IGOR GIELOW
FOLHAPRESS
A Força Aérea dos Estados Unidos enviou três bombardeiros estratégicos B-52 nesta quarta-feira (15) para um voo no mar do Caribe junto à costa da Venezuela, chegando a menos de 200 km de Caracas.
A nada sutil ameaça ocorre no momento em que as tensões entre o governo de Donald Trump e o governo de Nicolás Maduro estão em alta. O americano afirma estar em campanha contra cartéis de narcotráfico que atuam na Venezuela, enquanto o ditador venezuelano o acusa de querer derrubá-lo.
A julgar pelos sinais externos, ambas as coisas são possíveis. Os B-52, aviões desenhados para ataques maciços, raramente fazem voos de treinamento no Caribe.
Ao longo desta manhã e tarde de quarta, eles operaram na FIR (Região de Informação de Voo, na sigla inglesa) da Venezuela, uma área de notificação compulsória antes do espaço aéreo do país, que começa a cerca de 22 km da costa.
Um dos aviões, de registro 60-0033, é um dos 46 da frota de B-52 americana habilitados a empregar também armas nucleares. Os outros dois integram o contingente de 30 que só podem operar armamentos convencionais.
Eles também protagonizaram uma curiosidade rapidamente captada em redes sociais. Sua rota de voo, monitorada por sites como o Flightradar24, sugere o desenho de um grande órgão sexual masculino, o que foi prontamente visto como uma provocação a mais a Maduro. Segundo monitores, um avião-espião Citation-560 da Força Aérea Colombiana acompanhou a ação à distância.
Os aviões circularam a região da ilha La Orchila, onde fica uma base militar e um complexo que costuma receber os presidentes venezuelanos.
Não houve reação oficial de Caracas, que tem reagido com exercícios militares e mobilização de milícias. O governo ainda enfrenta uma semana de pressão extra, com a concessão na sexta-feira (10) do Prêmio Nobel da Paz à principal líder opositora do país, María Corina Machado, chamada por Maduro de “bruxa demoníaca”.
Um vídeo que circulou em redes sociais mostra a decolagem de um caça F-16 da base de El Libertador, na região de Aragua, mas não há confirmação independente de que isso tenha ocorrido nesta quarta.
O episódio é o mais recente de uma cadeia de eventos que começa no dia em que Trump, que no seu primeiro mandato namorou a ideia de derrubar Maduro com a ajuda dos então aliados Brasil e Colômbia.
O americano assinou um decreto possibilitando qualificar cartéis como organizações terroristas.
Um mês depois, em fevereiro, entidades como o mexicano cartel de Sinaloa e o venezuelano Tren de Aragua, que especialistas relutam em qualificar como cartel e não apenas gangue criminosa, foram tachados de terroristas logo, sujeitos a ações militares sem autorização específica pelo Congresso.
De lá para cá, Trump subiu o preço por dicas que levem à prisão de Maduro, indicado por narcotráfico desde 2020 numa corte de Nova York, para US$ 50 milhões. E promoveu a maior mobilização militar no Caribe desde que os EUA agiram para restabelecer o presidente eleito do Haiti em 1994.
Há uma força expedicionária de fuzileiros em três navios, um cruzador, três destróieres, um submarino de propulsão nuclear, dez caças avançados F-35 e vários outros recursos na região. Trump reativou uma base em Porto Rico para centralizar a operação, local que estava fechado havia 21 anos.
Por fim, começou a bombardear pequenos barcos que seu Departamento de Guerra diz serem de traficantes. Foram cinco ações até aqui, com 27 mortos. O governo colombiano, que como o brasileiro hoje é governado pela esquerda, diz que pelo menos em um caso as vítimas eram cidadãos de seu país. Trump nega.
O temor regional é de que Washington esteja, com o pretexto da guerra às drogas, ensaiando uma tentativa de mudança de poder na ditadura esquerdista. No caso do Brasil, há o agravante de que um conflito levaria a um influxo ainda maior de refugiados pela fronteira em Roraima, e o Exército já reforçou suas posições por lá.
Apesar da demonstração de força com os B-52, o ditador pode ser alvo de uma ação menos espetaculosa.
O jornal New York Times revelou nesta quarta que a CIA (Agência Central de Inteligência, na sigla em inglês) foi autorizada a operar secretamente para derrubar Maduro, e o próprio Trump já falou em agir por terra.
Na semana passada, helicópteros da unidade do Exército especializada em operações especiais, como a que levou as forças da Marinha que mataram Osama bin Laden em 2011 no Paquistão, foram avistados treinando em Trinidad e Tobago, junto à costa da Venezuela.