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Economia

Dólar dispara, mas economistas desaconselham intervenção do BC; veja motivos

A forte alta da moeda americana ocorre em meio a preocupações sobre o cenário fiscal no Brasil e a ruídos entre Lula e Campos Neto

Redação Jornal de Brasília

01/07/2024 6h31

Foto: banco de imagens

FOLHAPRESS

Economistas consultados pela Folha desaconselham uma intervenção pontual do Banco Central no câmbio para conter o dólar, que vive disparada e fechou a sexta-feira (28) cotado a R$ 5,59, maior valor nominal desde janeiro de 2022.

A forte alta da moeda americana ocorre em meio a preocupações sobre o cenário fiscal no Brasil e a ruídos entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o comando da instituição. No ano, a moeda americana registra alta de mais de 15% ante o real, sendo 6,48% só em junho.

Apesar disso, a autarquia não deveria fazer qualquer tipo de intervenção extraordinária no mercado, de acordo com a maioria dos economistas consultados. Para eles, a alta do dólar está mais relacionada à confiança na política fiscal do país. “Não acho que a bola esteja com o BC”, diz Zeina Latif, sócia-diretora da Gibraltar Consulting.

“Ainda que tenha o fator externo levando à valorização do dólar no mundo, aqui o movimento tem sido mais intenso, estando associado às incertezas em relação à política econômica”, afirma.

No regime de taxa de câmbio flutuante, em tese, a instituição intervém somente para garantir o funcionamento adequado desse mercado, com ações voltadas a conter eventuais movimentos desordenados, evitar restrições de liquidez e assegurar o provimento de mecanismos de proteção.

Em entrevista coletiva na quarta-feira (26), o presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse que a autoridade monetária opera sob o princípio de separação, atuando via política monetária e medidas macroprudenciais, mas deixando o câmbio livre.

Ele afirmou, ainda, que a desvalorização do real está em linha com algumas outras variáveis que também simbolizam o aumento do risco Brasil. “O objetivo do Banco Central é que o câmbio flutuante sirva como um fator que absorva os choques”, afirmou Campos Neto.

Na sexta, o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, se disse atento ao nível do dólar, mas não indicou intervenção, e reforçou que a instituição não trabalha com uma meta de câmbio.

“A gente vai estar sempre olhando se há algum tipo de descolamento muito fora daquilo que está acontecendo com os nossos pares e o restante do mercado global, se existem algumas janelas ou questão de disfuncionalidade na curva ou na própria liquidez”, disse.

Em 2023, o BC não realizou leilões extras de dólar —o que caracterizou a menor intervenção da autoridade monetária desde a adoção do regime de câmbio flutuante no país, em 1999. Neste ano, em abril, o Banco Central vendeu 20 mil contratos de swap cambial ofertados em leilão adicional —o equivalente a US$ 1 bilhão.

“Se o BC tentar segurar o dólar seria um movimento, a meu ver, errado, porque juros e taxa de câmbio estão refletindo um cenário de maior risco fiscal”, afirma o ex-secretário do Tesouro Nacional Mansueto Almeida.

Veja, a seguir, a opinião de alguns analistas consultados.

Henrique Meirelles

  • Ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central

Penso que o Banco Central está certo em não intervir no câmbio. Não estamos em crise econômica. O mercado está precificando baseado nas expectativas e riscos percebidos. Intervenção neste momento seria um uso inadequado das reservas.

Arminio Fraga

  • Ex-presidente do Banco Central do Brasil (1999 a 2002) e sócio-fundador da gestora Gávea Investimentos

Não. Intervenções tendem a ser ineficazes se a origem do problema não for atacada. No caso, a falta de convicção na responsabilidade fiscal. E mais, em uma situação mais simples, devem ocorrer em conjunto com algum aperto de juros. Exceção feita a um caso de iliquidez extrema no mercado, o que não acontece agora.

Alexandre Schwartsman

  • Ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC de 2003 a 2006 e consultor da A.C. Pastore

O Banco Central pode intervir? Até pode, só não vai ter muito efeito. Ele vai oferecer, as pessoas vão tomar esse dinheiro e vão pedir mais. Então, como política, seria um tiro no pé tentar vender dólar a essa altura do campeonato. O único caso em que a gente teve intervenção sistemática, tentando segurar o dólar, foi no caso do [presidente do BC de 2011 a 2016, Alexandre] Tombini. E, vamos falar a verdade, não foi um negócio que funcionou muito bem. Gerou um prejuízo gigantesco para o Banco Central e não segurou o dólar, porque não estavam sendo trabalhados os problemas de fundamento.

Mansueto Almeida

  • Economista-chefe do BTG Pactual e ex-secretário do Tesouro Nacional

Nem sempre é fácil afirmar que o BC deve ou não intervir no mercado cambial. No caso do Brasil, uma parte considerável da desvalorização do real no ano, em especial nos últimos 30 dias, reflete muito mais uma percepção crescente de que o governo não vai cortar despesas e, assim, vai mudar o teto de 2,5% para o crescimento do gasto público federal. Se escutássemos da ala política do governo alguma sinalização, seguida de medidas que mostrassem o compromisso do governo com o respeito ao teto, talvez tivéssemos um forte recuo do dólar. Mas com todo esse ambiente de incerteza fiscal que está se materializando, se o BC tentar segurar o dólar seria um movimento a meu ver errado, porque juros e taxa de câmbio estão refletindo um cenário de maior risco fiscal.

José Roberto Mendonça de Barros

  • Ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e consultor da MB Associados

Eu não recomendo uma intervenção do BC. No meu entender, estamos vivendo uma overshooting [desvalorização elevada da moeda no curto prazo], porque o dólar a R$ 5,60, R$ 5,50 não dialoga com o fundamento da área externa brasileira. O saldo comercial, na nossa projeção, vai a US$ 85 bilhões, US$ 90 bilhões. Por que vai desvalorizar desse jeito? A perspectiva lá de fora, eu acho que é de juros onde está para menos, do dólar frente às moedas também para menos. Não é consistente [a alta]. Essa sucessão de falas do governo, especialmente do presidente Lula, criticando assertivamente o presidente do BC, só fez aumentar a temperatura do que já vinha mal.

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