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Após medo e sonho na WNBA, Damiris vira protagonista da Seleção

Arquivo Geral

26/09/2014 14h36

A ala-pivô Damiris Dantas convive desde a adolescência com a pressão de ser apontada como uma das principais revelações do basquete nacional. Apadrinhada por Janeth e Hortência, ela realizou o sonho de jogar na WNBA, liga feminina norte-americana, e se converteu em protagonista da Seleção Brasileira, que a partir deste sábado disputa o Campeonato Mundial. Tudo isso com apenas 21 anos de idade.

Damiris fez sua temporada de estreia na WNBA pelo Minessota Lynx, time que a selecionou no draft de 2012. No primeiro mês nos Estados Unidos, teve a companhia de Janeth, a quem chama de tia Jane, para ajudar com o inglês e a superar o medo de disputar a melhor liga do mundo pelo então campeão.

Passado o temor, tornou-se importante peça na formação da técnica Cheryl Reeve na equipe, derrotada nas finais da Conferência Oeste, e ganhou prestígio para o próximo ano. O contrato com o Lynx já está garantido. As aulas de inglês devem ser iniciadas quando ela retornar do Mundial com a Seleção Brasileira, como contou nesta entrevista à Gazeta Esportiva no penúltimo treino do time antes da viagem à Turquia.

Na renovada equipe nacional, Damiris já é uma das referências, ao lado das experientes Érika e Adrianinha, principais remanescentes do time que decepcionou nos Jogos Olímpicos de Londres-2012. Na capital inglesa, a Seleção foi eliminada na primeira fase vencendo apenas uma partida em cinco realizadas.

No Mundial da Turquia, disputado entre 27 de setembro e 5 de outubro, o Brasil tenta apagar a má imagem deixada em Londres. O time comandado por Luiz Augusto Zanon integra o Grupo B da competição e estreia já neste sábado contra a República Tcheca, às 15h15 (de Brasília).

Gazeta Esportiva: Você acabou de disputar sua primeira temporada na WNBA. Como foi o ano de estreia nos Estados Unidos? 

Damiris Dantas: Foi muito bom, aprendi muito. Fui para lá com medo porque era o primeiro ano e em um time bom. Mas treinei e joguei para caramba, a técnica me passou muita confiança. Fui titular em alguns jogos e isso me motivou muito. Foi uma experiência fantástica.

Gazeta Esportiva: Você foi titular em 23 dos 30 jogos em que participou na temporada regular. Você esperava ter tanto espaço já no primeiro ano? 

Damiris: Não esperava nada. Achei que nem ficaria no time porque na pré-temporada tínhamos quatro pivôs, algumas já experientes e outras meninas vinham do college, e eu era a única estrangeira. Bateu aquele frio na barriga. Mas, meu, a técnica me passou muita confiança e o time me abraçou muito. Como a Rebekkah Brunson, pivô delas, estava machucada, a técnica chegou para mim antes do primeiro jogo e falou: “minha brasileira preferida, você vai começar jogando”. Nem dormi naquela noite. Fiquei super ansiosa, mas foi um jogo fantástico, em Washington, nunca esquecerei.

Gazeta Esportiva: Você já falava inglês? 

Damiris: Não, falava pouca coisa porque fiz um curso. Mas quando chega lá é complicado. A Janeth foi comigo e ficou um mês lá me ajudando, mas peguei bastante coisa. A técnica foi muito de boa. Deu para aprender na convivência. Mas quando decidir onde vou jogar a temporada aqui no Brasil, quero fazer um curso bem intensivo. Fiz um de duas vezes por semana, então não foi tão bom. Quero aquele intensivão para pegar legal. As meninas tinham bastante paciência de ir ao meu apartamento ficar conversando comigo. Alguns dias elas saíam e eu não queria ir. Aí de repente alguém batia na porta e vinha trazer um lanchinho para mim e ficava lá. A convivência me ajudou muito.

Gazeta Esportiva: Como te chamavam lá? Damiris ou Dantas? 

Damiris: Dantas, brasileira. Chamavam de tudo. Porque eu era a única estrangeira, né? E a torcida me abraçou muito, muito mesmo. As crianças vinham me abraçar quando eu saía dos jogos. Até mesmo na cidade, quando ia ao shopping ou ao parque, sempre tinha alguém que me reconhecia. Foi um sonho. Sonhava com a WNBA desde que comecei a jogar e estar lá era realizar um sonho, estava nas nuvens.

