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Ditadura intimida manifestantes por SMS na Belarus

O remetente é o Ministério do Interior da Belarus, responsável pela segurança no país, e o SMS chegou a milhares de bielorrussos “identificados como violadores da ordem de realização de eventos de massa”

Redação Jornal de Brasília

02/10/2020 14h56

Women dressed in white clothes protest against police violence during recent rallies of opposition supporters, who accuse strongman Alexander Lukashenko of falsifying the polls in the presidential election, in Minsk on August 12, 2020. (Photo by Sergei GAPON / AFP)

Ana Estela de Sousa Pinto
Bruxelas, Bélgica

“Eu sei onde você esteve no final de semana, e você pode ser preso ou multado por isso”, ameaça o SMS que chega a seu telefone celular.

A vigilância remota e a ameaça individualizada parecem episódio de romances distópicos, como “1984”, de George Orwell, mas essa mensagem não foi enviada pelo fictício Grande Irmão.

O remetente é o Ministério do Interior da Belarus, responsável pela segurança no país, e o SMS chegou a milhares de bielorrussos “identificados como violadores da ordem de realização de eventos de massa”.

Os eventos de massa no caso são protestos contra a reeleição do ditador Aleksandr Lukachenko, considerada fraudada. Na Belarus, qualquer evento público é ilegal sem a permissão do regime, o que transforma em “violadores da ordem” as centenas de milhares de pessoas que participam de manifestações desde que o resultado foi anunciado, há quase dois meses.

Nesse período, mais de 12 mil pessoas foram detidas, e cerca de 500, torturadas, incluindo algumas que nem estavam em passeatas, como bielorrussos entrevistados pela Folha de S.Paulo em Minsk, em agosto.

A forte reação interna e externa contra a brutalidade da repressão nos primeiros dias fez a ditadura mudar progressivamente de tática, que agora chega à intimidação pelo celular.

Em vez de espancar os manifestantes nas ruas, os policiais passaram a arrastar centenas de manifestantes para os camburões, incluindo mulheres, que nas primeiras semanas eram poupadas. Após julgamentos sumários, os detidos recebem multas ou penas de prisão de até 15 dias.

Como a ação não foi suficiente para inibir as marchas de protesto, que completam oito semanas, o regime começou a mandar para o orfanato crianças de pais detidos por protestar e a prender pessoas que assistiam às marchas de suas sacadas.

Administradores de grupos de redes sociais que organizam manifestações em seus bairros ou repassavam informações sobre os melhores trajetos para desviar das tropas de choque também foram condenados e presos.

Os SMS, que avisam ao destinatário que “suas ações foram registradas por meio de gravação de foto e vídeo”, terminam com a advertência “não cometa erros”.

O Ministério do Interior afirmou que os participantes das manifestações são identificados por meio de softwares. Segundo as operadoras de celular, o envio dos SMS foi requisitado pelo regime com base na lei que garante “anúncios sociais”.

Advogados ouvidos pela imprensa bielorrussa, porém, dizem que, como a mensagem é personalizada, não pode ser considerada uma campanha social.

O regime bielorrusso também cancelou nesta sexta todas as credenciais de jornalistas estrangeiros e afirmou que eles precisam se recadastrar, sob novas regras, a partir de segunda-feira.

Assim, a mídia estrangeira será considerada em situação irregular durante este final de semana e, portanto, mais suscetível a detenções caso faça a cobertura jornalística de manifestações.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, o novo regulamento visa “implementar o direito à proteção jurídica da soberania da informação da República da Belarus”.

O regime já havia cassado, no dia 19 de agosto, credenciais de quase 20 correspondentes internacionais, de veículos como BBC, Reuters, AFP e Radio Svaboda. Impressoras também deixaram de funcionar em jornais como Komsomolskaya Pravda, Narodnaya Volya, Belgazeta, Svobodnye Novosti Plus.

Cerca de 70 portais de notícias ou de entidades de direitos civis foram bloqueados e, desde quinta, um dos principais sites independentes do país, o Tut.by, perdeu seu status de veículo de mídia por três meses.

Opositores reagem com exposição pública de policiais Enquanto o regime bielorrusso aumenta o alcance da repressão contra opositores, grupos contrários a Lukachenko reagem com pressões sobre policiais e fundos de ajuda aos prejudicados pela repressão.

Depois de vazar na internet dados de 2.000 agentes, numa operação chamada de “desanonimização”, a oposição publicou nesta sexta a lista de todos os funcionários da corregedoria do Ministério do Interior, cuja tarefa tem sido punir agentes que se recusam a reprimir os protestos.

A lista foi publicada pelo canal Nexta, que é editado na Polônia e se tornou um dos principais meios de informação independente para os opositores de Lukachenko.

O objetivo tanto da “desanonimização” quanto da publicação da lista da corregedoria é provocar pressão social sobre os policiais para que eles deixem de apoiar as ações da ditadura.

“Encontrou um amigo? Diga oi para ele!”, incentiva o Nexta em seu post.

Grupos de manifestantes também organizaram fundos para ajudar bielorrussos que ficaram feridos na repressão ou perderam seus empregos por apoiar a oposição durante a campanha eleitoral ou por participar de passeatas após a eleição.

Desde que o fundo foi lançado, em julho, já foi arrecadado mais de 1 milhão de rublos bielorrussos (R$ 2,2 milhões), segundo seus organizadores. O valor seria suficiente para pagar o salário mínimo da Belarus para mil pessoas durante três meses. O fundo afirma também que, por meio de sua plataforma, 31 pessoas encontraram novos empregos e 46 estão em reciclagem.

Segundo a organização Pessoas Honestas, há mais de 500 empresas e pessoas voluntárias cadastradas para ajudar na recolocação profissional de quem for demitido pela posição política.

As informações são da FolhaPress

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