São Paulo, 31 – O dólar rondou a estabilidade ao longo da tarde e encerrou a sessão desta sexta-feira, 31, cotado a R$ 5,3803 (-0,02%), apesar do sinal predominante de alta da moeda norte-americana no exterior, em meio a ajustes das apostas em torno do afrouxamento monetário nos Estados Unidos após falas cautelosas de dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano).
Operadores ressaltam que a formação da taxa de câmbio nesta sexta esteve ligada em grande parte a fatores técnicos, como a disputa pela formação da taxa ptax de outubro, na primeira etapa de negócios, e a rolagem de posições no segmento futuro. Eventual fluxo para ativos locais, em especial para o Ibovespa, pode ter dado fôlego ao real.
Apesar da queda de 0,23% na semana, o dólar termina outubro com ganhos de 1,08%, após recuo de 1,83% em setembro. No ano, a moeda acumula perdas de 12,94% em relação ao real, que apresenta o melhor desempenho entre as divisas latino-americanas em 2025.
Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY subia cerca de 0,25% no fim da tarde, ao redor dos 99,780 pontos. O Dollar Index avançou 0,85% na semana e 2% no mês. No ano, apresenta ainda queda ao redor de 8%.
O economista sênior do Inter, André Valério, lembra que o real se fortaleceu no início da semana, com um cenário externo favorável para ativos de risco, com menor tensão comercial, e teve desempenho superior a de pares emergentes. Na segunda-feira, o BC realizou operação casada, com venda de US$ 1 bilhão em leilão à vista e colocação de US$ 1 bilhão de swaps cambiais reversos, ampliando a liquidez e amenizando as pressões sobre o cupom cambial (juro em dólar).
“O real devolveu os ganhos com a decisão do Fed na quarta-feira, que sinalizou um tom hawkish mesmo com o corte amplamente esperado de 25 pontos-base”, afirma Valério. “De toda maneira, o carry favorável no Brasil ajudou a conter a depreciação do real ao longo da segunda metade da semana”.
É dado como certo que o Banco Central vai anunciar na próxima semana manutenção da taxa Selic em 15%, em um comunicado desautorizando apostas em redução dos juros ainda neste ano. Analistas ouvidos pelo Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) afirmam que o amplo diferencial de juros interno e externo encarece o carregamento de posições em dólar e tende a amenizar eventuais pressões sobre o real com o aumento sazonal de remessas ao exterior.
Lá fora, o presidente do Fed de Kansas City, Jeffrey Schmid, fez alertas em relação à inflação e afirmou que vê a política monetária como “apenas moderadamente restritiva”. Schmid votou pela manutenção da taxa básica na última quarta-feira, 29, quando o BC americano anunciou redução dos juros em 25 pontos-base, para a faixa entre 3,75% e 4%.
Presidente do Fed de Atlanta, Raphael Bostic disse que a fala do presidente do BC americano, Jerome Powell, na quarta-feira, de que uma corte de juros em dezembro não é algo garantido, reflete de maneira precisa a visão do comitê de política monetária do Fed (FOMC, na sigla em inglês). Na mesma linha, a presidente do Fed de Cleveland, Beth Hammack, reforçou a fala de Powell de que a trajetória dos juros não está predeterminada e ressaltou que ainda há tempo até o encontro do Fed em dezembro.
“Em meio ao apagão de dados da economia americana devido ao shutdown, o Fed parece querer comprar a opção de não fazer nada na reunião de dezembro, com um comitê bastante dividido entre os que querem cortar e os que preferem pausar”, afirma Valério, do Inter, para quem o BC americano vai promover um novo corte em dezembro apenas se houver dados negativos do mercado de trabalho “No atual estado das coisas, o Fed parece inclinado a pausar, o que levou a uma forte reprecificação de cortes pelo mercado”.
Bolsa
O Ibovespa não apenas sustentou a oitava alta seguida, como renovou recorde histórico intradia e de fechamento aos 149 mil pontos nesta sexta-feira, acumulando avanço superior a 2% no mês de outubro. Há relatos de fluxo estrangeiro, com maior apetite ao risco global após acordo entre Estados Unidos e China, expectativa de corte de juros no Brasil – renovada nesta sexta após a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, mostrar queda na taxa de ocupação -, e, como cereja do bolo, um balanço melhor do que o esperado da Vale, ação com maior peso do índice.
Aos 149.540,43 pontos (+0,51%), o recorde de fechamento é o quinto consecutivo. O giro financeiro somou R$ 23,77 bilhões. Na semana, o Ibovespa avançou 2,30%, com ganhos de 2,26% em outubro e de 24,32% no ano.
Os sucessivos recordes do Ibovespa ocorrem por conta da entrada de fluxo estrangeiro para a Bolsa brasileira, segundo o gestor de renda variável da Western Asset, César Mikail. Houve uma reversão de tendência, com maior apetite a risco global, por dois fatores: “O mais relevante no curto prazo foi o acordo de Trump com Xi Jinping, que deu alento aos mercados no mundo todo. O segundo ponto é que os resultados das empresas lá fora estão vindo fortes, mostrando a economia americana resiliente”, diz.