Gazeta Esportiva: Dentro de quadra ficou satisfeita com seu desempenho? Na temporada regular você teve média de 21.8 minutos, cinco rebotes e seis pontos por jogo…

Damiris: Sinto que preciso evoluir bastante. Todo atleta quer evoluir a cada dia. Fui bem, mas tenho que evoluir algumas coisinhas. Isso vem com o tempo, a gente vai treinando e evoluindo.

Gazeta Esportiva: O que são essas coisinhas? 

Damiris: Cobraram bastante aquela intensidade, o físico. Porque lá elas jogam muito no físico e me cobraram isso.

Gazeta Esportiva: Nas finais de conferência você deixou de ser titular. A média foi para 8 minutos de quadra e você marcou apenas dois pontos. O que aconteceu? 

Damiris: Tive alguns problemas pessoais e precisei vir ao Brasil. Fiquei uma semana aqui e quando voltei já não estava tão bem. Aí a técnica resolveu me poupar. Mas no terceiro jogo já fiquei bastante em quadra.

Gazeta Esportiva: Você já tem contrato com o Lynx para a próxima temporada da WNBA. Até lá vai jogar em alguma equipe aqui da Liga Brasileira Feminina (LBF)? 

Damiris: Provavelmente sim, quero ficar perto da minha família. Tenho alguns contatos, mas ainda não decidi onde jogar.

Gazeta Esportiva: A WNBA é o principal campeonato do mundo. Quais são as diferenças em relação à LBF? 

Damiris: Lá a gente joga toda semana. Os jogos são intensos, a gente viaja bastante. São muitos times, tem até a divisão das conferências. Aqui a liga é bem menor, mas sinto que o Brasil está evoluindo bastante. Sou nova, não passei pela fase que as meninas me contam em que era bem difícil porque nem liga tinha direito. Mas agora está avançando, e é legal que estão vindo muitas estrangeiras para cá. Todo time tem uma.

Gazeta Esportiva: Este será seu segundo Mundial adulto com a Seleção Brasileira. Como acha que chega o time? O que dá para pleitear? 

Damiris: Vai um grupo bem mais novo do que no último, mas que já está junto há um tempo. A gente fez amistoso com times da WNBA, jogou Copa América… As meninas foram ao Canadá, jogaram com a Turquia. Estão viajando e jogando bastante. É um grupo novo, mas que está com muita vontade de mostrar serviço e a gente está indo para brigar bastante por uma boa colocação.

Gazeta Esportiva: No Mundial são quatro grupos de quatro times e todos avançam às oitavas de final. O Brasil está no Grupo A, com República Tcheca, Turquia e Coreia do Sul. Em que posição o time avança? 

Damiris: Não dá para falar. A gente quer passar na melhor posição possível, é óbvio. Então a gente tem que focar nos treinamentos e continuar fazendo isso. O Zanon vem cobrando bastante. Agora vamos pensar na República Tcheca, um degrau de cada vez.

Gazeta Esportiva: Qual é o time mais forte dessa chave? 

Damiris: A República Tcheca, mas todas as equipes lá são fortes. A República Tcheca mudou bastante o ritmo e será muito interessante para a gente começar com um time já na pegada. Porque a gente já está numa pegada legal, entendeu?

Gazeta Esportiva: Nas Olimpíadas de 2012, última competição grande, o Brasil só venceu um jogo, contra a Grã-Bretanha, que não forma uma seleção regular. Isso adiciona pressão ao time agora? 

Damiris: De lá para cá houve muitas mudanças: comissão técnica, jogadoras, direção. Mudou muita coisa. A CBB está fazendo uma reforma no basquete feminino, e temos meninas novas muito a fim de mostrar trabalho. Claro, tem um pouquinho de pressão porque não foi legal nas Olimpíadas, mas a gente tem que entrar tranquila e fazer nossa parte porque o grupo está bem e o Zanon é um cara muito bacana. Ele passa muita confiança para as meninas que estão vindo agora. Gosto muito de jogar com ele.

Gazeta Esportiva: E qual a diferença de jogar o Mundial agora do que em 2010, quando você ainda tinha 17 anos? Desta vez tem bastante gente da sua idade. A média do grupo é de 21,3 anos. 

Damiris: Quando fui em 2010 era muito novinha, tinha 17 anos, e o cara [o técnico espanhol Carlos Colinas] me colocou para jogar em bastantes jogos. Lembro que não entrei nos dois primeiros, mas contra a Espanha ele me colocou e eu não saí mais, fui jogando bastante. Era um time bem experiente, com a Hellen, a Alessandra, e agora mudou totalmente. A maioria das meninas aqui nunca foi a um Mundial adulto. Mas o grupo trabalha muito e está gostoso treinar e ralar todos os dias. Não tem essa de “estou cansada”. É todo o mundo trabalhando para o mesmo objetivo.

