O cantor Zezé Di Camargo nunca teve nada a ensinar à família Abravanel — sobretudo em matéria de gestão institucional e corporativa.
O episódio em que destilou sua verve de botequim de Pirenópolis para disparar grosserias, revela o efeito corrosivo das redes sociais, que impregnaram de ódio as mentes mais suscetíveis.
O ataque injustificável ao clã, que há décadas gera empregos com responsabilidade social, agrediu a boa educação e acabou produzindo um efeito inesperado: um surto de solidariedade cívica generalizada.
E não é por acaso.
A barafunda verbal de Zezé Di Camargo calou fundo no peito dos milhares de funcionários e ex-funcionários de Silvio Santos, que se orgulham da empresa preocupada com a vida de seus funcionários. Um ambiente profissional em que atraso de salário ou benefício é cobrado com a demissão da diretoria de RH.
Convém lembrar ao cantor, inclusive, que as filhas de Silvio Santos são fieis depositárias de um legado empresarial preservado. Um patrimônio corporativo que, aliás, não mistura o pessoal com o profissional. Segundo relatos recorrentes, de jornalistas perseguidos e encarcerados como Pedro Porfírio, à época, o foco de Senor Abravanel sempre foi o negócio — escravizado pela audiência, desvinculado de ideologia. Uma postura que, sem alarde, não patrocinou “perseguições ideológicas” internas que orientaram práticas de outros grandes patrões da comunicação brasileira.
Ao contrário de Zezé Di Camargo, entretanto, não há notícia de que a família Abravanel tenha “mudado de lado”. Apenas a saudável dinâmica da relação típica de empresários concessionários com a autoridade constituída. Até porque os Abravanel nunca teve lado para trocar. Não se tem, inclusive, memória de Silvio Santos ou suas filhas aceitando dinheiro para exercer seu ofício de apresentador em campanhas eleitorais. Já no caso de Zezé Di Camargo e Luciano, é público e notório que ambos foram muito bem remunerados nos famosos showmícios — prática posteriormente proibida pela Justiça Eleitoral. Uma agenda de apresentações ironicamente paga, com generosidade, pelo PT.
Naquele momento, curiosamente, não havia indignação moral, nem discurso sobre suposta “prostituição política”, tampouco ataques às instituições. Havia microfone aberto, caixa de som ligada e cachê depositado.
Décadas depois, Zezé resolve posar de virgem ofendida porque uma emissora recebe, com educação institucional, o presidente da República, ministros do STF, governadores e prefeitos.
Receber autoridades não é submissão. É civilidade. Algo que, aliás, soa como heresia para quem só reconhece legitimidade quando o poder veste a camisa do seu time.
O ataque rasteiro à família Abravanel e ao SBT não foi um tropeço retórico. Foi um mimetismo grotesco, que repetiu o suicídio verbal que caracterizou a trajetória do ídolo de Zezé, Jair Bolsonaro.
Ao acusar as filhas de Silvio Santos de estarem se “prostituindo” por receberem autoridades da República na inauguração do SBT News, Zezé não criticou uma linha editorial. Revelou, de forma crua, sua incapacidade de conviver com a liturgia democrática. Para ele, emissora respeitável parece ser apenas a que abre as portas para quem ostenta o mesmo adesivo ideológico no para-choque.
Foi isso que despertou o coro previsível dos “internautas do ódio”, sempre prontos a confundir reportagem com militância — desde que não seja a deles. Para essa turma, entrevistar Lula é crime; atacar instituições é “opinião”; e xingar mulheres empresárias vira “liberdade de expressão”.
As herdeiras de Silvio Santos poderiam sugerir que a afinação vocal de Zezé Di Camargo sempre dependeu de estúdio, playback e da paciência do público. Mas, nos bastidores, consta que elas fizeram a opção pela via da educação, orientada pelo profissionalismo aprendido em casa.
No fim das contas, o episódio expôs menos o SBT e muito mais o agressor. A história da família Abravanel segue como sempre foi: feita de risco, trabalho, geração de empregos e visão. Já a de certos críticos ocasionais permanece prisioneira do ressentimento — esse vício que transforma opinião em ofensa e ignorância em espetáculo.