Ainda que os investidores estrangeiros tenham retirado R$ 1,3 bilhão da Bolsa brasileira em outubro até a última quarta-feira, 29, o saldo dos últimos cinco pregões é de entrada de recursos. No ano, o fluxo de capital externo está positivo em R$ 25 bilhões.
O diretor de Análise na Zero Markets Brasil, Marcos Praça, considera que o ponto principal desta sexta-feira foi o balanço da Vale (+2,27%), divulgado na quinta. “Vale é a cereja do bolo na performance do Ibovespa. Lembrando que toda a receita extra veio pela venda de minério de ferro, geralmente vendido para a China. Se mesmo com a China tendo PIB fraco, a Vale conseguiu surfar bem na venda de minério de ferro, imagina agora com o acordo com os EUA? A expectativa é de que ano que vem o resultado seja ainda melhor”, disse Praça.
A máxima intradia – recorde histórico – do Ibovespa, aos 149 635,9 (+0,58%) veio à tarde, instantes após notícia de que Trump disse que “adoraria eliminar” uma tarifa adicional de 10% sobre produtos chineses, caso Pequim demonstre avanços no combate ao fentanil.
No cenário doméstico, um gatilho importante para a renda variável é o início do ciclo de flexibilização monetária pelo Banco Central (BC) – com a curva de juros nesta sexta em baixa, reagindo à Pnad Contínua do trimestre encerrado em setembro com taxa de ocupação recuando pelo segundo mês consecutivo.
Juros
Embalados pela inversão de sinal do dólar, que passou a operar em queda no meio da tarde, e sustentados por dados mais fracos do que o esperado do mercado de trabalho doméstico, os juros futuros negociados na B3 aceleraram o recuo na segunda etapa do pregão desta sexta-feira, 31.
Após o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) de setembro, divulgado ontem, ter colocado em xeque a esperada desaceleração dos fundamentos do emprego, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua indicou taxa de desocupação levemente acima do previsto e reforçou a possibilidade de um corte da Selic em janeiro.
O mercado também pode ter ajustado posições após três dias seguidos de estresse dos DIs, e no aguardo da reunião da próxima semana do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central. É consenso que a taxa básica ficará nos atuais 15% até dezembro, mas o próximo comunicado pode trazer mais pistas sobre quando será o momento de virada da política monetária.
Encerrados os negócios, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 cedeu de 13,926% no ajuste de quinta-feira, 30, para 13,845%. O DI para janeiro de 2029 recuou de 13,205% no ajuste de ontem a 13,075%. O DI para janeiro de 2031 marcou 13,36%, vindo de 13,48% no ajuste antecedente.
Publicada nesta sexta pelo IBGE, a taxa de desemprego medida pela Pnad Contínua ficou em 5,6% no trimestre móvel terminado em setembro, estável em relação aos três meses terminados em agosto e ainda na mínima histórica do levantamento. O dado, no entanto, ficou 0,1 ponto acima da mediana do Projeções Broadcast, de 5,5%. Economistas ainda avaliam que o mercado de trabalho está aquecido, mas caminha para descompressão mais expressiva à frente.
“A taxa de desemprego acima do previsto trouxe um respiro para o mercado, no sentido inverso do Caged”, diz Felipe Tavares, economista-chefe da BGC Liquidez. “Os agentes estão preocupados sobre quando haverá corte, com o BC ainda em posição muito ortodoxa e falando que só vai se movimentar quando as expectativas inflacionárias estiverem na meta. Nesse sentido, a Pnad foi um primeiro sinal positivo na perspectiva de política monetária”, comentou.
Economista-chefe da Mirae Asset, Marianna Costa afirma que, além da Pnad, a dinâmica contida dos rendimentos dos Treasuries e a melhora do comportamento do câmbio ao longo da tarde também podem ter ajudado a aliviar as taxas futuras na sessão de hoje. “Os Treasuries cederam um pouco e aqui temos o câmbio para baixo depois da formação da Ptax”, disse.
Com as atenções voltadas ao mercado de trabalho, o déficit primário de R$ 17,452 bilhões do setor público consolidado em setembro, publicado nesta sexta-feira pelo BC, ficou em segundo plano. A pesquisa do Projeções Broadcast apontava resultado negativo um pouco menor, de R$ 17,3 bilhões. “O fiscal está fazendo muito pouco preço”, nota Tavares, da BGC Liquidez.
No cômputo semanal, apesar do alívio observado hoje na curva, houve deslocamento para cima em todos os principais vértices e ganho de inclinação, com abertura de cerca de 4 pontos-base da taxa para janeiro de 2027, de cerca de 5 pontos-base no DI de janeiro de 2029 e de cerca de 6 pontos-base no vértice de janeiro de 2031, considerando os níveis de fechamento da última sexta-feira.
Segundo a equipe econômica do Santander, a maioria dos vencimentos acabou sofrendo por conta da sinalização mais dura do Federal Reserve (Fed). Em discurso visto como conservador esta semana, o presidente Jerome Powell sinalizou que o plano de voo para dezembro está em aberto e reduziu apostas de flexibilização adicional da política monetária nos EUA. Do lado doméstico, apontam os economistas do banco, o mercado segue ponderando os riscos de desaceleração mais intensa do que o antecipado para a economia brasileira após os números de mercado de trabalho conhecidos nesta semana.
Estadão Conteúdo