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Economia

INSS repassou quase R$ 400 milhões em três anos a investigada em CPI

Documento indica transações atípicas da Ambec, investigada por descontos irregulares em benefícios previdenciários, e ligações com empresários presos por envolvimento no esquema

Redação Jornal de Brasília

08/10/2025 12h24

Foto: Carlos Moura/Agência Senado

Foto: Carlos Moura/Agência Senado

CAIO SPECHOTO E THAÍSA OLIVEIRA
FOLHAPRESS

A Ambec (Associação de Aposentados Mutualista para Benefícios Coletivos) recebeu R$ 394,5 milhões de repasses do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) entre 2023 e abril deste ano, de acordo com relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

O documento, obtido pela reportagem, levanta suspeitas sobre o volume das transações e aponta movimentações com indícios de atipicidade.

O levantamento do Coaf mostra que a entidade, uma das principais investigadas no caso dos descontos irregulares em aposentadorias do INSS, fez transações milionárias para contas da própria titularidade. Também indica transferências para empresas ligadas a Maurício Camisotti, apontado como possível beneficiário do esquema de desvios.

A reportagem procurou a Ambec por telefone e por e-mail ao longo de terça-feira (7), mas não foi respondida. A defesa de Camisotti negou irregularidades.

A Ambec passou a ser nacionalmente conhecida neste ano, depois da operação da Polícia Federal e da CGU (Controladoria-Geral da União), em abril, contra entidades e empresas que teriam se beneficiado de descontos irregulares em benefícios previdenciários.

As entidades tinham acordos com a Previdência para fazer descontos diretamente em benefícios, desde que autorizados pelos beneficiários, normalmente em troca de algum serviço. Os descontos, porém, estariam sendo realizados sem a anuência dos aposentados e pensionistas.

O relatório elaborado pela PF na época da operação aponta a Ambec como a entidade que mais cresceu, proporcionalmente, no volume de descontos de 2021 para 2022. “Estrondosos 11.092.533% [de aumento], passando de R$ 135 arrecadados em 2021, para R$ 14.975.055 em 2022”, afirma o texto.
O período analisado é anterior ao coberto pelo relatório do Coaf obtido pela reportagem, mas o documento da PF afirma que houve novo aumento nos anos seguintes.

O relatório do Coaf obtido pela reportagem mostra que a Ambec recebeu R$ 242,4 milhões do Fundo do Regime Geral de Previdência Social entre dezembro de 2023 e setembro de 2024, R$ 23,4 milhões entre setembro e novembro de 2024 e R$ 128,7 milhões entre novembro de 2024 e abril de 2025. O crédito de R$ 23,4 milhões foi em um único depósito.

O principal destino do dinheiro vindo do INSS, recebido pela Ambec em uma conta no Bradesco, foi outra conta da própria entidade no Itaú. Entre agosto de 2023 a abril de 2024, por exemplo, essa segunda conta recebeu R$ 112,9 milhões da primeira. Entre janeiro e junho de 2025, foram R$ 82,6 milhões em transações com essa origem e esse destino.

Em um trecho do relatório, o Coaf afirma que “o faturamento não ampara a movimentação” de recursos.
“Chama atenção a movimentação financeira apresentar-se incompatível com a capacidade financeira da cliente, considerando faturamento e o volume transacionado a crédito no período analisado, o que pode indicar que cliente tenha parte de sua renda na informalidade e/ou recursos transacionados sejam provenientes de atividade não declarada, além da possibilidade de favorecimento tributário/ocultação fiscal”, escreveu o órgão.

Em outra parte do documento, o Coaf aponta “existência de contas que apresentem créditos e débitos com a utilização de instrumentos de transferência de recursos não característicos para a ocupação ou o ramo de atividade desenvolvida pelo cliente”.

Parte das empresas que mais receberam da Ambec tem alguma ligação com Maurício Camisotti, segundo o relatório da PF. No documento, ele é mencionado como possível beneficiário final do esquema de descontos irregulares e como alguém que tinha influência sobre a entidade.

Os relatórios do Coaf analisados pela reportagem apontam para R$ 59,9 milhões pagos à Rede Mais Saúde, administrada pelo filho de Camisotti, Paulo Otávio Montalvão Camisotti. Também há R$ 16,1 milhões repassados à Prospect Consultoria Empresarial, de Antonio Carlos Camilo Antunes.

Antunes é apontado pelos investigadores como operador do esquema de descontos irregulares. Ele ficou conhecido como “Careca do INSS” e se tornou um dos nomes mais famosos do escândalo.

O investigado prestou depoimento à CPI no fim de setembro e negou irregularidades. “A Prospect sempre pautou sua atuação dentro dos limites da legalidade”, disse ele.

Camisotti disse, por meio de sua defesa, sua empresa prestou serviços administrativos e tecnológicos para a Ambec, sem participar das captação ou gerenciamento dos associados. “O empresário reforça que nunca obteve qualquer vantagem indevida, o que será provado por sua defesa”, afirmou a defesa em nota.

A Rede Mais Saúde afirmou, por meio de nota, que os recursos recebidos foram em troca de prestações de serviços, “tais como descontos em consultas e exames, telemedicina e outros serviços de saúde”.

Também disse que cancelou os contratos com a Ambec depois da operação da Polícia Federal.

Tanto Antunes quanto Camisotti estão presos desde 12 de setembro. A Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) validou a prisão, decretada sob o argumento de que os dois tentavam frustrar as investigações sobre os descontos em benefícios previdenciários.

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