Funcionários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) se reúnem amanhã em assembleias pelo País para discutir uma possível greve de servidores, o que poderia prejudicar o andamento de pesquisas e agravar ainda mais a crise institucional que o instituto atravessa. O movimento é comandado pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Fundações Públicas Federais de Geografia e Estatísticas (ASSIBGE), que contesta a suspensão das próximas divulgações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua).
Segundo a direção do sindicato, os servidores defendem a autonomia técnica do órgão e mais democracia nas decisões internas. Também integram a pauta de discussões de amanhã as reivindicações dos servidores por melhores salários, realização de concursos públicos e o fim da substituição do quadro permanente por trabalhadores terceirizados e mal remunerados.
“Haverá assembleias em distintas partes do País”, afirmou Ana Magni, uma das diretoras da ASSIBGE. No Rio, a reunião está marcada para 13h, na filial da Avenida Chile, no Centro da cidade. Em nota, o sindicato afirma que as assembleias “devem apontar para uma paralisação ou mesmo a possibilidade de a categoria entrar em greve”.
Em 2012, uma greve de servidores do IBGE prejudicou por alguns meses a divulgação da taxa de desemprego para as seis principais regiões metropolitanas do País, apurada pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME). A apuração dos dados de Salvador e Rio de Janeiro não foi realizada a tempo de cumprir o calendário de divulgação da pesquisa, por conta da paralisação dos trabalhos dos funcionários.
A atual crise institucional começou no último dia 10 de abril, após a presidente do IBGE, Wasmália Bivar, anunciar a suspensão da divulgação da Pnad Contínua até 6 de janeiro, para que os técnicos pudessem revisar e adequar as informações sobre a renda domiciliar per capita às exigências previstas na Lei Complementar nº 143/2013. A lei determina que o indicador sirva como base para o cálculo do rateio do Fundo de Participações dos Estados (FPE). A medida foi motivada por questionamentos feitos no início de abril pelos senadores Gleisi Hoffmann (PT-PR) – ex-ministra da Casa Civil – e Armando Monteiro (PTB-PE), o que gerou suspeita de ingerência do governo no órgão.
No último dia 16, funcionários do IBGE já fizeram uma paralisação nacional para protestar contra a suspensão da Pnad Contínua e ingerências externas no órgão. No Rio, um protesto teve a adesão de cerca de 350 funcionários. O Sindicato disse que houve interrupção dos trabalhos também nas filiais de Manaus, Maceió, Recife, São Paulo, Vitória, Belo Horizonte, Curitiba, Mato Grosso do Sul, Florianópolis e Porto Alegre.
A direção do órgão admitiu reavaliar a decisão de adiar a divulgação da Pnad Contínua com base no parecer de um corpo técnico. O adiamento da próxima divulgação, prevista para 3 de junho, fez duas de oito integrantes do Conselho Diretor do instituto pedirem exoneração: a diretora de Pesquisas, Marcia Quintslr, e a coordenadora-geral da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), Denise Britz do Nascimento Silva. Dezoito coordenadores ameaçaram também entregar seus cargos, e 45 técnicos divulgaram uma carta de repúdio à medida.
A rebelião foi contornada com a promessa da direção de ouvir os técnicos da casa antes de determinar se a pesquisa está realmente suspensa até janeiro. Segundo o coordenador de Trabalho e Rendimento do instituto, Cimar Azeredo, responsável pela Pnad Contínua, os técnicos correm contra o tempo para concluir um parecer à direção que mostre a viabilidade de manter o calendário de divulgação sem prejudicar os trabalhos de aperfeiçoamento da apuração da renda domiciliar per capita.
“Já foi ventilado por esses grupos que estão trabalhando, e principalmente pela equipe que desenvolve o trabalho de apuração da Pnad Contínua, que o processo de apuração e divulgação da pesquisa não vai atrapalhar nesse processo de estudo para poder atender ao FPE”, assegurou Azeredo na semana passada.
Duas associações de pesquisa e estatística divulgaram nota manifestando preocupação com a suspensão da Pnad Contínua até 2015. Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP), o projeto faz parte do plano estratégico do IBGE e seus dados contribuem para o trabalho desenvolvido pelos institutos de pesquisa e outras organizações públicas e privadas.
“Diante dessa nova realidade, a interrupção da divulgação das informações contínuas provoca apreensão no mercado de pesquisa. No entanto, a ABEP apoia o IBGE e espera que a entidade encontre uma solução que atenda às necessidades de informações esperadas pelos atuais usuários, bem como as novas e importantes demandas surgidas recentemente”, declarou a entidade, em nota.
Já a Associação Brasileira de Estatística (ABE) foi mais dura em carta aberta divulgada na semana passada, em que manifesta “sua reprovação a qualquer ingerência externa em questões eminentemente técnicas e de metodologias desenvolvidas” pelo instituto. “A autonomia e independência de institutos de estatística como o IBGE são condições essenciais para sua credibilidade, e esta por sua vez, é essencial para que cumpram plenamente sua função de retratar com fidelidade a realidade do país”, ressaltou a ABE.