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Brasil

Religiões de matriz africana aindas sofrem preconceito no Brasil

Umbanda e candomblé são os principais alvos; mais de 2.400 denúncias de casos de intolerância religiosa foram registradas em 2024

Agência UniCeub

19/11/2025 10h47

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por Luís Romilson e Paulo Renato

Mais de 3853 denúncias de casos de intolerância religiosa foram registradas em 2024, segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Crença de 1% da população brasileira, as religiões umbanda e candomblé representaram o maior número de violações, com 234 e 214 denúncias respectivamente, seguidos pela religião evangélica com 111 denúncias. 

A situação no Distrito Federal acompanha o preconceito espalhado pelo país. Segundo dados de 2024 da Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF), do total de 42 ocorrências de intolerância religiosa registrados na capital brasileira, 20 foram contra religiões africanas, aproximadamente 47,62%. 

Para reforçar o combate a discriminação religiosa o governo do Distrito Federal sancionou em 2023 a lei distrital n°7226, que prevê a capacitação dos servidores e prestadores de serviços públicos, campanhas e multas. 

O advogado Aristóteles Talaguibonan, membro da comissão de liberdade religiosa da OAB-DF e pai de santo, conta que foi vítima de intolerância institucional por um policial ao realizar uma prática religiosa. O caso aconteceu em 2024.

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Foto: Aristóteles Talaguibonan

O advogado estava com o pai indo depositar uma oferenda próximo a uma rodovia em Ceilândia, quando foi abordado por um policial militar do batalhão ambiental, que perguntou o que ele estava fazendo ali. Ao responder que estava deixando uma oferenda e apresentar a carteirinha da OAB, o oficial falou: “Poxa, um advogado, hein? Aí tem que saber da lei mesmo. Vou levar um TCO (Termo Circunstanciado de Ocorrência) contra você por estar botando lixo na beira rodovia.”

Talaguibonan ficou sem entender e até um pouco surpreso com a situação porque, aos  44 anos, ele nunca tinha passado por isso. Quando o policial começou a anotar a infração, o advogado afirmou que não iria assinar o termo e que o oficial estava impedindo o direito de liberdade religiosa. Após isso o guarda o liberou.

Para o líder religioso a ação do policial não foi para registrar uma infração, foi para coagir e impedir a prática religiosa. “Ele não queria lavrar TCO nenhum. Ele começou a cometer intolerância institucional, utilizando da prerrogativa de policial militar para impedir a minha prática religiosa.”

Liberdade pra quem?

Talaguibonan, também diretor jurídico da Federação de Umbanda e Candomblé de Brasília e entorno, diz que é comum o relato de intolerância institucional contra terreiros, que têm seus cultos interrompidos pela polícia por causa do barulho. Para ele essas ocorrências acabam beneficiando e fortalecendo aqueles que não aceitam as religiões de matriz africana. 

“Não que a polícia encerre a atividade religiosa, mas gera um constrangimento. O líder religioso no meio do culto tem que parar e ir até o portão para dar satisfação à polícia sobre o que está fazendo. Isso acaba fazendo com que aqueles que não aceitam as religiões de matriz africana, acabam sendo favorecidos, porque eles sabem como perseguir uma casa de culto religioso, basta ligar para a polícia”, detalha o advogado.

Filho de pais candomblecistas, ele sempre esteve acompanhado por suas guias (colares sagrados das religiões umbanda e candomblé), o que foi motivo para ser levado à diretoria e apelidado pelos colegas de “macumbeiro”.  “Na escola, eu fui levado para a direção e meus pais foram chamados para justificar o motivo pelo qual eu estava com as guias.” lembra o advogado.

Durante a graduação no curso de direito, um professor o perguntou porque se vestia de branco todas as sextas-feiras. Ao responder que ele era praticante do candomblé e era um costume da religião, o professor teria respondido: “Como pode? Você, quase um advogado, praticando essa religião de pobre”. Ao contar a história ele diz que o comentário o deixou perplexo. “Isso vindo de um professor. Imagina um leigo”. 

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Foto: Aristóteles Talaguibonan


Enfrentando o preconceito

O terreiro de umbanda Fraternidade Socorrista Mãe Iemanjá e Vovó Joaquina, localizada no Park Way, realiza ações sociais para apresentar a religião umbanda, e assim diminuir o preconceito. “A fraternidade possui ações para combater a intolerância e fortalecer a diversidade religiosa, como a apresentação de toques (tambores) e cantos de umbanda em ações sociais, visando promover a religião e reduzir o preconceito”, explica Flávia Montenegro, dirigente da fraternidade.

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Campanha social de distribuição de agasalhos para a população de rua em Taguatinga, promovida pela fraternidade.  Foto: Divulgação

Apesar de todo o preconceito, racismo e intolerância, as religiões de matriz africana continuam a sobreviver e a crescer com o passar dos anos. De acordo com o censo divulgado em 2022 pelo IBGE, o número de praticantes de religiões Umbanda e Candomblé cresceu de 0,3% para 1% da população brasileira entre 2010 e 2022.


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