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Brasil

Salviano de Souza Filho: o técnico por trás da grilagem digital que devasta o Piauí

Denúncias obtidas pelo JBr apontam técnico como peça-chave em um esquema que manipula dados fundiários

Suzano Almeida

31/10/2025 6h05

salviano

O Piauí volta ao centro das atenções com novas denúncias de grilagem de terras envolvendo empresários, magistrados e técnicos credenciados ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). No centro do escândalo está o engenheiro agrônomo Salviano de Souza Filho, apontado por denúncias obtidas pelo Jornal de Brasília como peça-chave em um esquema que manipula dados fundiários para legitimar a apropriação de terras produtivas no Estado.

De acordo com investigações da Polícia Federal, o empresário João Antônio Franciosi, dono do Grupo Franciosi — gigante do agronegócio com mais de 80 mil hectares de lavouras no Matopiba — é acusado de pagar R$ 26 milhões em propina ao desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí (TJPI) José James Gomes Pereira. O objetivo: obter uma decisão judicial favorável em uma disputa por uma fazenda de 22,5 mil hectares.

O processo correu sob o Agravo de Instrumento nº 0750602-73.2023.8.18.0000, e, conforme investigação do Jornal de Brasília, o laudo técnico assinado por Salviano de Souza Filho foi a base técnica utilizada para sustentar o pedido de imissão de posse em favor da empresa Sundeck Holding Ltda, que posteriormente transferiu o imóvel ao grupo Franciosi.

O documento elaborado por Salviano teria reescrito os limites da propriedade, invalidando o georreferenciamento anterior e criando um novo perímetro com titularidade alterada, em prejuízo aos legítimos donos.

A engrenagem da “grilagem digital”

A prática, batizada por especialistas de “grilagem digital”, utiliza brechas no Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF), plataforma mantida pelo Incra para centralizar dados de imóveis rurais. O sistema, que deveria garantir transparência e segurança jurídica, vem sendo manipulado por profissionais credenciados para alterar registros legítimos.

Segundo denúncia da Aprosoja-PI publicada pela Revista Veja em Maio de 2024, técnicos com acesso ao SIGEF têm usado documentos falsos ou de origem duvidosa para alterar coordenadas e registros de imóveis, substituindo nomes de proprietários e redefinindo áreas inteiras. Na prática, é um roubo de terras feito com cliques.

O esquema opera em várias etapas: o agrimensor – como Salviano de Souza Filho – insere novas coordenadas geográficas no sistema, substitui os dados do titular original e envia o material ao Incra para certificação. Uma vez validado, o registro se torna aparentemente legítimo, embora tenha origem fraudulenta. Com isso, grileiros obtêm respaldo documental para requerer posse, vender ou até judicializar a propriedade.

Em outro episódio investigado, Salviano teria tentado anular o registro da Fazenda Coohabex, inserido corretamente pelos proprietários originais. A beneficiada pela alteração seria a empresária Karina Carvalho de Almendra Freitas Mendes, herdeira de Almiralice de Carvalho Freitas, cuja ligação com o engenheiro é alvo de apuração.

Os documentos obtidos pela reportagem indicam que Salviano utilizava sua credencial no Incra-PI para validar novos limites territoriais, suprimindo registros anteriores e beneficiando grupos econômicos e figuras influentes no Estado.

Um sistema sem fiscalização

A fragilidade da fiscalização do Incra permite que fraudes como essa prosperem. Técnicos responsáveis por georreferenciamento têm autonomia para cadastrar e alterar dados, e, na ausência de auditoria eficaz, as mudanças passam despercebidas até que surjam conflitos judiciais ou denúncias.

Essas práticas criam insegurança jurídica e alimentam esquemas de extorsão e lavagem de dinheiro, ao mesmo tempo em que ameaçam produtores que ocupam legalmente as terras há décadas.

Procurado pelo Jornal de Brasília, Salviano negou qualquer envolvimento em irregularidades. Segundo ele, as acusações são parte de uma campanha difamatória orquestrada por pessoas já investigadas por dossiês falsos.

A reportagem não conseguiu contato com Karina Carvalho de Almendra Freitas Mendes. O espaço permanece aberto para eventuais manifestações.

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