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COP30 quer ‘Pix do clima’ e efeito cascata para combater o colapso da Terra

O órgão encomendou uma consultoria independente que vai avaliar quais são as mudanças possíveis em seus procedimentos para tentar tornar as negociações mais efetivas

Redação Jornal de Brasília

10/11/2025 7h38

pre cop30

Marcelo Camargo/Agência Brasil

JOÃO GABRIEL
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

A COP30, a conferência sobre mudança climática da ONU (Organização das Nações Unidas), será a primeira na história que não vai discutir exatamente como evitar que o mundo ultrapasse o limite do 1,5 ºC de temperatura, mas sim voltar para debaixo dele.

Essa é a visão da presidência brasileira da cúpula, segundo relataram à Folha cinco diplomatas. Agora a direção do evento agora busca encontrar o que chama de gatilhos positivos —ou seja, mecanismos que consigam gerar um efeito efeito em cascata para impedir o colapso da Terra.

Uma das principais apostas para isso é o que foi apelidado de “Pix climático”, uma reestruturação do sistema de financiamento climático global para conectar diretamente as fontes de recursos com as comunidades vulneráveis que dependem do dinheiro para construir, por exemplo, painéis solares ou casas com arquitetura resiliente.

A Folha teve acesso a um vídeo, apresentado pela presidência da COP30 a autoridades de dezenas de países durante a cúpula preparatória de outubro, e que sintetiza essa abordagem.

“As primeiras 29 COPs aconteceram em uma realidade. Uma realidade na qual nos esforçávamos para evitar ultrapassar os limites da Terra. Em Belém, teremos a primeira COP a acontecer em uma nova realidade. A primeira na qual podemos ter certeza de que ultrapassaremos limites. Nós ultrapassaremos o limite de temperatura do 1,5ºC”, começa a peça.

Mudança de narrativa

A percepção entre os diplomatas climática é que os problemas do multilateralismo e da geopolítica somados à crise climática levaram o processo de negociação da UNFCCC (o braço temático da ONU) ao limite. Portanto, é necessário que, além dos países, se consiga mobilizar a sociedade e a economia em torno do tema.

O órgão encomendou uma consultoria independente que vai avaliar quais são as mudanças possíveis em seus procedimentos para tentar tornar as negociações mais efetivas.

Diplomatas climáticos de alto escalão admitem que o discurso em torno de evitar o 1,5ºC de aquecimento trouxe um problema: não passa uma mensagem clara dos efeitos negativos que o aquecimento global tem sobre a vida da população, como alta da inflação e piora na saúde.

Há atualmente uma avaliação de que, se por muitos anos a narrativa foi alertar a sociedade sobre a possibilidade do fim da humanidade, agora é necessário mudar o tom e adotar a linha da defesa de um modelo econômico adaptado a essa nova realidade climática.
“A história global da mudança do clima [precisa] passar do medo para a ação. Do caos para a estabilidade. E da inflexão rumo ao perigo para a aceleração para fora dele”, diz o vídeo.

O ponto de não retorno e o ponto de retorno

O 1,5 ºC de aquecimento da temperatura média global com relação à era pré-indústrial é o limite estipulado por cientistas para evitar que a Terra comece um processo de colapso.

As projeções mostram que a partir desse valor a natureza começa a atingir o chamado ponto de não retorno. Quando isso acontece, um evento gera automaticamente uma reação em cadeia exponencial, acionando outros gatilhos climáticos que podem inviabilizar a vida humana no planeta.

Em 2025, pela primeira vez a ONU reconheceu que não será possível atingir a meta de evitar o 1,5 °C de aumento da temperatura média da Terra.

Portanto, a COP30, que começa nesta segunda-feira (10), é a primeira que acontecerá sob uma nova ótica: a única forma de combater o colapso é o efeito cascata pelos pontos de retorno.

“Ainda resta uma breve janela de esperança, agora mesmo podemos impulsionar os sistemas que levam a essa mudança na direção oposta. Podemos aproveitar pontos de inflexão positivos que nos tirem do risco de colapso para saltos de progresso”, diz o vídeo.

Segundo os relatos feitos à Folha, este trabalho começou a ser feito em 2023, na preparação para a COP28, nos Emirados Árabes Unidos.

Na ocasião, em meados de agosto, a delegação brasileira convocou uma reunião entre seus negociadores para debater o resultado da análise de alguns dados que havia sido feita e que apontavam que a Terra excederia os 1,5 ºC de aquecimento mais rápido que o imaginado.

As projeções apontavam que isso aconteceria em dezembro de 2023. Erraram por um mês: janeiro de 2024 foi o primeiro mês da história a superar esta marca —ainda não na média global, mas pontualmente..

Foi o gatilho para iniciar a discussão sobre os pontos de inflexão positivos.

O Pix do clima

Dentre as ideias está o Pix climático e uma bolsa de valores para o financiamento de soluções —pautas defendidas pelo Brasil e que nasceram do diálogo com pesquisadors como a economista Esther Duflo, ganhadora do Nobel.

A proposta parte do mesmo pressuposto do Pix brasileiro, que a partir da lógica dos sistemas complexos, da infraestrutura digital e do megaprocessamento de dados, conseguiu conectar diretamente todas as contas correntes de CPFs nacionais.

Uma vez que o mecanismo foi implementado no Brasil, em pouco tempo as formas de transação de dinheiro convencionais, como o depósito bancário, caíram em desuso.

A ideia agora é criar um um sistema automatizado, com uso de inteligência artificial, na qual os recursos climáticos disponíveis cheguem, como um pix, para soluções que beneficiem diretamente as populações mais vulneráveis —o que destravaria o financiamento globático em escala global.

Outras propostas que podem ter o mesmo efeito borboleta positivo, segundo os negociadores ouvidos pela reportagem, são o hidrogênio verde, para combustíveis, os fertilizantes sustentáveis, para a agropecuária, e a remuneração da regeneração de florestas, para conservação da natureza.

Como exemplo concreto, eles citam o setor de energia renovável, que hoje, mesmo sob ataque do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, é um mercado crescente.

Neste caso, a alta na demanda de energia puxou o aumento no uso dos painéis solares, que trouxe a necessidade de melhoria em baterias elétricas que, por sua vez, permitiu a popularização dos carros elétricos, em efeito cascata.

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