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COP 30: Impacto das mudanças climáticas na saúde das populações é um dos pontos principais a ser discutido

Evento será oportunidade para médicos, organizações internacionais, governos e profissionais diversos alertarem para necessidade de protocolos que ajudem a mitigar o problema e melhorar questões como a qualidade do ar interno nos ambientes

Redação Jornal de Brasília

07/11/2025 10h18

abertura da pré cop30

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

Hylda Cavalcanti

As medidas para amenizar os impactos da mudança climática no planeta são um dos principais pontos de discussão da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que está programada para se realizar no Brasil a partir do dia 10 e vai até o dia 21 de novembro, em Belém (PA). Mas enquanto entidades de 132 países se organizam, uma das principais preocupações que têm sido externadas por entidades diversas é como essas mudanças têm afetado, nos últimos anos, de forma direta e indireta, a saúde das pessoas.

Muita gente ainda hoje não tem noção do extremo perigo, por exemplo, que temperaturas extremas representam para provocar ou ampliar doenças respiratórias e cardiovasculares, levar a maior incidência de doenças transmitidas por vetores como dengue e zika, a riscos de doenças infecciosas após enchentes e até efeitos negativos na saúde mental. Essas alterações podem levar desde problemas físicos como insolação e fadiga até questões psicossociais complexas como ansiedade e depressão.

Carta da OMS

Em 2021, em plena pandemia da Covid-19, um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) alertou que as mudanças no tempo e no clima causam uma das emergências de saúde mais urgentes enfrentadas nos tempos contemporâneos. Em outubro de 2021, pelo menos 300 organizações, representantes de 45 milhões de profissionais de saúde, publicaram uma carta aberta com um chamado pelo empenho da comunidade internacional para a ação climática.

“Como profissionais de saúde, reconhecemos nossa obrigação ética de falar sobre essa crise em rápido crescimento que pode ser muito mais catastrófica e duradoura do que a pandemia da Covid-19. Nós pedimos que os governos cumpram suas responsabilidades, protegendo seus cidadãos, vizinhos e gerações futuras da crise climática”, afirmaram, na carta.

“Podemos ver esse impacto no aumento da temperatura do planeta, por exemplo, que é responsável por processos de hipertermia (quando o corpo apresenta um aumento acentuado de temperatura) e morte. O maior volume de chuvas e desastres também é outra condição que eleva o risco das doenças infecto-contagiosas, como leptospirose, hepatites, dengue, chikungunya e zika”, explicou o médico Ricardo Heinzelmann, professor do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

Entre os principais fatores que podem influenciar a saúde humana estão os extremos de temperatura e umidade. Ondas de calor e frio podem ficar mais intensas e afetar diversos sistemas do nosso organismo. É comum a associação do frio com o desenvolvimento de doenças respiratórias; no entanto, o sistema circulatório também pode ser prejudicado.

Outro profissional atento para o problema, o professor do Departamento de Geografia Cássio Arthur Wollmann, responsável pelo Laboratório de Climatologia em Ambientes Subtropicais da UFSM, afirmou que, como o calor deve predominar nos próximos anos, as pessoas ficarão acostumadas a viver nesse ambiente. “Temos um clima global que tem se tornado cada vez mais quente, mas isso não significa que nunca mais vai fazer frio. As ondas de frio vão continuar acontecendo e, no momento que atingirem esse corpo ambientado ao calor, a saúde das pessoas ficará extremamente comprometida e frágil”, ressaltou.

Conforme Ricardo Heinzelmann, o aumento de incêndios florestais naturais devido ao aquecimento do clima, também é outra questão, uma vez que provoca ondas de fumaça que podem desenvolver nos seres humanos graves problemas respiratórios, como a descompensação pulmonar, que pode levar a hospitalizações.

Possibilidade de novas pandemias

Diante das altas taxas de desmatamento e da consequente perda global de biodiversidade, a ONU reforçou a influência das ações humanas no surgimento de novas pandemias em seu relatório da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES). Segundo a publicação, cerca de cinco novas doenças aparecem anualmente, todas com potencial pandêmico.

As mudanças climáticas alteram as condições ambientais e, assim, surge uma desregulação daquilo que ocorria naturalmente no ambiente. No cenário de aumento da temperatura, ocorre não apenas a disseminação de novas doenças, mas também o ressurgimento de doenças adormecidas.

O problema também preocupa a organização Médicos Sem Fronteiras (MSF). Os integrantes da entidade divulgaram uma carta pública onde se dizem preocupados com a crise climática. Maria Guevara, secretária-médica internacional de MSF, afirmou que é preciso atuar “como um coletivo da humanidade, mas principalmente, em apoio às pessoas que vivem em situação mais vulnerável”.

Profissionais de saúde de áreas diversas fazem alertas semelhantes. Moara Santa Bárbara, infectologista do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG), afirmou que os eventos climáticos extremos estão alterando o cenário epidemiológico brasileiro.

“Chuvas intensas seguidas por altas temperaturas criam condições ideais para a proliferação de vetores, como o Aedes aegypti , transmissor de dengue, zika e chikungunya”, explicou. O mosquito se reproduz em pequenas quantidades de água limpa e parada, e seus ovos podem resistir ao ressecamento entre as estações chuvosas. “Os desastres naturais causados pelas mudanças climáticas aumentam a oferta de criadouros devido ao acúmulo de entulhos e reservatórios de água estagnada”, completou.

