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‘Clima de desespero’: humoristas imigrantes satirizam a repressão de Trump

Criado por Lucie Pohl, o espetáculo reúne comediantes estrangeiros em Nova York para transformar vivências de imigração, choque cultural e incertezas sob o governo Trump em riso e identificação

Redação Jornal de Brasília

14/11/2025 17h29

Foto: KENA BETANCUR / AFP

Foto: KENA BETANCUR / AFP

“Há outros imigrantes ou já nos livramos de todos?”, pergunta a comediante Lucie Pohl, arrancando gargalhadas do público no início de “Immigrant Jam Comedy”, um espetáculo de stand-up em um clube nova-iorquino onde todos os humoristas são de origem estrangeira.

O endurecimento da política migratória dos Estados Unidos e as deportações em massa do segundo mandato de Donald Trump estão na mente de todos.

Pohl, nascido na Alemanha e criado em Nova York, decidiu criar o espetáculo há mais de oito anos, quando o magnata republicano ocupava a Casa Branca pela primeira vez.

“Eu me senti triste e um pouco assustada porque ainda não tinha me tornado cidadã”, contou à AFP essa atriz de trinta e poucos anos, que chegou aos Estados Unidos aos oito anos e se naturalizou em 2021.

“E então me ocorreu criar um espaço em homenagem aos imigrantes, algo que fosse alegre, sem medo”, acrescenta.

Uma colombiana, um argentino, um búlgaro e um israelense estavam entre o público liberado de uma sexta-feira à noite no Caveat, uma pequena sala no Lower East Side de Manhattan.

“O que eles dizem sobre suas experiências nos Estados Unidos se parece com o que eu vivi”, explica Martin Calles, que chegou da Argentina há 35 anos.

“Já vi muito stand-up e este espetáculo é o que mais me representa”, diz, e aponta que muitos humoristas americanos falam de coisas com as quais ele não se identifica.

– “Revigorante” –

A colombiana Carolina Ravassa, espectadora assidua, aprecia um pouco de humor em meio às contribuições causadas pelas batidas e deportações: “É um pouco duro e cansativo, então assistir isso é realmente revigorante”.

Procurada por Pohl nas redes sociais, Lakshmi Kopparam, de origem indiana, rapidamente se tornou uma figura de destaque no elenco do “Immigrant Jam”, que é diferente a cada noite, embora alguns artistas retornem regularmente.

Visto, permissão de residência, naturalização, diferenças culturais, integração, cada um fala de sua experiência sem nunca abandonar o humor.

“Grande parte do meu material já tem esse conteúdo, então nem precisoi inventar”, afirma Kopparam, que durante o dia trabalha como engenheiro de software na Amazon.

Pohl esclarece que a instrução não é falar sobre imigração. “Muitos o fazem, mas acho que não é consciente”, diz.

Ela também reconheceu que a segunda presidência de Trump deixou o volume do espetáculo mais pesado.

“O governo tomou medidas tão extremas contra os imigrantes que sinto que há mais senso de urgência e ameaça”, observa. Há “mais clima de desespero, então talvez o material tenha se tornado mais sombrio”.

– Nem vaias nem hostilidade –

No coração da cosmopolita Big Apple, que acaba de eleger um prefeito muçulmano, Pohl não se lembra de ter recebido vaias ou hostilidade.

“É claramente um lugar onde você se sente seguro”, concorda Bianca Cristovão, nascida na República Tcheca e que, muitas vezes, quando se apresenta em outros lugares, é “a único imigrante”.

“Tenho a impressão de que as pessoas entendem um pouco melhor minha história”, diz, e “também que posso me permitir ir um pouco mais longe ao criticar os Estados Unidos”.

Quando um espectador alemão conta a Pohl que acabou de se mudar para os Estados Unidos, um comediante responde rapidamente: “Por quê? Para ver como vivem as pessoas pobres sem plano de saúde?”

As críticas aos americanos nunca são prejudiciais. No entanto, surge a questão de se esse humor funcionaria em outros lugares do país, actualmente muito polarizado. “Talvez não nos estados republicanos”, sugere Ravassa.

Cristovão, que recentemente se tornou cidadão dos Estados Unidos, acredita que abordar esses temas diante de um público mais amplo poderia ter virtudes pedagógicas.

“Muitos americanos não sabem exatamente como alguém se torna americano”, afirma. “É um processo longo e difícil e acho importante conscientizar sobre isso.”

AFP

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