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Guerra em Gaza completa dois anos com melhor chance para paz até aqui

As denúncias de genocídio também se intensificaram, impulsionadas pela conclusão de uma comissão de inquérito da ONU

Redação Jornal de Brasília

07/10/2025 6h31

palestinian israel conflict

Foto: AFP

RENAN MARRA E VICTOR LACOMBE
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Apesar das acusações de genocídio, de dezenas de milhares de mortes e de uma crise humanitária sem precedentes, a guerra na Faixa de Gaza completa dois anos nesta terça-feira (7) com o quadro mais promissor para a implementação de uma trégua duradoura desde o início do conflito, em outubro de 2023.

Pressionados por Donald Trump e por países árabes e muçulmanos, representantes de Israel e do grupo terrorista Hamas iniciaram nesta segunda-feira (6), no Egito, uma nova tentativa para discutir os detalhes do plano de paz proposto pelos Estados Unidos. O texto prevê, entre outros pontos, a libertação dos reféns ainda mantidos sob o poder da facção e a retirada gradual das tropas israelenses do território palestino.

Após meses de impasse e sem perspectivas de cessar-fogo, diplomatas afirmam que a exaustão militar, o colapso das condições de vida e a crescente pressão internacional criaram um ambiente em que a paz voltou a ser uma possibilidade real.

“Sim, Israel está [diplomaticamente] mais isolado hoje”, afirma à Folha a coronel da reserva Pnina Baruch, israelense que fez parte de equipes de negociação com palestinos. “Mas, se houver um acordo e a guerra terminar, isso pode mudar.”

Baruch, que também integra o Instituto de Estudos de Segurança Nacional, da Universidade de Tel Aviv, diz que o distanciamento internacional é resultado de um processo que mistura uma campanha de deslegitimação de Israel, a ascensão de um discurso simplificador nas redes sociais e uma gestão política que falhou em explicar essa complexidade ao mundo. “Há uma tendência de enxergar tudo em preto e branco, vítima e agressor, bons e maus.”

Ao mesmo tempo, ela diz que o governo do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, o mais à direita da história do país, agrava a situação ao adotar durante o conflito uma retórica “combativa e racista”, nas palavras dela. “Temos ministros que falam em apagar Gaza e expulsar palestinos. Isso dá munição a quem nos acusa de genocídio”, diz.

Baruch se refere, sobretudo, aos ministros extremistas Itamar Ben-Gvir e Bezalel Smotrich, que sustentam a coalizão de Netanyahu e que, ao longo do conflito, manifestaram-se várias vezes de forma contrária ao fim da guerra. Em relação à proposta de Trump, eles afirmaram que aceitar o plano seria como assinar um acordo de rendição e reconhecer a derrota de Israel no campo de batalha.

Netanyahu, por sua vez, equilibra-se entre a ameaça de colapso de sua coalizão e os protestos diários que exigem o fim dos ataques em Gaza e a assinatura de um acordo para a libertação dos reféns.

As denúncias de genocídio também se intensificaram, impulsionadas pela conclusão de uma comissão de inquérito das Nações Unidas que apontou o crime em Gaza. O governo israelense rejeitou o relatório, chamando as informações de “falsas e politizadas”.

Para analistas, o contexto internacional ajuda a explicar o novo impulso por uma trégua. O isolamento de Tel Aviv, diz Ralph Wilde, professor de direito internacional do University College London, reflete uma mudança gradual na disposição de governos ocidentais em tolerar o que ele descreve como um padrão persistente de ilegalidades.

Para o professor, muitos países apenas agora começam a reconhecer a extensão dessas violações. “O que vemos é uma reação tardia e parcial. Há uma preocupação crescente com o bloqueio de Gaza e com a violência dos colonos na Cisjordânia.”

Endossar o plano de Trump, nesse contexto, é um passo na direção certa, afirma Baruch, a militar da reserva israelense. O Hamas aceitou na sexta-feira (3) partes da proposta e, no mesmo dia, o gabinete de Netanyahu afirmou que “Israel está preparado” para a implementação imediata da primeira fase de um eventual acordo.

Várias questões, no entanto, continuam sem solução, incluindo se o Hamas aceitará se desarmar, uma das principais exigências de Israel.

Não à toa, o biólogo e ativista palestino Mazin Qumsiyeh, da Universidade de Belém, na Cisjordânia, manifesta ceticismo sobre a eficácia do plano, que ainda prevê a criação de um governo tecnocrático palestino. “É um plano de farsantes. Trump é um criminoso de guerra, e Netanyahu quer transformar Gaza em negócio imobiliário.”

Para ele, a paz só será possível com o que chama de “descolonização real”. “Você não pode acabar com uma guerra enquanto um sistema racista permanece no poder”, diz. Ele rejeita também a solução de dois Estados, defendida há décadas pela ONU. “Essa ideia é uma miragem. Não quero um Estado palestino fictício; quero que o mundo boicote Israel, como fez com o apartheid na África do Sul.”

A guerra começou após o mega-ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, quando terroristas invadiram o sul de Israel, mataram cerca de 1.200 pessoas e sequestraram mais de 250. Desde então, a ofensiva israelense devastou Gaza, provocando uma catástrofe humanitária. Segundo o Ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas, mais de 67 mil palestinos morreram, e a maioria da população vive hoje em abrigos improvisados, sem acesso regular a água potável, energia ou medicamentos.

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