Importância de medidas preventivas

Além das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti , a médica destacou outras enfermidades causadas por vetores como mosquitos e carrapatos, incluindo febre amarela, malária, leishmaniose, filariose e febre maculosa, também vêm expandindo sua área de ocorrência nos últimos anos.

O infectologista Hilton Alves Filho, chefe da Unidade de Vigilância em Saúde do Hospital Escola da Universidade Federal de Pelotas (HE-UFPel), também destacou a importância de medidas preventivas durante períodos de chuvas intensas e inundações.

“As ações preventivas podem ser implementadas em diferentes níveis: pessoal, domiciliar e comunitário”, disse. Ele enfatizou que garantir o acesso à água potável e adotar práticas adequadas de higiene e saneamento são importantes para prevenir doenças.

O pneumologista do Hospital de Doenças Tropicais da Universidade Federal do Tocantins (HDT-UFT), Emanuell Felipe Silva Lima lembrou que estima-se que, até 2030, se nada vier a ser feito, “as mudanças climáticas poderão causar cerca de 250 mil mortes adicionais por ano, principalmente devido a doenças respiratórias”. Motivo pelo qual é fundamental adotar medidas para reduzir as emissões de gases poluentes e promover a saúde respiratória”, conforme orientou ele.

Estudo publicado pela The Lancet

No final de 2024, a revista científica “The Lancet” publicou estudo amplo e profundo sobre o impacto das mudanças climáticas na saúde das pessoas.O estudo destaca que em 2023, foram registrados 5 milhões de casos de dengue em mais de 80 países – um recorde histórico.

A maioria dos casos ocorreu no Brasil, Peru, México e Colômbia. Mas também houve em países que não costumam conviver com a doença registros de dengue não importada, ou seja, contraída na própria região – como Estados Unidos, Itália, França e Espanha.

Segundo a revista, por causa da emergência climática, o risco de transmissão da dengue pelo mosquito aedes aegypti é hoje 11% maior que na última década. O estudo alerta que pessoas de todos os países enfrentam ameaças recordes. Com o aumento da temperatura do planeta, dez dos 15 indicadores que medem as ameaças à saúde apresentaram pioras.

Em 2023, as pessoas foram expostas, em média, a 50 dias a mais de temperaturas perigosas para a saúde. O impacto nos idosos chama atenção. As mortes de pessoas acima dos 65 anos por causa do calor aumentaram, desde 1990, em 167% – muito acima do esperado.

Qualidade do ar interno

Em meio a todos esses problemas, a qualidade do ar interno se tornou questão crucial para a saúde e o bem-estar, pois a má qualidade pode causar problemas respiratórios, alergias, dores de cabeça, fadiga e até doenças cardíacas. Um ar interno de boa qualidade melhora o conforto, a produtividade e a concentração, enquanto o ar poluído contribui para o surgimento de mofo, ácaros, bactérias e vírus.

A boa notícia é que muitas empresas já se deram conta disso e estão adotando técnicas de limpeza de dutos de ar condicionado, tecnologias modernas para purificação desses ambientes e utilizando até sistemas de sensoriamento remoto sobre a qualidade do ar, de forma a fazer com que o ar respirado pelas pessoas o trabalho tenha boa qualidade.

“Hoje a qualidade do ar interno é um fator primordial para qualquer empresa, da mesma forma que a eficiência de um equipamento e a eficácia de um projeto”, afirmou a gerente de Facilities da Shell Brasil, Ana Cláudia Machado.

“Investir em ventilação adequada, manutenção dos sistemas de climatização e monitoramento da QAI não é apenas uma questão de conforto — é uma questão
de saúde pública. Precisamos continuar aprendendo e disseminando esse conhecimento. Ambientes saudáveis são fundamentais para que as pessoas possam trabalhar, estudar e descansar com qualidade, e o ar que respiramos é peça-chave nessa equação”, destacou também a gerente de Facilities da Lenovo, Marúsia Feitosa.

Colaboração da Abrava

A Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), principal entidade representativa do setor no Brasil, tem colaborado de perto com a resolução dos problemas. A entidade divulgou um documento manifestando sua posição e apoio institucional total à COP 30. E apresentou sugestões de contribuições do setor produtivo à consolidação da chamada Agenda de Ação da Conferência, com base em ações concretas para reduzir o aquecimento do planeta.

Com papel ativo em discussões sobre eficiência energética, qualidade do ar de interiores e regulamentações do setor, a entidade afirma, no documento, que reconhece o Protocolo de Montreal como “o tratado ambiental multilateral mais eficaz já firmado, cujos avanços na proteção da camada de ozônio e redução de gases de efeito estufa seguem, também, relevantes para as metas do Acordo de Paris”.

Dentre as propostas apresentadas como contribuições do setor para a agenda climática, a Abrava destaca a elaboração e implementação de um Plano Nacional de Resfriamento do planeta e o fortalecimento dos códigos nacionais de energia (uma vez que a climatização responde por grande parte do consumo energético em edificações).

Além disso, a entidade pretende trabalhar para redução de emissões de gases de efeito estufa em 68% até 2050, aumento da eficiência de novos equipamentos em 50% até 2030, no fortalecimento das políticas e orientações de compras públicas, para que sejam feitas de forma mais sustentável, e ampliação de investimentos e parcerias para pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias de climatização, dentre outras questões.

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