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Brasil

Ciclone extratropical provoca ‘maré negativa’ e encalhes em SP

Ele consiste no deslocamento de grandes porções de água do mar da costa para o oceano, deixando a faixa da orla praticamente seca

FolhaPress

15/08/2022 20h54

Maurício Businari
Santos, SP

A passagem de um ciclone extratropical, com ventos que ultrapassaram os 100 quilômetros por hora no litoral de São Paulo, provocaram um fenômeno conhecido como “maré meteorológica negativa” na orla da cidade de São Vicente (SP). Ele consiste no deslocamento de grandes porções de água do mar da costa para o oceano, deixando a faixa da orla praticamente seca.

No vídeo captado pelo fotógrafo Pedro Luiz Alves, 52, é possível ver uma grande faixa da orla, perto da Ponte Pênsil, em São Vicente, praticamente seca, sem a presença da água do mar. O recuo foi tão grande que fez com que alguns barcos atracados em marinas da cidade encalhassem sobre a areia exposta.

“Saí de casa na sexta-feira (12) de manhã, para fazer um ensaio fotográfico, quando passei de carro por esse trecho da orla e me espantei com o que vi”, contou o profissional que atua com fotografia há 10 anos. “Parei o carro onde deu e corri até a praia para fazer as imagens. Em quase 40 anos que moro no litoral, nunca tinha visto uma cena como essa”.

O vídeo, produzido de forma despretensiosa, foi postado no TikTok. “Em menos de 24 horas, ele já tinha mais de 3 milhões de visualizações. Foi impressionante. Hoje, quando postei um outro vídeo mostrando aquele local já com a maré normalizada, ele já estava chegando aos 6 milhões de visualizações”.

O fotógrafo não imaginava tamanha repercussão. Para ele, a curiosidade das pessoas foi maior porque esse não seria um fenômeno tão comum de ocorrer no litoral de São Paulo. Ele diz que, quando morou na região Nordeste, acompanhou a ocorrência de marés negativas no litoral de Pernambuco.

“Já acompanhei marés vazantes no litoral paulista, mas nunca, nunca mesmo, igual a essa que registrei em São Vicente. Uma parte do mar simplesmente desapareceu. Foi realmente incrível essa demonstração da natureza”.

Segundo informações da Capitania dos Portos, a maré registrada por volta das 10 horas de sexta-feira foi de – 0,38 metro. Ou seja, 38 centímetros abaixo do nível normal do mar, para padrões geográficos, tratado como 0 metro de altitude. Em dias normais, a variação da maré vai de zero a 1,50 metro.

Professor e pesquisador do Núcleo de Pesquisas Hidrodinâmicas da Unisanta (Universidade Santa Cecília), Renan Braga Ribeiro afirma que, apesar de não ser tão raro, o fenômeno causou surpresa pela intensidade. “Eu mesmo não me lembrava de uma maré tão negativa em nossa região”, afirmou.

“Tivemos um período de maré seca em 2017, mas essa maré registrada na sexta-feira em São Vicente impressiona”.

O transporte de quantidades maciças de água da orla para as partes mais profundas do oceano é um fenômeno chamado de Transporte de Ekman. Ele ocorre por causa da força dos ventos que sopram na direção do oceano, complementados por variações bruscas na pressão atmosférica das áreas onde o fenômeno ocorre.

O vento no hemisfério sul gera uma força para a esquerda ao soprar paralelamente à costa. Ele é regido pela Força de Coriolis, ou seja, a força gerada pelo movimento de rotação da Terra.

Assim, fortes ventos subindo a costa brasileira empurrariam um grande volume de água para a esquerda em direção à costa. Esse fenômeno é chamado de maré meteorológica positiva. Quando a elevação do nível do mar está acima do previsto na tábua de marés.

Quando o vento desce a costa brasileira, gera a mesma força para a esquerda do movimento do vento, mas empurra o volume da água para alto mar. É quando ocorre a maré meteorológica negativa.

Geralmente as marés meteorológicas negativas causam níveis mais baixos do que aqueles previstos na tábua de marés, podendo comprometer a navegação em canais de acesso a baías e portos.

“A previsão para os próximos dias, até três dias à frente, indica que a maré não será tão baixa assim, sempre ficando positiva (maior que 0 metro), assim não veremos o mesmo cenário registrado nos últimos dias”, avisa o especialista.

INFLUÊNCIA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Ribeiro explica que, por mais inusitado que pareça, o fenômeno ocorrido em São Vicente não significa que seja uma consequência direta das mudanças climáticas. Por outro lado, ele afirma que há um consenso entre os cientistas e pesquisadores de que os fenômenos naturais estão se tornando cada vez mais extremos.

“Não se pode dizer que é um fenômeno causado pelas mudanças climáticas. Seja pelo aquecimento do oceano ou o derretimento das geleiras. Porém, o que se espera nos próximos anos, é uma intensificação desses fenômenos”, esclarece.

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