Menu
Brasil

Enel acumula condenações por apagões em São Paulo

Justiça tem determinado indenizações a empresas e moradores após falhas recorrentes no fornecimento de energia, enquanto governo avalia rescisão do contrato

Redação Jornal de Brasília

19/12/2025 12h44

enel 2

Foto: Divulgação/Enel SP

ANDRÉ FLEURY MORAES E ROGÉRIO GENTILE
FOLHAPRESS

A concessionária Enel, responsável pelo fornecimento de energia elétrica em São Paulo e 23 municípios da região metropolitana, acumula condenações na Justiça pelos prejuízos causados a empresas e moradores ante os sucessivos apagões que atingem a área de concessão desde 2023.

O problema voltou a se repetir no último dia 10, quando novo apagão deixou mais de 2 milhões de imóveis no escuro simultaneamente. A situação até agora não se normalizou por completo: na manhã desta quinta (18), 18,8 mil endereços estavam sem eletricidade.

Procurada, a concessionária afirmou que não comenta ações judiciais em andamento.

A reincidênciade problemas ameaça a Enel e levou o ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia) a dizer na terça (16) que daria início ao processo de rescisão contratual com a concessionária, bandeira defendida há tempos pelo prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) .

A Folha analisou 11 processos contra a Enel relacionadas aos apagões de 2023 e de 2024 que deixaram 3,7 milhões e 2,4 milhões de clientes sem energia, respectivamente.

Dez deles resultaram em condenação, sentenças e acórdãos das quais a concessionária recorre. São decisões que determinam indenização por danos morais e materiais e ressarcimento a título de lucros cessantes –isto é, quanto uma empresa deixa de faturar em razão da falta de energia.

A condenação de maior valor entre os processos compilados pela reportagem envolve uma empresa de seguros, a Alfa Seguradora, que acionou a concessionária na Justiça após ter de arcar com despesas relacionadas a uma pane em elevadores de um condomínio residencial em Osasco.

Um laudo reconheceu que a pane foi causada pela instabilidade na rede elétrica, e a concessionária acabou condenada a restituir os R$ 97.333,10 desembolsados pela seguradora para consertar o problema.

Situação semelhante sofreu uma casa de eventos em Pinheiros, em São Paulo, que precisou suspender suas atividades durante três dias -incluindo sexta e sábado, dias de maior receita- quando do apagão de 2024.

“O prejuízo foi enorme”, disse a autora, a Casa Cagi. Foram 600 garrafas de cerveja perdidas, duas geladeiras queimadas e dois shows com R$ 50 mil em faturamento estimado cancelados. O mesmo aconteceu com oito aniversários que ocorreriam naquelas datas.

A Enel foi condenada neste caso a ressarcir a casa de eventos em R$ 59 mil, mas o valor final ainda poderá ser ajustado no cumprimento de sentença, decidiu o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo). Há ainda outros R$ 5.900 a título de danos materiais.

O mesmo ocorreu com o supermercado PMG, um atacadista de Itapecerica da Serra, que viu mercadorias estragarem em um dos apagões e precisou alugar geradores para evitar perdas ainda maiores.

A locação dos equipamentos, somada ao custo do diesel adquirido para mantê-los em funcionamento, somou R$ 53 mil -valor que a concessionária foi obrigada a restituir.

“A Enel vem demonstrando total despreparo para lidar com situações de emergência, relegando a população a desarrazoadas horas de espera pelo retorno da energia elétrica”, disse o atacadista, para quem a concessionária prometeu mais de uma vez que resolveria o problema na época. Não cumpriu.

A defesa apresentada pela Enel em todos os processos analisados pela Folha é semelhante.

Em linhas gerais, a concessionária sustenta, entre outras coisas, não ter responsabilidade sobre prejuízos porque apagões são causados por eventos fortuitos e de força maior -como questões climáticas.

Alega também que não compete ao Judiciário analisar casos do gênero uma vez que a fiscalização do contrato caberia à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), já que o contrato de concessão é federal.
Não é uma tese que costuma ser acolhida.

“Eventos como fortes chuvas são previsíveis em São Paulo, cabendo à ré adotar medidas necessárias e preventivas para mitigar consequências”, afirmou o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) ao manter sentença que mandou a Enel pagar R$ 18.816,52 a uma loja de calçados que opera em Santo Amaro, na capital.

A decisão veio no âmbito de uma ação movida pela varejista por prejuízos sofridos no apagão de 2024.
Na mesma linha caminhou a juíza Priscilla Buso Faccinetto, da 11ª Vara Cível de São Paulo, ao determinar que a Enel indenize em R$ 10 mil um cliente que ficou quatro dias sem energia.

“Ainda que se considerasse a ocorrência de temporal atípico, não se afasta a responsabilidade da concessionária porque a ela não se atribui a queda da energia elétrica decorrente do temporal, mas a inexcusável demora no restabelecimento do serviço e na adoção de medidas para mitigar prejuízos dos consumidores”, diz a sentença do último dia 10.

Mas há entendimentos diferentes.

Em Cotia, por exemplo, um casal perdeu um processo que movia contra a concessionária e no qual pedia R$ 8.000 em indenização por ter ficado três dias sem energia.

A sentença, assinada pela juíza Cláudia Guimarães dos Santos no último dia 2, diz que houve “situação absolutamente imprevisível e inevitável que deu origem à suspensão dos serviços de energia, sem existir desídia da ré por não ter ocorrido retorno do serviço em prazo inferior”.

Segundo a decisão, o “evento de força maior” exclui a responsabilidade da Enel.

OS ÚLTIMOS APAGÕES NA GRANDE SÃO PAULO

3.nov.23: Diversas regiões de São Paulo registraram um rastro de destruição durante aquela tarde devido a um temporal acompanhado de rajadas de vento acima de 100 km/h e granizo. Ao menos três mortes foram confirmadas pela Defesa Civil e pelos Bombeiros. Mais de 110 horas após o temporal, cerca de 11 mil imóveis continuavam, às 10h de quarta (8), sem energia elétrica na região metropolitana da capital, provocando protestos de moradores.

18.mar.24: Um apagão causou interrupções no fornecimento de energia, chegando a afetar o abastecimento de água. Segundo a Enel, uma ocorrência na rede subterrânea que atende o bairro de Higienópolis provocou interrupção por volta das 10h30. No início da manhã desta terça-feira (19) ainda havia relatos de falta de luz.

11.out.24: A cidade sofreu um grande apagão após um forte temporal, afetando mais de 2 milhões de residências. Algumas áreas levaram mais de uma semana para ter o serviço totalmente restabelecido. A Controladoria-Geral da União (CGU) concluiu mais tarde que a Enel falhou em seus planos de contingência durante este e outros eventos de 2024.

21.dez.24: Outro evento de grande escala ocorreu entre sexta (20) e sábado (21), derrubando dezenas de árvores, alagando vias e provocando transbordamentos de córregos. Na região metropolitana da capital, aproximadamente 666 mil clientes Enel chegaram a ficar sem luz. Segundo a empresa, 70% das ocorrências foram causadas pelo contato dos fios com a vegetação. Até as 20h do sábado, quase 88 mil residências continuavam sem energia.

10.dez.25: No caso atual, os ventos de quase 100 km/h deixaram mais de 2,2 milhões de imóveis sem energia na Grande São Paulo, com cerca de 1,3 milhão ainda no escuro mais de 24 horas depois.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado