O pagamento de salários acima do teto constitucional a juízes no Brasil alcançou R$ 10,5 bilhões em 2024, segundo levantamento do Movimento Pessoas à Frente, elaborado pelo pesquisador Bruno Carazza com base em dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O montante representa um salto de 49% em relação a 2023, quando foram pagos R$ 7 bilhões, e é dez vezes superior à inflação acumulada no período (4,83% pelo IPCA).
O crescimento foi impulsionado pelo uso de verbas indenizatórias, os chamados “penduricalhos”, que são isentas do limite do teto remuneratório e não pagam Imposto de Renda. Essas verbas, embora classificadas como excepcionais, têm sido pagas de forma permanente e generalizada nos tribunais, contrariando o princípio da legalidade e da razoabilidade no serviço público, revelou o Estadão.
A Constituição determina que nenhum servidor público pode ganhar mais que um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), cujo teto foi de R$ 44.008,52 em 2024 e subiu para R$ 46.366,19 em 2025. Ainda assim, os juízes receberam em média R$ 54,9 mil por mês em 2024, com projeção de R$ 66,4 mil em 2025, ultrapassando os ministros do STF desde setembro de 2022.
Segundo o estudo, 93% dos magistrados do país recebem acima do teto, graças a mais de 3 mil tipos diferentes de verbas usadas para inflar os vencimentos. A falta de padronização e transparência nas classificações entre tribunais dificulta o controle social e a fiscalização.
Especialistas apontam privilégio institucionalizado
“O pagamento dos supersalários é muito danoso para o serviço público”, afirma Jessika Moreira, diretora do Movimento Pessoas à Frente. “Esses pagamentos não estão ligados ao desempenho ou à entrega de resultados, mas sim a um sistema de privilégios.”
Eduardo Couto, líder da área de Conhecimento da entidade, explica que verbas indenizatórias deveriam ser pontuais e autorizadas por lei, não por decisões administrativas. “Não se pode pagar mês a mês uma verba que deveria ressarcir uma despesa eventual”, diz.
CNJ tenta conter abusos, mas falhas persistem
Em maio, o CNJ editou uma resolução para proibir a criação e pagamento retroativo de novas verbas indenizatórias por atos administrativos, mas especialistas alertam que a medida é insuficiente. Sem uma lei federal clara e rígida, os penduricalhos seguem proliferando nos contracheques dos magistrados.
Congresso discute limites, mas avança com exceções
O governo federal encaminhou ao Congresso, no ano passado, uma proposta para limitar os supersalários, exigindo que apenas leis complementares pudessem autorizar exceções ao teto. O texto foi flexibilizado pelos parlamentares, permitindo que leis ordinárias definam as verbas que podem ser excluídas do limite.
Enquanto isso, o Ministério da Fazenda estuda uma nova proposta e há outras em tramitação no Senado, algumas das quais criam novas exceções, como pagamento em dobro de adicional de férias e gratificações por acúmulo de ofícios.
Na Câmara, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) lidera um grupo de trabalho que inclui os supersalários na discussão da reforma administrativa. “Qualquer reforma que não enfrente isso vai gerar frustração”, afirmou. O relatório deve ser apresentado até 14 de julho.
As informações são do jornal O Estado de São Paulo