Gazeta Esportiva: Apesar da média de idade baixa, há algumas atletas bem mais experientes, como a Adrianinha e a Érika. Como é a relação com essas atletas de outra geração? 

Damiris: Elas são nossas mãezonas, na verdade. Outro dia falei para a Érika que precisava ir ao shopping e ela falou “não, já é tarde. Vai amanhã”. Elas ficam cuidando da gente, mas dentro de quadra está sendo muito legal mesmo. Às vezes a gente faz alguma coisa e ela avisa “no Mundial não vai ser assim”. Ela conta experiências. Está sendo bem bacana.

Gazeta Esportiva: Até por ter jogado a temporada da WNBA, espera-se que você seja uma das líderes dessa equipe. Você assume esse papel? 

Damiris: Tem a Érika aí, deixa ela ser a líder [risos]. A gente não tem uma líder. Claro que eu, a Érika, a Nádia e a Adrianinha já jogamos fora e trazemos coisas diferentes. Sou muito nova, mas trago isso também. A gente troca muitas experiências. A Clarissa já chegou me perguntando algumas coisas, falando para vermos um vídeo. E a gente pergunta bastante para a Érika porque ela é bem mais experiente.

Gazeta Esportiva: A Érika joga na WNBA já há 12 anos e, assim como você, de pivô. Isso faz vocês terem uma relação mais próxima? 

Damiris: A gente conversa muito mesmo. Sobre tudo. Ela é uma pessoa de quem gosto muito. Quando cheguei à Seleção com 17 anos e a encontrei lá no Mundial fiquei parada. Não conseguia respirar. Fiquei até com vergonha de ir cumprimentar. Mas desde então aonde vou quero falar com ela, ligar para ela. Nos Estados Unidos também. Dentro de quadra é a mesma coisa. Eu até a chamo de tia porque tenho um carinho especial. Ela é fantástica, me dá conselhos dentro e fora de quadra, puxão de orelha e até bronca, se precisar. É uma pessoa que quer meu bem.

Gazeta Esportiva: Você sempre foi colocada como a nova estrela do basquete do Brasil, com muitos elogios da Hortência e da Janeth. Você convive bem com isso? 

Damiris: Já passou da época em que eu era uma promessa, hoje acho que sou realidade. Estou na quadra trabalhando e se eu ficasse nessa de promessa, nunca iria acontecer. Eu me cobro bastante, mas preciso de tranquilidade. Sou nova e vou errar, aprender. Isso vai fazer parte do meu trabalho na Seleção.

Gazeta Esportiva: A Hortência e a Janeth trabalhavam na CBB quando você foi apontada por elas como revelação. Como é o contato de vocês agora que elas saíram da entidade? 

Damiris: Desde quando eu comecei na base, acho que no sub-17, a Hortência sempre me apoiou. Estava nos treinamentos dando conselho. Uma vozona. Chamo-a de vó [risos]. E eu comecei na escolinha da Tia Jane, agora na Seleção também tenho bastante contato. Ligo para falar como foi o treino, ela pergunta como estão as coisas. Ela acompanhava todos os meus jogos nos Estados Unidos, é uma ligação bem legal.

Gazeta Esportiva: No Mundial masculino o Brasil vinha com uma boa campanha até as quartas de final, em que foi eliminado pela Sérvia, com uma derrota por 30 pontos de diferença. Dá para se prevenir para que isso não ocorra também com o feminino? 

Damiris: Talvez tenha mexido um pouco com o psicológico. O jogo começou ali parelho e, quando eles quiseram reagir, não dava mais. A gente sabe que isso pode acontecer porque não vamos ter jogos fáceis. O Zanon vem do masculino e trabalha um pouco isso. No treino ele coloca uns placares loucos e a gente tem que correr para tirar a diferença. Mas isso pode acontecer. É o esporte, lá não tem seleção boba.

Gazeta Esportiva: Os Estados Unidos são favoritos para ganhar o título uma vez mais, com um time que tem três companheiras suas do Lynx, além da técnica Cheryl Reeve como assistente. Vocês falavam sobre o Mundial? 

Damiris: Agora no final da temporada começamos a conversar mais, falando que nos encontraríamos. A Maya Moore e a técnica brincaram pedindo para eu levar um presente do Brasil. Pediram presentinho ou um namorado porque elas adoram brasileiro.

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