Por Renata Bueno*
Viver há mais de duas décadas na Itália me permite observar de perto tradições que fazem parte da identidade deste país. Uma delas é o Ferragosto, celebrado em 15 de agosto, que representa o auge das férias italianas. Nesse período, é como se o país inteiro desacelerasse: cidades grandes ficam praticamente desertas pelos italianos, comércios fecham suas portas e muitos serviços se tornam limitados. Trata-se de um fenômeno cultural fascinante, que reflete a importância do descanso coletivo e da vida em comunidade para os italianos.
Tão marcante quanto o Ferragosto é o movimento que o sucede: o chamado grande rientro. Após semanas de pausa, milhões de italianos retornam para suas casas e o país começa a retomar o ritmo normal. Essa transição é visível no dia a dia: restaurantes voltam a abrir, ruas se enchem novamente e escritórios retomam o funcionamento. Aos poucos, a sensação de “cidades desertas” dá lugar ao burburinho característico da vida urbana italiana.
O mês de setembro carrega um simbolismo especial, pois marca o fim da alta temporada de verão e a chegada do outono, período em que a Itália volta a respirar o cotidiano com mais intensidade. Ainda assim, setores como o judiciário e o educacional sentem os reflexos da pausa de agosto, já que seus calendários se ajustam gradualmente após o recesso.
Esse período de transição revela, em minha opinião, um equilíbrio muito próprio da cultura italiana: o reconhecimento de que o descanso não é perda de tempo, mas sim um investimento em qualidade de vida. O país sabe parar para depois recomeçar com mais energia, algo que muitas sociedades poderiam valorizar mais.
O pós-Ferragosto é também uma das melhores demonstrações de como a Itália alia tradição e modernidade. O grande rientro não é apenas a volta à rotina, mas um reencontro com o cotidiano, com os compromissos profissionais e familiares, e com a vida comunitária que tanto caracteriza o país. Mais do que um simples retorno, setembro simboliza um recomeço coletivo: um momento de reorganização, de retomada de projetos e de olhar para o restante do ano com novas perspectivas.
Como advogada e ex-parlamentar, vejo nesse ciclo uma lição cultural importante. Saber pausar, valorizar o convívio humano e depois retomar o caminho com mais clareza e disposição é, sem dúvida, uma das riquezas mais marcantes da vida italiana.
