Uma delegação da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), território chinês que tem o português como uma das línguas oficiais, desembarcou em São Paulo para tratar de intercâmbio estudantil e cooperação acadêmica com a Universidade de São Paulo (USP).
A visita, realizada em 10 de outubro no Centro USP-China, foi liderada pela Direcção dos Serviços de Educação e de Desenvolvimento da Juventude (DSEDJ) e contou com representantes de oito instituições de ensino superior de Macau. O encontro teve como objetivo aproximar universidades e centros de pesquisa de Macau da USP e explorar novas formas de colaboração científica e educacional.
Durante a programação, foram apresentadas experiências e relatórios institucionais das universidades de Macau e de unidades da USP, em formato de vídeos e apresentações. Representantes de cada instituição mostraram o funcionamento de seus cursos e compartilharam experiências de jovens universitários de Macau que estudam no Brasil e de brasileiros que passaram por universidades macaenses, com o intuito de promover o intercâmbio cultural e identificar áreas de interesse comum.

O encontro também marcou a assinatura de um acordo entre o Centro USP-China e a Universidade Cidade de Macau (City University of Macau), fortalecendo as relações acadêmicas entre as duas instituições. Além disso, foi formalizado o convênio entre a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP-USP) e o Instituto de Enfermagem Kiang Wu de Macau, ampliando a cooperação na área da saúde e incentivando novas parcerias em pesquisa e formação profissional.
Fortalecimento da cooperação
O sub-diretor da DSEDJ, Teng Sio Hong, destacou, em entrevista ao Jornal de Brasília, a importância da visita da delegação de Macau à USP para o fortalecimento da cooperação acadêmica entre os dois territórios.
“Ficamos muito satisfeitos com esta visita. Acredito que esses acordos irão fortalecer ainda mais a colaboração entre a Universidade de São Paulo e as universidades de Macau em áreas como pesquisa acadêmica, ensino e intercâmbio de estudantes”, afirmou Hong.
O sub-diretor ressaltou que a criação do polo China Center pela USP é um marco que reforça a ponte entre a China e os países de língua portuguesa, especialmente em um ano simbólico que será 2026, o Ano Cultural China-Brasil. Para ele, as ações consolidadas durante a visita devem ampliar os intercâmbios culturais e educacionais entre os dois países.
Os acordos assinados envolvem inicialmente as áreas de enfermagem, economia e comércio, mas o dirigente revelou que novas parcerias poderão surgir em outros campos do conhecimento. Ele mencionou que as discussões durante a visita abriram caminho para programas conjuntos, cursos de dupla diplomação e projetos de pesquisa colaborativa entre estudiosos brasileiros e macaenses.
Para estimular essas iniciativas, a DSEDJ pretende conceder bolsas e subsídios a instituições de ensino superior de Macau, com o objetivo de atrair estudantes brasileiros para intercâmbios de curto e longo prazo. “Esperamos que, após esta visita, mais projetos cooperativos sejam implementados”, afirmou Hong, reforçando que o governo de Macau apoiará financeiramente as universidades locais por meio do Fundo Educativo.
Ao comentar sobre o papel de Macau como plataforma entre a China e os países de língua portuguesa, Teng Sio Hong explicou que a colaboração com o Brasil integra a estratégia de diversificação e internacionalização da educação promovida pelo território. Segundo ele, Macau busca expandir sua influência não apenas no comércio e nos investimentos, mas também na formação de talentos e no intercâmbio acadêmico.
“Macau é uma cidade diversa, inclusiva e internacional, com o português como uma de suas línguas oficiais. Recebemos calorosamente os estudantes dos países de língua portuguesa, e acreditamos que os brasileiros terão facilidade em se adaptar à vida e aos estudos na cidade”, afirmou. Ele acrescentou que estudar em Macau pode abrir novas portas de aprendizado e oportunidades na Ásia, fortalecendo os laços entre o Brasil, a China e o mundo lusófono.
Ao JBr, o vice-reitor de Assuntos Acadêmicos da Universidade de Macau, (University of Macau), Michael Hui King Man, afirmou que a instituição tem entre suas prioridades a internacionalização nos próximos anos.
“A internacionalização é uma das principais estratégias da nossa universidade para os próximos cinco a dez anos. Por isso, damos boas-vindas a estudantes de todas as partes do mundo”, disse.
Segundo ele, Macau se consolida como uma ponte entre a China e os países de língua portuguesa, o que explica o interesse especial em atrair “estudantes brasileiros que desejam estudar ou passar um tempo em Macau”.
Hui King Man explicou ainda que a universidade oferece programas de graduação, pós-graduação e doutorado, além de bolsas e apoio financeiro para intercâmbio ou cursos completos. “Os estudantes brasileiros conseguem viver tranquilamente em Macau sem falar chinês, já que o português é amplamente utilizado na cidade”, completou.
Cooperação no turismo

