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Opinião

Mercosul, Itália e o futuro do comércio global

Na cúpula do G7 de 2024, realizada na Itália, a América Latina ganhou destaque como um parceiro estratégico para a Europa

Redação Jornal de Brasília

09/07/2025 19h22

Foto: Câmara de Comércio Exterior (Camex)

Por Renata Bueno*

Em 1º de julho de 2025, o Mercosul, bloco econômico que reúne Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, deu um passo significativo em suas negociações comerciais com a União Europeia (UE), consolidando sua posição como um ator relevante no comércio global. A Itália, com seu papel estratégico na cúpula do G7 de 2024, onde a América Latina esteve no centro das discussões, desempenhou um papel crucial na aproximação entre os dois blocos.

Como ex-parlamentar italiana e advogada com experiência em relações internacionais, destaco a importância desses avanços e o impacto que acordos como o firmado com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) podem ter, inclusive em setores específicos, como a importação de produtos de alto valor agregado, como o chocolate.

Na cúpula do G7 de 2024, realizada na Itália, a América Latina ganhou destaque como um parceiro estratégico para a Europa em um cenário global marcado por tensões comerciais e protecionismo. A Itália, com sua tradição de diplomacia pragmática e influência dentro da UE, foi peça-chave na promoção de um diálogo construtivo entre o Mercosul e a Europa.

Durante o evento, líderes italianos reforçaram a necessidade de fortalecer os laços econômicos com a América do Sul, reconhecendo o potencial de mercados como o brasileiro e o argentino para impulsionar o comércio bilateral.

A Itália, como um dos principais mercados consumidores de produtos de alta qualidade na Europa, tem interesse direto em acordos que facilitem o acesso a bens agrícolas e industriais sul-americanos. Além disso, a posição italiana foi de apoio às demandas do Mercosul, especialmente às solicitações da Argentina por ampliação de exceções tarifárias, que foram aceitas pelo Brasil. Esse gesto demonstra um compromisso mútuo com a integração econômica e a busca por acordos equilibrados que beneficiem todas as partes.

As negociações iniciadas em 1999, culminaram em um marco histórico em dezembro de 2024, com a conclusão das negociações técnicas anunciada na Cúpula do Mercosul em Montevidéu. O acordo, que ainda depende de revisão jurídica, tradução e ratificação pelos parlamentos europeus, promete criar uma das maiores zonas de livre comércio do mundo, abrangendo cerca de 718 milhões de consumidores e um PIB combinado de aproximadamente US$ 22 trilhões.

A Itália, ao lado de países como a Espanha, manifestou apoio ao acordo, contrastando com a resistência de nações como a França, que teme a concorrência de produtos agrícolas

sul-americanos. A posição italiana reflete uma visão estratégica: ao abrir seus mercados para produtos do Mercosul, a UE pode acessar matérias-primas e commodities a preços competitivos, enquanto exporta bens industriais de alto valor agregado, beneficiando indústrias italianas em setores como automotivo, tecnologia e moda.

Paralelamente, o Mercosul anunciou, em 2 de julho de 2025, a conclusão de um acordo de livre comércio com a EFTA, bloco composto por Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein. Este tratado, negociado desde 2017, cria uma zona de livre comércio com quase 300 milhões de consumidores e um PIB combinado de US$ 4,3 trilhões. A EFTA eliminará 100%

das tarifas de importação para os setores industrial e pesqueiro, enquanto quase 99% das exportações agrícolas do Mercosul terão acesso preferencial.

Um dos impactos mais notáveis desse acordo é a redução de tarifas para produtos como o chocolate suíço, que poderá chegar aos mercados do Mercosul, incluindo o Brasil, a preços mais competitivos. Isso beneficia indiretamente a Itália, que, como grande importadora de chocolate de alta qualidade, poderá acessar esses produtos com custos reduzidos por meio de cadeias comerciais integradas na Europa. Além disso, o acordo abre novas oportunidades para exportações italianas, como vinhos, azeites e produtos manufaturados, para os países da EFTA, fortalecendo ainda mais os laços econômicos.

Para o Mercosul, o acordo com a EFTA representa um aumento de 2,5 vezes na corrente de comércio coberta por acordos de livre comércio, passando de US$ 73,1 bilhões para US$ 184,5 bilhões. Produtos brasileiros, como carnes, milho, café e frutas, ganharão acesso privilegiado aos mercados da EFTA, enquanto medicamentos suíços, por exemplo, poderão chegar ao Brasil com custos reduzidos, beneficiando consumidores.

Para a Itália, esses acordos reforçam sua posição como um hub comercial na Europa. A redução de barreiras tarifárias e a modernização das cadeias produtivas, apoiadas pela tecnologia suíça e norueguesa, podem beneficiar indústrias italianas que dependem de insumos importados. No entanto, desafios permanecem, especialmente a necessidade de ratificação do acordo Mercosul-UE, que enfrenta resistência de países como a França e a Polônia, que buscam proteger seus setores agrícolas.

Como ex-parlamentar italiana, vejo com otimismo os avanços nas relações entre o Mercosul, a UE e a EFTA. A Itália, com seu papel de liderança no G7 e sua influência na UE, tem a oportunidade de promover uma agenda de comércio justo e sustentável. Esses acordos não apenas ampliam o acesso a mercados, mas também fortalecem a cooperação em áreas como inovação, sustentabilidade e saúde.

O futuro do comércio global depende de parcerias estratégicas que equilibrem interesses econômicos e compromissos com o desenvolvimento sustentável. A Itália, com sua história de diálogo e inovação, está bem posicionada para liderar esse processo, enquanto o Mercosul consolida sua relevância como parceiro econômico global. Como advogada e defensora da integração internacional, acredito que esses acordos são passos fundamentais para um mundo mais conectado e próspero.

Renata Bueno é uma parlamentar ítalo-brasileira nascida em 1979 em Brasília, DF, Brasil. Conhecida por seu envolvimento na política e na defesa dos direitos dos descendentes de italianos no Brasil. Renata Bueno foi eleita deputada federal em 2010, sendo a primeira mulher eleita pelo Partido Socialista Italiano (PSI) fora da Itália. Sua atuação política tem sido focada em temas relacionados à cidadania italiana, imigração, e fortalecimento dos laços entre Brasil e Itália. Ela é presidente da Associação pela Cidadania Italiana no Brasil e tem trabalhado para facilitar o processo de reconhecimento da cidadania italiana para descendentes de italianos no país. Além de parlamentar, Renata é advogada e empresária, com o Instituto Cidadania Italiana e Mozzarellart.

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