar Bolsonaro não significa adesão automática a Lula.

Sem contar com o PSD e com rachas internos, o “Centrinho” não esconde a falta de rumo, embora o grupo não tenha se surpreendido com o anúncio de Huck, que também recuou em 2018. Após divergências com integrantes de seu partido, o Novo, o empresário João Amoedo – que havia anunciado a candidatura – também desistiu de concorrer.

Ao que tudo indica, o ex-ministro da Justiça e ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro, hoje consultor da Alvarez & Marsal, é outro nome que não entrará nesse páreo, embora haja um grupo ainda empenhado em convencê-lo.

No cenário atual, os nomes que buscam a vaga de candidato da frente, além de Ciro Gomes, são o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM); os governadores de São Paulo, João Doria, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite; o senador Tasso Jereissati (CE) e o ex-prefeito de Manaus, Arthur Virgílio.

Antes, porém, os quatro tucanos vão passar por uma prova de fogo: se não houver novas mudanças nesse calendário nem outras desistências no meio do caminho, Doria, Leite, Tasso e Virgílio vão disputar prévias no PSDB, em novembro, para escolha do candidato à Presidência.

Líderes do “Centrinho” observam que, com tantos problemas para unificar posições, muitos atores políticos se afastaram das tratativas para por de pé uma frente de centro que fure a polarização entre Bolsonaro e Lula. Na quarta-feira, 16, por exemplo, uma reunião em Brasília pretendia juntar à mesma mesa os presidentes de partidos envolvidos nessas articulações desde 2020, mas nem todos compareceram. Cinco legendas estavam representadas no almoço por seus presidentes: DEM, com ACM Neto; PV, com Jorge Luiz Penna; Podemos, com Renata Abreu; Cidadania, com Roberto Freire; e PSDB, com Bruno Araújo.

Convidadas, as direções do MDB e do Solidariedade enviaram parlamentares. No mesmo horário daquele encontro, o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP), conversava com Pacheco e Kassab, na residência oficial do Senado. O presidente do PDT, Carlos Lupi, avisou, por sua vez, que tinha um compromisso e também faltou. Dos nomes testados até agora, apenas Mandetta – que foi o organizador da reunião – estava presente.

Comunicação. A ideia do grupo é construir uma estratégia de comunicação conjunta, sem por enquanto definir um candidato, e organizar debates envolvendo os partidos, e seus respectivos postulantes à cadeira de Bolsonaro, sobre o futuro do País. “Todos têm interesse em buscar um caminho que permita sair da polarização”, disse ACM Neto, ex-prefeito de Salvador e candidato ao governo da Bahia, em 2022. “Queremos gerar na sociedade a expectativa de que pode existir uma candidatura viável. Se não é cruzar os braços e esperar a morte chegar cheia de dente na boca”.

Na centro-esquerda, o PSB e o Solidariedade, que não apresentaram candidato próprio em 2018, caminham para apoiar Lula, ofuscando ainda mais as conversas da frente de centro. Nesta terça-feira, 22, o PSB receberá a filiação do governador do Maranhão, Flávio Dino (ex-PC do B), e do deputado Marcelo Freixo (ex-PSOL), defensores de uma ampla aliança. Dino pretende disputar o Senado. Freixo deve ser candidato ao governo do Rio e negocia uma dobradinha com o PT.

O movimento preocupa Ciro, que briga pelo apoio do PSB, mas vê o partido prestes a assinar uma união estável com Lula. Para o deputado Paulo Pereira da Silva (SP), presidente do Solidariedade, a parceria do centro não dará certo no primeiro turno.

“Todo mundo quer ser candidato ali. À medida que um fala ‘o candidato sou eu’, o outro vai dizer ‘não senhor, sou eu’. Então, isso não tem futuro”, afirmou Paulinho da Força, como é conhecido o deputado, que em 2002 concorreu a vice na chapa liderada por Ciro. “Eu não estou a fim de ficar construindo mais esse centro. Não acredito nisso. É difícil juntar tudo numa candidatura. Vai juntar com quem?”, perguntou.

Estadão Conteúdo

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