A Universidade de Turismo de Macau (Macao University of Tourism) negocia um Memorando de Entendimento (MOU) com a Universidade de São Paulo, em uma iniciativa coordenada pela Escola de Comunicações e Artes (ECA-USP) e pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH-USP). Embora o documento ainda não tenha sido assinado durante a visita, o encontro marcou o avanço das tratativas, com a proposta já em fase final de elaboração.
A vice-reitora da Macao University of Tourism, Loi Kim Ieng, destacou ao Jornal de Brasília o progresso das negociações. “Estamos discutindo um acordo com duas faculdades da USP – a ECA e a EACH – por compartilharmos o interesse nas áreas de turismo e hotelaria”, afirmou.
Segundo ela, há a possibilidade de unificar os dois MOUs em um acordo tripartite, prevendo intercâmbio de estudantes e docentes, além de programas de dupla diplomação. “Esperamos atrair mais estudantes brasileiros para Macau e, ao mesmo tempo, enviar nossos alunos para o Brasil, fortalecendo os laços culturais entre os dois territórios”, completou Kim Ieng.
O diretor da EACH-USP, Ricardo Ricci Uvinha, destacou que o convênio em negociação com a Macao University of Tourism terá impacto direto na formação de alunos e pesquisadores da área. “Macau tem uma expertise muito grande em turismo e entretenimento, e essa parceria certamente vai beneficiar nossos estudantes de graduação e pós-graduação, além de fortalecer as pesquisas em lazer e hospitalidade”, afirmou.
O coordenador do Centro USP-China, Ricardo Trindade, explicou que o documento assinado entre a USP e as universidades de Macau “abre espaço para intercâmbio de estudantes e docentes, além de projetos de pesquisa conjuntos”. Segundo ele, o evento reuniu cerca de 30 participantes, entre representantes de Macau e professores da USP.
“Essas instituições que recebemos, estão interessadas em estreitar vínculos com o Brasil, e há editais abertos – como os da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Fundação de Incentivo à Pesquisa de Macau – que já preveem o financiamento dessas iniciativas”, destacou.
A troca acadêmica, no entanto, vai além da pesquisa. O diretor da Faculdade de Gestão da City University of Macau, José Alves, ressaltou a importância da compreensão cultural mútua como base da cooperação. “Não é possível fazer colaboração entre países sem compreender suas culturas. As visitas e os intercâmbios permitem esse entendimento e geram aprendizado com impacto para ambos os lados”, afirmou.
Na mesma linha, o vice-reitor de Investigação e Inovação da Universidade de São José (University of Saint Joseph), João Alexandre Lobo Marques, disse que a integração “planta sementes de projetos que vão beneficiar alunos e fortalecer os laços acadêmicos”. Para ele, o modelo de colaboração liderado pelo Centro USP-China “deve inspirar novas parcerias internacionais, ampliando o diálogo entre Brasil, China e o mundo”.
Autonomia, inovação e programas profissionais
A Região Administrativa Especial de Macau opera sob o princípio “Um País, Dois Sistemas”, que garante elevado grau de autonomia política, econômica e jurídica. O território é reconhecido por sua economia aberta, com livre circulação de capitais e mercadorias e baixa carga tributária – a taxa máxima de imposto sobre lucros é de apenas 12%.
Conforme a Organização Mundial do Comércio (OMC), Macau está entre os sistemas de comércio e investimento mais abertos do mundo. Além das taxas reduzidas, há incentivos fiscais para empresas e profissionais de setores estratégicos, com isenções de impostos sobre propriedade, lucros e veículos automóveis.
A Comissão de Desenvolvimento de Quadros Qualificados – órgão governamental de Macau, criado para planejar, coordenar e implementar políticas de captação, formação, uso e retorno de talentos, de modo a corresponder às necessidades estratégicas e ao desenvolvimento sócio-econômico da Região – ressalta que com o avanço da Zona de Cooperação Aprofundada Guangdong–Macau em Hengqin, novas indústrias e oportunidades econômicas vêm sendo criadas. A iniciativa tem o objetivo de promover a diversificação da economia, estimular a inovação tecnológica e atrair investimentos internacionais.
“Entre as diretrizes de desenvolvimento estão o reforço da cooperação econômica com a China continental, a integração com o Plano da Grande Baía Guangdong–Hong Kong–Macau e a consolidação de Hengqin como novo polo de competitividade tecnológica. O projeto também busca oferecer melhores condições de vida e trabalho para residentes e talentos internacionais”, aponta a Comissão de Desenvolvimento de Quadros Qualificados.
Para sustentar esse crescimento, Macau lançou, em julho de 2023, o Regime Jurídico de Recrutamento de Talentos, que visa atrair profissionais qualificados e estimular a inovação. A política é composta por três programas específicos: Programa para Quadros de Elevada Qualidade – voltado a indivíduos com realizações de destaque e reconhecimento internacional (o visto de residência é concedido mesmo sem residência habitual no território); Programa para Quadros Altamente Qualificados – direcionado a profissionais com experiência técnica capazes de impulsionar a diversificação econômica (não é obrigatória a atuação direta em entidades locais); e o Programa para Profissionais de Nível Avançado – destinado a especialistas em setores com carência de mão de obra. Nesse caso, é exigida oferta de trabalho de um empregador local e cumprimento de requisitos de remuneração e residência.
A nova rodada de candidaturas para esses programas será aberta a partir de novembro de 2025, criando novas oportunidades para estrangeiros, inclusive brasileiros, interessados em desenvolver carreiras no território. As medidas buscam melhorar a estrutura demográfica de Macau, elevar a qualificação da força de trabalho e estimular a diversificação econômica, com foco em inovação, saúde, tecnologia e turismo.
 
										 
									 
									 
									 
									 
									 
									 
                         
							 
							 
							 
							